Nº01- Participação

O lobby é injustiçado no Brasil?

Termo é evitado até pelas empresas que realizam, mas prática faz parte da democracia

Gisele Machado | gisele@saopaulo.sp.leg.br

Lobby busca influenciar decisões políticas, administrativas e legislativas

Henk L./SXC.hu

Não existe lobista no Brasil. Pelo menos, não com esse nome. Quem trabalha com lobby no País costuma se definir como “mediador de interesses” ou “profissional de relações governamentais”. Tudo para não usar as palavras lobby e lobista, que sempre aparecem no noticiário com carga negativa.

Basta dar uma olhada rápida nos títulos dos jornais dos últimos meses para ver como o termo lobby sempre aparece em matérias que sugerem tráfico de interesses e outras ações desonestas: Lobby pró-armas critica medidas de Obama contra violência armada (Portal G1, 16/1/13), Ministra diz que Valério fez lobby no Banco Central (Folha de S. Paulo, 6/9/12), Líder do PMDB faz lobby para sócio em contrato de R$ 7 bi (O Estado de S. Paulo, 29/8/12), Relato da PF diz que filho de ex-ministra cobrava por lobby (Folha de S. Paulo, 28/7/12). E os Paralamas do Sucesso já cantaram em 300 Picaretas: “É lobby, é conchavo, é propina e jeton”.

“A palavra lobby assumiu conteúdo semântico pejorativo, confundindo-se, por vezes, com atividade vinculada à corrupção. O lobista hoje é compreendido, principalmente pela população média, como aquele que promove negociatas e que é parasita da burocracia”, reconhece o deputado federal César Colnago (PMDB-ES) em seu substitutivo ao projeto de lei 1202/2007, sobre lobby, de autoria de Carlos Zarattini (PT-SP), justificando a retirada do termo em sua versão do texto.

A carga negativa também queima o filme dos lobistas no cinema. Em Obrigado por Fumar, um grande lobista conta com um agente de Hollywood para promover o fumo nas telonas, mesmo com a pressão da sociedade para que os danos do cigarro sejam expostos. Já Jack Abramoff, O Super Lobista (2010) interpretado por Kevin Spacey, define a si próprio como “um canal para motivar políticos preguiçosos a aprovar leis e regulamentos”. Também retratado no documentário Casino Jack & The United States of Money, Abramoff acabou preso em 2006 por infringir os limites descritos na lei que regulamenta o lobby nos Estados Unidos, o Lobbying Disclosure Act. Sim, porque a atividade, em países como os Estados Unidos, tem definições e procedimentos que permitem separar a prática honesta do joio da corrupção.

Segundo a definição da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o lobby é a comunicação oral ou escrita com uma autoridade pública para influenciar decisões políticas, administrativas e, principalmente, legislativas.

No livro Grupos de Interesse (Lobby), da Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça do Brasil, o lobby aparece como “uma atividade lícita e imprescindível para a consolidação e efetivação do regime democrático, além de se constituir em uma medida de transparência e facilitar sobremaneira o combate à corrupção”. Outros especialistas concordam e defendem que lobby é um exercício ético, expressão do direito que os grupos de interesse legítimos têm de levar seus argumentos aos tomadores de decisão.

“Não existe lobby bom ou ruim. Lobby é um exercício de cidadania, só possível em países democráticos, abertos. É correto”, diz o sócio e diretor de Relações Governamentais da empresa Patri Políticas Públicas, Eduardo Carlos Ricardo. Para Andrea Cristina de Jesus Oliveira, autora da tese de doutorado Lobby e Representação de Interesses: Lobistas e seu Impacto sobre a Representação de Interesse no Brasil (Unicamp, 2004), a definição de lobby não passa por corrupção e tráfico de influência, crimes passíveis de punição.

O cientista político Wagner Pralon Mancusso, autor do livro O Lobby da Indústria no Congresso Nacional (Humanitas, 2007), pensa diferente. Em seu conceito, o termo comporta o bem e o mal. “Para a mídia, lobby é sempre corrupção. Já os lobistas querem que a definição diferencie lobby de corrupção. Na minha visão de acadêmico, trata-se de uma expressão neutra, que significa defesa de interesse perante o tomador de decisão.” Para o teórico, muitos profissionais da intermediação de interesses praticam corrupção e tráfico de influência em suas diversas aplicações, como a fraude de concorrência. “Mesmo assim, o lobby lícito, cuja base é muita informação, é uma parte muito grande, pois sua credibilidade é importantíssima. Há uma força que o impele a prestar informações precisas, por mais que parciais, que mostrem seu ponto de vista.”

O lobista: quem é?

Kevin Spacey interpreta o protagonista de “O super lobista”

Divulgação

Lobista, segundo Grupos de Interesse (Lobby), é um representante especializado – terceirizado ou da própria instituição – que transmite as mensagens do grupo de pressão aos tomadores de decisão. O substitutivo do deputado César Colnago exige que a participação do lobista seja especializada, baseada em elementos técnicos e estratégias, mas permite que o profissional seja formado em qualquer área.

Também para Colnago – e outros especialistas ouvidos pela Apartes –, a atividade deve ser exercida de modo contínuo. O lobista pode ser pessoa física ou jurídica. Pode ou não receber remuneração por seu trabalho.

O lobista e professor universitário Gilberto Galan, autor de Como Fazer Lobby: Ensinando um Empresário a Criar Representação Governamental dentro da Empresa, já atuou em companhias como Kodak, Philip Morris, HP, Embraer e Citibank. Como responsável pela atividade de lobby da indústria tabagista, sua principal tarefa era municiar as autoridades com informações. “Nunca se fez um trabalho de dizer que cigarro não faz mal. Um dos argumentos que levávamos era o de poder fazer propaganda se o produto é legal. E a cadeia produtiva do tabaco é a maior arrecadadora de impostos do País, em torno de 70% ou mais. Deveria poder fazer propaganda”, explica.

Para o executivo, lobby se faz sem dar dinheiro para obter favores políticos. “Fiz apresentações no Legislativo, e até ao presidente da República, levando apenas argumentação pública. É esse o trabalho do lobista. Só demora mais”, compara.

O lobista Gilberto Galan diz que base deve ser a argumentação

Divulgação

Galan conta que outra preocupação de seu trabalho era se antecipar a possíveis restrições em políticas públicas. Uma medida era deixar o cigarro menos agressivo e estampar nas embalagens a redução na quantidade de nicotina. “É uma estratégia oferecer as melhorias voluntariamente. Quando tem um órgão regulador do outro lado, você sabe que sua vez vai chegar e já faz sua parte.”

Hoje trabalhando em sua própria consultoria, Galan diz que antes de contratar um lobista ou escritório de lobby é recomendável verificar se o código de conduta do contratado evita procedimentos de corrupção e tráfico de influência. Além disso, o papel do lobista é ser apenas o elo de ligação entre seu cliente e a autoridade. “Em 99% das vezes em que a aproximação ocorre dentro da ética, é o membro da empresa ou segmento quem fala com o tomador de decisão, porque ele entende do negócio”, diz. Nesse caso, o lobista pode acompanhar o cliente.

Agenda

Eduardo Carlos Ricardo, sócio-diretor de relações governamentais da Patri Políticas Públicas, concorda com Galan. “Quando se aluga alguém para fazer algo por você, já começou errado. Boa coisa não pode ser. Se a causa é boa, se o interesse é legítimo, não tem por que se esconder atrás de alguém. Não quero alugar minha cara nem minha reputação por dinheiro nenhum”, diz o executivo.

Ricardo conta que seu trabalho consiste em informar os clientes, principalmente, sobre o surgimento e andamento de projetos de regulamentação que possam afetá-los. É feito um relatório por mês, com orientações. O pagamento pelo serviço de assessoramento ao lobby é mensal, já que o executivo é contra o pagamento de comissões mediante êxito. “Sem o comissionamento, vira um trabalho regular, e não um negócio.”

Para elaborar sua tese de doutorado sobre lobby, Wagner Mancusso observou o trabalho Agenda Legislativa da Indústria, capitaneado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) há 16 anos ao lado de outras 30 entidades industriais. O grupo identifica e acompanha proposições legislativas cuja aprovação, rejeição ou alteração possa influenciar no Custo Brasil. São observados, simultaneamente, milhares de textos em tramitação sobre educação, qualidade dos gastos públicos, sistema tributário, reestruturação da previdência social, infraestrutura, meio ambiente, correção dos desníveis socioeconômicos regionais, relações trabalhistas, micro e pequenas empresas e custo do financiamento.

Os temas são genéricos para permitir unanimidade de interesse entre todas as participantes do grupo. Além de monitorar o processo legislativo, os profissionais da Agenda Legislativa fazem análises técnicas, posicionamentos sobre os textos e disseminação das informações. A última etapa é a pressão política, que pode incluir desde contatos com parlamentares até ações diretas de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF).

No conjunto das 216 principais normas jurídicas acompanhadas pela Agenda Legislativa da Indústria em 2003 e com tramitação encerrada até 23 de dezembro daquele ano – período analisado por Mancusso – os industriais obtiveram sucesso político em 144 casos. A análise apontou “evidências sólidas” de associação entre o trabalho de lobby realizado pela indústria e o resultado final das tramitações.

Para Mancusso, o sucesso da Agenda Legislativa da Indústria deve-se, em grande parte, à ação grupal. No entanto, o especialista acredita que grupos menos poderosos podem ser eficientes, também. “É mais difícil, mas depende muito do caso. Há questões que mesmo grupos com poucos recursos têm mais legitimidade para debater. Ou compensam a menor capacidade financeira com maior poder de repercussão”, explica. Além disso, temas que representam uma tendência, como plenos direitos ao consumidor, têm maior abertura ao lobby, mesmo que ele venha de um setor desorganizado da sociedade.

Saindo da clandestinidade

Eduardo Carlos Ricardo não acredita na autorregulação do setor, porque as associações costumam ser lenientes com seus integrantes. “A entidade dos advogados ou dos médicos pune alguém? Para tirar médico da atividade precisa ser algo escandaloso. O corporativismo impera, para o médico, para o engenheiro, para o lobista. A nossa sociedade não está preparada para isso. Nos lugares em que isso avança é tudo por lei.”

O executivo da Patri diz que gostaria de ver explícito, em uma lei, o que pode e o que não pode fazer como lobista. Para Ricardo, institucionalizar o lobby é mais uma forma de desmistificá-lo. Regulamentar a atividade é um caminho para que se criem cursos de formação específicos para lobistas; para que a sociedade saiba quem são esses profissionais e possa fiscalizá-los.

“Regulamentar traz à luz o que hoje é feito às escuras. Desassocia quem faz lobby por interesses legítimos dos que fazem por interesses escusos”, diz o professor de ética e filosofia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Roberto Romano. O ministro chefe da Controladoria-Geral da União, Jorge Hage Sobrinho, disse à Apartes que considera fundamental regulamentar o lobby no Brasil para separar a atividade legal da ilícita. Andrea Oliveira, em sua tese, complementa que “pautado por regras claras, o lobbying (atividade de lobby) poderia contribuir para a transparência do processo de tomada de decisões e a noção errônea de clandestinidade também chegaria ao fim”,

No Brasil, alguns projetos legislativos preveem regulamentar o lobby. A maioria trata de regulamentação interna dos poderes ou está arquivada. O projeto de lei de Zarattini, apresentado à Câmara dos Deputados em 2007, mencionava claramente a intenção de disciplinar a atividade de lobby na administração pública federal. A versão substitutiva de Colnago, apresentada em 2012, não fala abertamente em
lobby, mas pretende disciplinar a atuação de pessoas e grupos de interesse que desenvolvam habitualmente, de forma remunerada ou gratuita, atividades destinadas a influenciar atos e decisões sujeitas à interpretação subjetiva do
Poder Público. Para exercer a profissão, o documento prevê que o lobista deverá, antes, credenciar-se nos órgãos em que atuará. O cadastro ficaria à disposição de qualquer cidadão pela internet.

Carlos Zarattini, deputado federal: regulamentar para evitar corrupção

Gute Garbelotto/CMSP

A proposta também traz algumas exigências para garantir a ética no exercício da profissão. Não pode ser lobista quem tiver atuado como servidor público e quem tenha sido condenado por ato de corrupção ou improbidade administrativa, enquanto durarem os efeitos da condenação. Outra prerrogativa é que os lobistas encaminhem anualmente, ao poder em que estiverem cadastrados, uma discriminação de suas atividades, da natureza das matérias de seu interesse e gastos realizados no último exercício devido a sua atuação nos Poderes e órgãos da administração pública federal, em especial pagamentos a pessoas físicas ou jurídicas com valor acima de R$ 1 mil. A declaração será divulgada na internet pelos próprios Poderes.

Para Zarattini, a aprovação da regulamentação ajudaria no combate à corrupção, mas setores muito fortes na Câmara dos Deputados são contrários, e demonstram seu posicionamento atrasando a tramitação da matéria. “Os interesses privados (dos parlamentares) não são condizentes com a regularização. Quando se pretende manter oculta uma relação entre o político e uma empresa, não se quer regulamentar. Se não quer aparecer nem regulamentar, é porque há algo errado”, opina o deputado petista.

O diretor da Patri concorda que não há interesse na aprovação do projeto. “Dificilmente será aprovado porque nesse caso todos terão que andar na linha: ONGs, prestadores de serviços, gestores políticos, entidades…”

Uma das principais referências utilizadas por Zarattini na elaboração de seu projeto vem da legislação norte-americana. Em sua abertura, o Lobbying Disclosure Act menciona que a divulgação efetiva da identidade e extensão dos esforços de lobistas pagos para influenciar funcionários do governo federal na condução das ações do governo aumentaria a confiança do público na integridade do governo. No Brasil, por enquanto, a palavra lobby ainda não aparece sequer no projeto de lei. Muito menos nos nomes das empresas… de lobby.

(*) Colaborou Rodrigo Garcia | rodrigogarcia@saopaulo.sp.leg.br

O que alguns vereadores paulistanos pensam sobre o lobby

A revista Apartes perguntou a alguns vereadores da Câmara Municipal de São Paulo o que achavam do lobby e da regulamentação da prática e recebeu as seguintes respostas.

Adilson Amadeu (PTB)
“Na Câmara Municipal de São Paulo desconheço a presença de profissionais com essa qualificação. Nunca fui procurado. Qualquer pessoa física ou jurídica tem o direito de se manifestar sobre assuntos do interesse dela. Cabe ao parlamentar diferenciar o que é interesse individual e coletivo. Não vejo problema nessas manifestações que, acredito, podem contribuir para o processo legislativo na medida em que acrescentam um novo olhar sobre as matérias que nos são apresentadas. Quanto à regulamentação da atividade, imagino que se ocorresse tiraria a impressão de atividade clandestina, ilegal, espúria que o lobby carrega. Evidentemente, uma regulamentação estabeleceria normas e limites. Nesse sentido acredito que seria positiva.”
Alfredinho (PT)
“Não acredito que o lobby contribua para o processo legislativo. O Legislativo não fica nem melhor nem pior com essa prática, embora eu não veja nada de ilegal no fato de um prefeito, por exemplo, procurar um parlamentar para obter recursos para o seu município. Entretanto, seria interessante que se estabelecessem regras públicas e o reconhecimento para pessoas exercerem essa prática. Assim como funciona nos Estados Unidos da América. Lá, por trabalharem dentro da legalidade, os lobistas conseguem intermediar e resolver muitos temas de interesse do povo. Por isso entendo que deveria ser regulamentado.”
Natalini (PV)
“Em minha opinião, lobby significa a pressão da sociedade sobre os agentes públicos, no caso os parlamentares. A pressão legítima e nas causas coletivas da sociedade é saudável e necessária na política. O desvio para pressões individuais e de interesses escusos e antirrepublicanos é que é deplorável. Acho que as demandas e pressões sociais devem ser públicas e abertas, para controle social.”

Netinho de Paula (PC do B)*
“Como parlamentar, acho sofrível a ausência de normas e prá- ticas que regulam a atividade de lobista no Brasil. Um guia para as normas de conduta dos membros da Câmara dos Comuns se faz com urgência necessária para a melhora de nossa recente democracia. Em sistemas parlamentares de democracias avançadas em todo o mundo este assunto é muito avançado. Países com regras e regulamentos que regem as atividades dos lobistas e grupos de interesse específicos são mais a exceção do que regra. Na União Europeia, o Bundestag (parlamento) alemão é a única câmara que tem regras específicas e formais relativas ao registro de lobistas. Todos os grupos que buscam articular ou defender um interesse devem se registrar no Bundestag. Esse registro, que está disponível ao público, é publicado anualmente. A definição de lobista é repleta de dificuldades. No caso da Austrália, tão inadequado foi o sistema de registro de lobistas de 1983, que se decidiu abolir o regime em 1996, pois foi considerado inexequível. Sistemas parlamentares estão sob uma pressão crescente para considerarem interesses e princípios democráticos fundamentais. Tal pressão pública e política normalmente surge de crises específicas ou escândalos que lançam os holofotes da mídia sobre a relação entre grupos de interesse, de um lado, e os políticos e burocratas do outro. Ao mesmo tempo, regulamento formal não é universalmente considerado uma panaceia. No Reino Unido a visão prevalecente é que a regulamentação legal inadvertidamente poderia conferir status especial de interesse. Isso poderia dar origem à impressão de que alguns grupos de pressão são mais favorecidos ou privilegiados do que outros. Sendo assim, termino este depoimento mostrando-me favorável à regulamentação da atividade.”
* Licenciado para a Secretaria da Igualdade Social até o fechamento desta edição

É LOBBY NÃO É LOBBY
  • Monitorar o cenário legislativo e administrativo
  • Fornecer às autoridades pareceres técnicos
    e sugestões
  • Orientar o cliente a visitar tomadores
    de decisões públicas
  • Procurar aliados e adversários para convencê-los a colaborar em seus objetivos
  • Usar a mídia para divulgar posicionamento
  • Receber remuneração para influenciar
    decisão judicial
  • Atuar para interferir em ato administrativo
    com aplicação prevista em lei e sem
    possibilidade de interpretação subjetiva
  • Forçar a ação de autoridades públicas,
    utilizando métodos ou processos escusos
  • Prejudicar ou perturbar reunião de
    interesse público
  • Receber bônus pelo êxito em benefício
    do cliente perante a administração pública
  • Oferecer vantagens a autoridade pública
    em troca de favores

* Esses casos podem configurar corrupção ou
tráfico de influência, passíveis de punição

Entrevista

Jorge Kayano é médico sanitarista e pesquisador, entre outros temas, de políticas e programas sociais no Instituto Pólis, Organização Não-Governamental (ONG) que busca a afirmação de direitos ambientais, urbanísticos, culturais e de participação social.

O que o Instituto Pólis pensa sobre a regulamentação da atividade de lobby?
Jorge Kayano: Nós temos posição favorável à regulamentação, sabendo que ela pode representar avanço para separar o que muitas vezes se chama de lobby mas são atividades ilegais de corrupção. Junto com interesses legítimos há os escusos, espúrios mesmo, corrupção direta, e é o que se chama de lobby.

Regulamentar facilitaria a atuação de organizações como a sua?
Não resolve o problema dos grupos da sociedade com os quais o Pólis se identifica, os mais excluídos, mais distantes das esferas de poder. Hoje, quem atua com estrutura para fazer um lobby correto e com gente competente são os grupos empresariais privados ligados aos serviços públicos mais dispendiosos. São exemplos: o setor imobiliário, as empreiteiras, as empresas de transporte público ou ligadas à limpeza pública. Diferentemente desses grupos com mais poder econômico e capacidade de arregimentar pessoas para o lobby, há grupos de interesse na sociedade sem as mesmas condições. A regulamentação teria que levar em consideração melhorar a igualdade para o exercício do lobby pelos diferentes grupos de interesse.

O que limita as ações de lobby das ONGs?
Algumas delas têm dificuldade para sobreviver, quanto mais para fazer lobby. Melhorar isso tem a ver com ampliar as possibilidades de fonte de financiamento da própria atividade das ONGs. A regulamentação do exercício do lobby tem que vir com outras reformas.

Quando as ONGs conseguem êxito fazendo lobby?

“Em nossa sociedade, há grupos em desvantagem para exercer o lobby”

Gute Garbelotto/CMSP

Um exemplo de lobby relativamente atuante e com boa imagem é o que luta pelo direito à educação, feito por muitas organizações e que impulsionou a criação do Fundo da Educação Básica. Essa é uma experiência positiva, que mostra que o lobby pela educação é legítimo. O movimento incluiu algumas organizações com mais recursos e outras com menos, mas o sucesso tem a ver com os interesses defendidos. ONGs com temas de maior aceitação social, legitimados pela sociedade, possuem mais chances de obter êxito também por conta do impulso que se chama de lobby indireto, no qual a manifestação da sociedade pressiona e facilita a tomada de decisões governamentais favoráveis. Outra possibilidade é o campo ambiental e de direitos da criança, que hoje tem mais acesso a recursos e fontes de apoio por representar uma tendência da sociedade.

LOBBY BRASIL ESTADOS UNIDOS UNIÃO EUROPEIA
Definição Não há definição oficial de lobista. Lobista é qualquer indivíduo empregado ou contratado por um cliente para fazer mais de um contato de lobby. Também é o indivíduo cujas atividades de lobby cheguem a 20% ou mais do tempo de serviço dedicado a um cliente durante um período de três meses. Não há definição consensual.
Registro Substitutivo ao projeto de lei 1202/2007 prevê que o Poder em que o lobista atua deverá disciplinar o cadastramento e o acesso às suas dependências. É feito na Câmara dos
Deputados ou no Senado.
Organizações e lobistas autônomos registram-se no site da UE para obter os cartões de acesso ao Parlamento Europeu para
trabalhos de lobby.
Sanções Vão da advertência à suspensão
do credenciamento por até três anos. Em ambos os casos, pode ainda ser apurada a responsabilidade criminal.
Vão de multa de até US$ 200 mil
a prisão por até cinco anos
(no caso de corrupção).
Incluem suspensão temporária do registro, exclusão do registro em caso de falha grave ou persistente e retirada de todos os cartões de acesso ao Parlamento Europeu.
Fontes: Projeto de lei 1202/2007,  The Lobbying Disclosure Act, Código de conduta da União Europeia

SAIBA MAIS

Sites

Lobbying Disclosure Act.
Disponível em lobbyingdisclosure.house.gov/amended_lda_guide.html

Normas de transparência da União Europeia.
Disponível em europa.eu/transparency-register/