Sem dono, sem documento
Quantidade de animais soltos na capital é grande, mas desconhecida, e abrigo do CCZ opera com capacidade máxima
Sândor Vasconcelos | sandor@saopaulo.sp.leg.br
Existe uma população abandonada nas ruas de São Paulo que não se manifesta, mas sofre com maus tratos, falta de alimento, doenças e outros problemas. Algumas notícias apontam cerca de dois milhões de desamparados, mas não existe número exato oficial. Esses desabrigados são os animais largados na capital paulista, principalmente cães e gatos.
A maior dificuldade para se chegar a um número preciso é saber se o animal que está na rua tem dono, se foi abandonado ou simplesmente fugiu. O próprio conceito de abandono também é controverso, já que muitos bichos recebem cuidados e vivem bem, soltos nos espaços públicos.
Fábio Jr Lazzari/CMSP
“É arriscado dizer se são abandonados, pois nada comprova”, afirma a médica-veterinária Ana Claudia Furlan Mori, gerente do Centro de Controle de Zoonoses (CCZ), ligado à Secretaria de Saúde de São Paulo. Segundo ela, a população estimada de animais domésticos com lar na capital paulista supera três milhões. “Muitos dos que são vistos nas ruas podem ter casa”, observa Mori.
Seja qual for o número, o certo é que os bichos que perambulam pelas ruas paulistanas podem causar transtornos, como acidentes ou ataque a pessoas, e transmitir doenças como raiva, toxoplasmose e sarna. “Não existe problema em São Paulo que não tenha grandes dimensões”, avalia Ana Claudia Mori. “E os animais soltos em vias públicas são um”, completa. Segundo a veterinária, “a proporção é a mesma de outros municípios de grande e médio portes, é um problema nacional”.
A gerente do CCZ paulistano acredita que os grandes culpados pela situação são os donos irresponsáveis, que “um dia resolveram ter um animal, propuseram-se a vacinar, dar ração, levar para passear, mas não conseguiram dar conta e simplesmente abriram a porta para o bicho ir embora”.
Vanice Orlandi, presidenta desde 2005 da União Internacional Protetora dos Animais (Uipa), entidade mais antiga do Brasil a atuar na área, culpa também a postura dos comerciantes de animais pelo alto número de abandonos. “Entregam para quem puder pagar, não querem saber o que farão com o bicho”, aponta Orlandi. “Estão livres para aumentar o problema e induzem as pessoas a adquirir os animais, como se vendessem carros”, lamenta. Segundo a presidenta, a Uipa, que realiza adoção dos bichos que recolhe, procura conscientizar o futuro dono sobre o grande trabalho que dá um animal de estimação. “Fazemos o papel de advogado do diabo”, compara.
Deveres estipulados por lei
Quem deseja ter um animal de estimação em São Paulo deve ter consciência de que existem responsabilidades estabelecidas pela lei 13.131/2001, do vereador Roberto Tripoli (PV). Esta norma obriga que todo cão ou gato, primeiramente, possua o Registro Geral Animal (RGA), cujo número deve ser usado permanentemente preso à coleira.
Caso o animal não seja registrado, seu dono pode ser intimado pela administração municipal para que providencie o RGA no prazo de 30 dias. Se mesmo assim não fizer, recebe multa de R$ 20 por bicho sem registro. Há, também, obrigação de manter as vacinas em dia, providenciar alojamento adequado e responder civil e penalmente pelos atos do animal, entre outras.
A lei 13.131/2001 ainda proíbe que se abandonem animais em vias e logradouros públicos e privados. A multa é de R$ 500 por bicho deixado nas ruas. Considera-se abandono o ato intencional de deixar o animal desamparado e entregue à própria sorte. Portanto, a perda do bichinho não é punida.
A mesma lei trata de sanções relativas a maus-tratos contra animais, quando comprovados por agente sanitário municipal. Quando essa situação é diagnosticada, o proprietário tem um prazo para resolver a irregularidade. Caso não faça, recebe multa prevista na lei federal 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais) e pode perder a posse do bicho.
Simone Brandão, da Coordenadoria Especial de Proteção a Animais Domésticos de São Paulo, reconhece a dificuldade de se denunciar os casos de abandono. “Como estar no mesmo local e momento em que a pessoa abandonou?”, aponta. Ela orienta que tais ocorrências sejam comunicadas à Polícia Militar, pelo 190, ou a outras autoridades públicas. No site www.uipa.org.br/como-denunciar há orientação para a elaboração de denúncias.
Vanice Orlandi, presidenta da Uipa, aponta também a dificuldade de associar o animal abandonado à pessoa responsável pelo ato: “Se você abandonar, não tenho como chegar até você e fazer com que responda”. Ela conta que em alguns países, como a Itália, os animais são microchipados e, se abandonados, a pessoa paga uma multa alta e responde a processo. “Aqui, canso de mandar até a placa do veículo que abandonou e não fazem nada”, lamenta a presidenta.
Sobre a atuação do Poder Público, Orlandi acredita que deveria haver uma política mais eficiente de esterilização para diminuir, de fato, a população. “Temos algumas coisinhas, mas é tudo paliativo”, reclama. Para ela, a questão de bichos largados nas ruas é gravíssima em São Paulo, e nem a Prefeitura sabe exatamente os números. Outro agravante, segundo ela, é que não há campanha educativa para que as pessoas deixem de comprar animais e esterilizem os que já possuem.
“Outro dia, tiramos dois cachorros de pessoas que ficavam batendo na cara dos bichos na rua”, conta Orlandi, que questiona: “Eram de raça, disseram que ganharam de ‘uma dona do Pacaembu’. Como é que se chega a essa dona?”. “Não existe das autoridades vontade de punir o abandono”, denuncia.
Em relação às campanhas de educação, a Prefeitura de São Paulo possui, desde 2001, o projeto Para Viver de Bem com os Bichos (PVBB), realizado em instituições de ensino municipais. O PVBB é resultado de parceria entre a Coordenação de Vigilância em Saúde (Covisa), o CCZ e a Secretaria de Educação. A proposta do programa é fornecer subsídios para que os profissionais de educação trabalhem com os alunos temas relacionados aos animais de estimação, meio ambiente saudável e fauna sinantrópica (animais que se adaptaram à vida com os humanos, como ratos, abelhas e aranhas).
O projeto utiliza palestras, vídeos e a experiência dos técnicos do CCZ, que levam aos participantes do curso informações sobre posse responsável de bichos de estimação, orientações sobre prevenção de agressões por parte desses animais e as principais doenças transmitidas. Em relação aos sinantrópicos, aborda as formas de controle e manejo ambiental adequado e prevenção de acidentes.
“Na Uipa, fazemos um trabalho para diminuir a chance de o dono abandonar o animal e alertamos que, se não o quiser mais, deve trazer para nós”, esclarece Orlandi. Ela conta que alguns bichos são devolvidos três anos depois da adoção. Existe, também, quem queira largar seu cachorro ou gato na entidade e, segundo Orlandi, às vezes até a polícia é acionada.
Bicho solto
Ainda segundo a lei 13.131/2001, os cães e gatos soltos nas ruas devem ser recolhidos. Os donos dos registrados são chamados ou notificados para retirá-los no prazo de cinco dias. Já os não identificados devem ser mantidos no CCZ.
Na prática, apenas os animais que colocam em risco a saúde da população ou que tenham sido atropelados, por exemplo, são apreendidos pelo CCZ. “A estrutura física é limitada e nada justifica recolher um animal apenas porque está na rua”, explica Ana Claudia Mori, gerente do órgão. Atualmente, cerca de 400 cães e 100 gatos estão alojados no CCZ e ficam lá até serem adotados ou morrerem. Os animais resgatados serão castrados, vacinados, desverminados e microchipados.
Devido a essa limitação, a gerente orienta quem encontra um animal nas ruas a tentar verificar a real situação do mesmo, se realmente não tem dono ou responsável. “De qualquer forma, se um bicho de pequeno porte está solto e não representa risco, não recolhemos”, esclarece Mori.
No caso de animais de grande porte, como equinos e bovinos, quando o CCZ recebe denúncias de maus tratos ou abandono em via pública, investiga a situação e, caso seja comprovada a crueldade, recolhe e envia para a Associação Paulista de Auxílio aos Animais (Apaa), Organização Não-Governamental (ONG) conveniada cuja função é dar destinação a esses animais, qualificados como de interesse econômico. “Já houve ocorrência de suíno solto na Avenida 23 de Maio, de touro na Marginal do Pinheiros”, relembra a gerente do CCZ.
Mozart Gomes/CMSP
A Uipa também recolhe cães e gatos desamparados, mas devido ao grande número de pedidos, existe uma triagem. “Um animal que tenha dono, que esteja, de certa forma, amparado, será preterido em favor de uma fêmea que está para parir na rua ou de um cachorro atropelado”, explica Vanice Orlandi, presidenta. Atualmente, a Uipa abriga cerca de 400 gatos e 800 cães, cujo consumo mensal de ração chega a R$ 20 mil.
Os animais feridos resgatados recebem tratamento e ficam disponíveis para adoção. “Já pegamos baleados, arrastados por veículos, queimados e com problemas de comportamento porque foram submetidos a maus tratos”, revela Orlandi. Para lidar com os bichos muito agressivos, a entidade possui adestradores voluntários. A Uipa possui a clínica mais antiga do Brasil, com cinco veterinários que atendem aos cães e gatos recolhidos e clientes particulares, de segunda a sábado, das 9h às 17h. A consulta custa R$ 60 e o valor é revertido para benefício dos animais cuidados pela entidade, que se mantém, também, graças à contribuição mensal de associados.
Hospital gratuito
Leandro Alves, anesteologista: “O que me encantou para trabalhar aqui foi prestar serviço gratuito e de qualidade”
Marcelo L.X./CMSP
Desde 2012, está em funcionamento no bairro do Tatuapé, zona leste paulistana, o primeiro Hospital Veterinário Gratuito, para atendimento a cães e gatos. O serviço é voltado, prioritariamente, a animais de abrigos ou cujos proprietários tenham baixa renda e estejam cadastrados em programas sociais, como Renda Mínima e Bolsa Família. Atendem-se, também, aos animais abandonados ou feridos recolhidos pelo CCZ.
O hospital foi viabilizado mediante verba específica no Orçamento proposta pelo vereador Roberto Tripoli, no valor de R$ 10 milhões, sendo R$ 7,2 milhões para o funcionamento do hospital no primeiro ano. Para o atendimento, foi realizado um convênio entre a Prefeitura e a Associação Nacional de Clínicos Veterinários de Pequenos Animais (Anclivepa-SP).
De acordo com Simone Brandão, da Coordenadoria Especial de Proteção a Animais Domésticos, ligada à Secretaria Municipal de Saúde, são distribuídas 30 senhas todos os dias da semana, às 7h. A fila começa a se formar, geralmente, às 2h. O hospital funciona das 7h às 18h, e todas as emergências são atendidas. Os cerca de 50 veterinários que formam a equipe atualmente são pós-graduados, alguns têm mestrado e doutorado.
Marcelo L.X./CMSP
Leandro Alves, veterinário há seis anos, é anesteologista do hospital e participou da primeira cirurgia da instituição, feita em um cachorro. Segundo ele, o total de atendimentos diários chega a 200, incluindo as novas senhas diárias, casos de emergência e os retornos.
O primeiro atendimento, onde é feita a triagem, acontece na Rua Professor Carlos Zagotis. O proprietário passa por entrevista com assistente social sobre sua condição socioeconômica. O paciente é encaminhado para o prédio principal, na Rua Serra do Japi, para um clínico-geral ou um especialista em ortopedia, dermatologia, oftalmologia, odontologia e clínica cirúrgica. Também são realizadas cirurgias ortopédicas e de tecidos moles, exames laboratoriais e tratamento de oncologia. Há, ainda, um serviço de imagem, com raios X e ultrassom. Os atendimentos mais comuns, segundo Leandro, são ortopédicos e oncológicos.
Desde a inauguração o hospital recebe grande demanda. As reclamações a respeito da demora no atendimento começaram a aparecer. Segundo Alves, a espera por uma cirurgia de mama chegava a 90 dias. A equipe decidiu fazer mutirões e, hoje, é capaz de operar os animais após uma semana de espera.
“Como atendemos um público de baixa renda, sabemos da dificuldade que é o transporte até aqui”, explica Leandro. “Não há condição de pagar um táxi ou até mesmo o metrô, pois é proibido carregar animais e a pessoa tem de escondê-los em uma mochila”, reconhece. Por esses motivos, ele ressalta a importância de se fazer o máximo de procedimentos no mesmo dia, evitando os retornos.
Segundo o veterinário, já houve casos de proprietários que chegaram às 23h para pegar senha apenas no dia seguinte. Quando a pessoa não consegue o número para atendimento, é obrigada a voltar em outro dia, sem atendimento preferencial.
Marcelo L.X./CMSP
Um dos pacientes atendidos pelo convênio com a Anclivepa foi o Manchinha. O gatinho foi entregue por um homem a Iracema Maria Santos, mais conhecida como “Maria dos Cachorros”, sob a seguinte ameaça: “Ou você fica com ele, ou eu o mato”. A protetora não teve escolha. Ficou com o bichinho e o levou para receber os cuidados veterinários.
Mozart Gomes/CMSP
Mesmo com as dificuldades, Leandro acredita que o serviço prestado é de ponta. “Eu posso fazer aqui as mesmas coisas que faria em um hospital com mais recursos”, avalia Alves. Segundo ele, entretanto, existe também carência de espaço. “Começamos em um prédio, que não deu conta; arrumamos outro e mesmo assim não dá. Para raio X, por exemplo, não conseguimos zerar a fila”, lamenta.
O repasse mensal da Prefeitura de São Paulo à Anclivepa é de, no máximo, R$ 600 mil e varia de acordo com os procedimentos realizados. Para fiscalizar, a administração tem acesso on-line aos prontuários dos animais que passaram pelo hospital e existe uma pesquisa de satisfação e qualidade, feita por telefone com os proprietários.
O próximo hospital veterinário, segundo o vereador Roberto Tripoli, está em fase de implantação: “Na administração do prefeito Fernando Haddad, consegui um hospital na zona norte e depois virão outros, em mais regiões da cidade”.
Probem
Dos R$ 10 milhões conseguidos no Orçamento 2012, R$ 2,8 milhões são para a construção do prédio do Programa Municipal de Proteção e Bem-Estar de Cães e Gatos (Probem), da Coordenadoria Especial de Proteção a Animais Domésticos.
O Probem foi criado por meio da lei 15.023/2009, também do vereador Tripoli. O objetivo do programa é promover e proteger a saúde de cães e gatos, garantir seu bem-estar e prevenir agravos à saúde pública e ao meio ambiente.
Segundo a coordenadora Simone Brandão, o programa está sendo reestruturado para que seja alavancado o número de adoções e castrações na cidade de São Paulo. O projeto contará com ações voltadas para as comunidades carentes e aldeias indígenas, locais que recebem grande número de animais abandonados. Os bichos serão levados ao CCZ para serem castrados, desverminados, registrados (RGA) e microchipados e, então, devolvidos às comunidades. “O programa é grande, precisa de estrutura, pessoal, e a licitação está sendo retomada para finalizar a construção do prédio”, explica Brandão.
Na rua e bem Tratado
Uma parcela dos animais soltos em locais públicos de São Paulo recebe cuidados de particulares, por conta própria. A iniciativa acaba tornando o cuidador, ou protetor, como alguns se autodenominam, responsável pela permanência do bicho nas ruas.
Ana Claudia Mori, gerente do CCZ, entende a situação dos cuidadores. “Para eles, é muito difícil ver um animal na rua e não se dispor a cuidar”, aponta Mori, que completa: “Às vezes, essas pessoas não têm espaço em casa, ou a família não quer o bichinho, então o alimentam na rua, dão vacina. Ele se torna um animal comunitário”.
A gerente classifica a situação, entretanto, como conflituosa. “Alguns gostam do bicho em locais públicos, outros não. O CCZ trabalha com a conscientização para que os cuidadores mantenham o animal saudável e com qualidade de vida”. Para ela, a maioria dos animais de rua é bem alimentada, então o CCZ não se posiciona contra a iniciativa dos cuidadores. “A questão é até onde podemos interferir no direito de uma pessoa cuidar do animal que vive em locais públicos”.
Adoção e cuidados
As feiras de adoções também seguem regras em São Paulo, estipuladas pela lei 14.483/2007, do vereador Roberto Tripoli. Segundo a legislação, os eventos não podem acontecer em praças, ruas, parques e outras áreas públicas. Os cães e gatos devem estar esterilizados e vacinados e precisam ter sido submetidos ao controle de parasitas.
O CCZ realiza quatro grandes eventos de adoção no ano. Os interessados também podem ir até o prédio do órgão (Rua Santa Eulália, 86, Santana) de segunda a sexta, das 9h às 17h, e aos sábados, das 9h às 15h. Mais informações sobre adoção estão disponíveis no www.prefeitura.sp.gov.br/zoonoses.
Na sede do CCZ, são disponibilizados serviços gratuitos como castração, vacinação contra raiva e vermifugação. Os animais têm de ser levados ao prédio localizado em Santana e o serviço está disponível durante o horário de funcionamento do Centro. Esses serviços gratuitos também são realizados pelas Supervisões de Vigilância em Saúde (Suvis), localizadas em todas as regiões da cidade. Os endereços das Suvis estão disponíveis no telefone 156 (Serviço de Atendimento ao Cidadão) ou no site www.prefeitura.sp.gov.br.
O CCZ promove mutirões para castração de cães e gatos em áreas prioritárias, com maior número de agressões, menor Índice de Desenvolvimento Humano e maior quantidade de pessoas. São feitas parcerias com clínicas e ONGs para execução do serviço.
Quem pretende levar um bichinho para casa pode participar também das feiras de adoção feitas pela Uipa, ir até a sede da ONG (Marginal do Tietê, 3.200) ou escolher o futuro amigo no www.uipa.org.br. Um dos adotados pelo site foi o Platão, que fará companhia a Rigissa Couere. “Entrei no site e me apaixonei por ele, aí mandei um e-mail e hoje estou aqui para levá-lo”, conta Rigissa, com a alegria estampada no rosto. Há animais que já estão há cerca de dez anos na Uipa e alguns enfrentam problemas de depressão.
Uma medida importante relativa às adoções são os critérios e fiscalização para garantir que o animal terá um bom lar. Na Uipa, o futuro dono passa por uma entrevista para se ter uma ideia sobre qual seria sua reação se o animal, por exemplo, destruísse algum bem. “Também tentamos conscientizar a pessoa de que há despesas e é necessário ter tempo para cuidados”, conta a presidenta, Vanice Orlandi. “A gente tenta investigar e levamos em conta o histórico do animal”, explica. “Se sofreu, não doamos a uma pessoa que fica o dia todo fora; se a casa não for telada, não doamos gato”, revela.
Após a adoção, é feita uma fiscalização periódica com visitas, na medida do possível. “Alguns adotantes mentem, dizem que têm condição, que vão levar para casa e acabam deixando o bicho trancado em um galpão”, lamenta Orlandi. Outros cuidados também são tomados para proteger os bichinhos: “Gato preto a gente não doa, só se for para uma pessoa muito conhecida”, explica. “Vem gente aqui querendo gato preto em plena sexta-feira 13”.
Sacrifício é proibido
Graças à lei, os CCZs, carrocinhas, canis públicos e congêneres do Estado são proibidos de sacrificar animais sadios, sendo permitida a eutanásia apenas em animais que apresentem doenças incuráveis ou que coloquem em risco a saúde pública.
Após aprovação da lei municipal 13.943/2004, de autoria do vereador Roberto Tripoli, o CCZ paulistano também é proibido de enviar animais capturados nas ruas para instituições e centros de pesquisa e ensino.
Saiba como tirar o registro animal (RGA)
Documentos: CPF, RG e comprovante de residência do proprietário.
Atestado de vacina contra raiva emitido e assinado por veterinário ou comprovante do CCZ expedido há no máximo 12 meses
Taxa: R$ 4,50
* O RGA é obrigatório por lei na cidade de São Paulo
Vida dedicada aos gatos
Por voltas das 20h30, no Parque da Aclimação, zona sul de São Paulo, ouvem-se os chamados: “Fraili, Capuccino, Ianque, Benjamim…”. Os gatos vão surgindo e sabem que a refeição chegará em breve. A responsável pela satisfação dos cerca de 50 felinos que vivem no local é Jacy Lins, que há quatro anos dá de comer a eles.
Jacy é tecnóloga autônoma e trabalha na área de construção civil. Vegetariana há 20 anos e vegana (não consome nada que tenha origem animal – carne, ovo, gelatina, couro, etc.) há mais de oito, é vizinha do parque e vive com três gatos que recolheu após serem atropelados. Sempre gostou de cuidar de animais, “desde cachorro até tartaruga”, segundo ela. Assumiu o compromisso diário porque, alimentando os bichanos no próprio parque, diminuiu a necessidade de irem buscar alimento em outros lugares, o que os deixava mais expostos a perigos.
Além dos gatos do parque, Jacy também assiste os que vivem nas ruas próximas. “Tinha de fazer algo, sentia um peso na consciência de gastar meu dinheiro com bobagem, sabendo que algum bicho passava necessidade”, justifica Jacy. E a conta é alta: somente com ração, são quase R$ 2 mil por mês. Mais as castrações (ao custo de R$ 70 cada) e consultas veterinárias (R$ 90 cada).
Apesar de saber que alguns serviços são disponibilizados gratuitamente pelo CCZ, Jacy esbarra na falta de um meio para levar os bichos. Por isso e pelo comportamento selvagem de alguns, nem todos os gatos do parque são castrados e vacinados. Para amenizar o problema, a cuidadora acha que deveria haver mais mutirões públicos de castração. “Num parque deste tamanho, nunca vi uma campanha aqui”, critica.
Para dar conta praticamente sozinha do cuidado com os felinos, a rotina de Jacy começa às 7h30 e termina de madrugada, por volta das 3h. “Às vezes, fico até 2 horas da manhã nas ruas”, revela. A cuidadora conta com alguns amigos para distribuir a ração no parque, mas o auxílio é esporádico. “Já espalhei panfletos pedindo ajuda, pois às vezes fico sem trabalho, mas é difícil alguém colaborar”, lamenta. “O que mais preciso é ração e serviços veterinários”, explica.
O grande sonho de Jacy é ter uma fazenda para viver com todos os gatos abandonados de sua vizinhança. Até que se realize, ela segue sua missão de cuidar dos bichinhos no parque. E nem pensa em levá-los para um abrigo. “Eles são felizes aqui, sobem em árvores, têm a vida selvagem.” E graças a ela, têm quem zele por eles. Todos os dias.
Meu animal de estimação morreu. O que faço?
Em São Paulo, existem dois transbordos, áreas que recebem os animais mortos para que sejam incinerados e levados aos aterros sanitários, sem custos. O Transbordo Santo Amaro fica na Rua Miguel Yunes, 480 (fone 5615-1927). O Transbordo Ponte Pequena localiza-se na Avenida do Estado, 300 (fone 3331-2811).
Outras opções são levar o animal para clínicas e hospitais veterinários, que dão a destinação correta, ou para um crematório. Esses serviços particulares são pagos.
A orientação do CCZ é para que jamais os animais mortos sejam enterrados em quintais ou terrenos, ou jogados em locais públicos, pois contaminam os lençóis freáticos. Essa prática pode configurar crime ambiental, passível de pena.