Nº15 – Zoneamento

Construção em parceria

Câmara conta com participação dos cidadãos para aprimorar uma das leis de maior impacto no funcionamento da cidade

Gisele Machado | gisele@saopaulo.sp.leg.br

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Montagem sobre foto de Alexandre Giesbrecht /Wikimedia Commons

Você sabe por que em seu quarteirão só há residências e, a poucos metros, moradores dividem espaço com bancos, lojas, restaurantes e shoppings? O que pode funcionar em cada pedacinho da cidade (entre outras determinações) está definido na Lei de Zoneamento, a mais importante para a organização territorial do Município ao lado do Plano Diretor Estratégico (PDE), que dá as diretrizes gerais para o desenvolvimento da capital.

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DEBATE – Vereadores coordenam audiência pública na CMSP, em junho

Ângelo Dantas/CMSP

Até novembro, os vereadores da Câmara Municipal de São Paulo (CMSP) e a população vão discutir, em pelo menos 46 audiências públicas, o Projeto de Lei (PL) 272/2015, que revisa a Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo (LPUOS), mais conhecida como Lei de Zoneamento, em vigor desde 2004. A LPUOS “determina qual tipo de atividade pode ser desenvolvida em cada local da cidade”, explica o vereador Gilson Barreto (PSDB), presidente da Comissão de Política Urbana, Metropolitana e Meio Ambiente da Casa.

Segundo Barreto, com a revisão ficará definido, por exemplo, se uma determinada área pode ter residência, comércio, serviço ou indústria, como devem ser as construções, a altura máxima dos edifícios, a reserva para habitação popular e as áreas verdes.

Entregue à Câmara em 2 de junho pelo prefeito Fernando Haddad (PT), o PL 272 passou pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), para verificação da legalidade, e depois seguiu para a Comissão de Política Urbana, que comandará o debate entre o Legislativo e a sociedade. O projeto de lei foi construído pelo Executivo com ampla participação popular e estabelece objetivos a serem alcançados até 2029. “O compromisso em ouvir a cidade nessa segunda rodada, agora no Legislativo, tranquiliza o cidadão que porventura não viu sua pretensão contemplada nesse texto”, disse Haddad no dia em que entregou a proposta à CMSP.

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REALIDADE – Para o relator, Paulo Frange, revisão do zoneamento lida com a cidade real

Ricardo Rocha/CMSP

ABERTO A SUGESTÕES

A Lei de Zoneamento teve de passar por revisão para se adequar ao Plano Diretor Estratégico aprovado no ano passado, que orienta e planeja o desenvolvimento da cidade pelos próximos 13 anos. “O PDE mostra a cidade com que sonhamos e a Lei de Zoneamento aponta como se faz para isso acontecer”, explica o vereador Paulo Frange (PTB), membro da Comissão de Política Urbana e relator do PL 272.

No portal www.saopaulo.sp.leg.br há uma página especial sobre a Lei de Zoneamento, onde é possível acessar o projeto de lei e enviar sugestões. Também está disponível a agenda das audiências públicas sobre a revisão da LPUOS. Quem participar desses encontros poderá deixar as contribuições por escrito, bem como se inscrever na hora para falar aos vereadores (veja o passo a passo para participar no final da página). Todos que colaborarem receberão um retorno da Câmara.

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ORGANIZAÇÃO – Lei define o que pode existir em cada quarteirão, explica Gilson Barreto

Ângelo Dantas/CMSP

Como relator do projeto, Frange é responsável por coordenar a organização das sugestões recebidas, com as quais fará um relatório sugerindo modificações ou inovações no projeto. Os vereadores estimam terminar em dezembro as duas votações obrigatórias do texto. Quando aprovado pela CMSP, o projeto será enviado ao prefeito, para sanção (transformação em lei).

A mobilização e a participação dos cidadãos são muito importantes. Moradores da região dos Jardins, por exemplo, ganharam bastante força por se manifestarem nas audiências públicas (alguns contra, outros a favor) sobre a criação de Zonas Corredores (que permitem pequenos comércios) nas áreas que delimitam o local onde vivem. Hoje, os Jardins são estritamente residenciais, mas possuem atividades comerciais em grande parte já regularizadas nos eixos de maior oferta de transporte, que agora vão se chamar Zonas Corredores. “É uma grande cortina de fumaça quando o real debate do futuro e do desenvolvimento da cidade está sendo travado em outros 96% da cidade”, disse à Apartes o secretário municipal de Desenvolvimento Urbano, Fernando de Mello Franco.

Em linhas gerais, os pontos a serem abordados na revisão da Lei de Zoneamento estavam previstos no PDE de 2014, mas os detalhes do PL trouxeram algumas inovações. “O projeto traz uma dose de coragem porque busca lidar com a cidade real”, elogia Frange. A seguir, as principais propostas do PL 272.

  • Simplificação

Um dos maiores avanços do projeto é consolidar todas as regras de parcelamento, uso e ocupação do solo. O parcelamento compreende as dimensões e as regras para divisão de lotes, enquanto o uso são as atividades permitidas nesses locais. Já a ocupação são os parâmetros sobre o modo de construir (altura e área da edificação, por exemplo).

“A proposta contempla o que foi possível aproveitar de 51 leis antigas e revoga as que não eram necessárias”, diz Frange. Atualmente, para aplicar a Lei de Zoneamento é necessário consultar várias dessas legislações (a mais antiga é de 1951), o que pode gerar interpretações ambíguas. “A simplificação dá segurança a quem investe, prospecta e a quem faz o licenciamento na Prefeitura”, explicou, em audiência pública na CMSP, Daniel Montandon, diretor do Departamento de Uso e Ocupação do Solo da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano.

O PL 272 também quer abolir os 31 cadernos anexos da Lei de Zoneamento de 2004, com regramentos para cada Subprefeitura. Se a mudança for aprovada, as definições de zonas passam a valer para a cidade inteira.

  • Cota ambiental

Para conseguir o licenciamento, construções em lotes com mais de 500 m² deverão atingir uma pontuação mínima em drenagem de água, redução das ilhas de calor e incremento da paisagem, por meio de medidas como plantio de árvores, instalação de telhados verdes e outros dispositivos para reter água da chuva. Quem, comprovadamente, conseguir mais pontos do que o necessário terá desconto no valor da outorga onerosa, até o limite do total investido nos melhoramentos ambientais (na capital, a construção de edifícios é gratuita até o limite definido para cada zona, e quem quiser edificar acima do permitido deve pagar a Outorga Onerosa do Direito de Construir).

“É algo que nenhuma outra cidade brasileira tem”, revela o secretário Fernando de Mello Franco. Segundo ele, “ainda que haja pequenas falhas na proposta, ou coisas que não foram incorporadas (como a geração de energia), é hora de colocar a questão em pauta”.

  • Edifícios-garagem

Alinhado ao Plano Diretor, que previa condições especiais para edifícios-garagem próximos a eixos de transporte, o PL 272 determina que os estacionamentos verticais construídos nas imediações de estações de trem e metrô, em bairros distantes do centro, receberão até 75% de desconto na outorga onerosa. “Estima-se que mais de 60 mil veículos ficarão nessas garagens incentivadas, para que seus ocupantes venham de transporte público para o centro expandido”, explica Frange.

  • Regularização de empreendimentos

A proposta de revisão do zoneamento quer transformar 14 km² de uso residencial em Zona Mista de Interesse Social (Zmis), o que possibilita a regularização de muitos empreendimentos localizados em áreas com população de baixa renda, particularmente nas zonas leste, sul e parte da norte.

  • Interesse social

O Plano Diretor prevê 180 km² para zonas prioritariamente destinadas às habitações de interesse social (Zeis). No entanto, ao organizar essas áreas na proposta da Lei de Zoneamento, a Prefeitura teve de fazer ajustes que ampliaram a reserva para 203 km². Trata-se de assentamentos precários, informais, irregulares, áreas vazias ou subutilizadas, que ocuparão 13,5% do território paulistano.

  • Zona rural e industrial

O projeto propõe demarcar a área rural do Município, que corresponde a 20% do território e está localizada principalmente na zona sul, com trechos também nas zonas norte e leste. Atualmente, essa zona é considerada área verde, simplesmente. “Com a mudança, será permitido todo tipo de manejo de atividade rural, com geração de renda e emprego”, explica o relator Paulo Frange.

O PL ainda qualifica como zonas predominantemente industriais as regiões próximas às rodovias ou aos grandes eixos que conectam a região metropolitana, o que representa 2,5% do Município. “Direcionaremos as futuras áreas industriais de modo que os caminhões não tenham que circular pela cidade”, diz Frange.

  • Dimensões máximas

O novo zoneamento quer evitar a formação de grandes quadras, pouco amigáveis a quem anda a pé e à mobilidade urbana sustentável, de modo geral. O limite, que varia entre as zonas, chega ao máximo de 15 mil m² e não se aplica às zonas especiais de preservação ambiental.

O objetivo é aumentar a proporção de espaços livres em relação à área construída, para corrigir um equívoco histórico de planejamento. “São Paulo foi loteada de uma maneira muito precária, com chácaras e oferta insuficiente de terra para sistemas públicos, ruas, calçadas, áreas livres e equipamentos”, explica Fernando de Mello Franco, secretário de Desenvolvimento.

SAIBA MAIS
Site
Lei de Zoneamento. (calendário das audiências públicas, minuta do projeto e dicionário de termos técnicos): www.saopaulo.sp.leg.br/zoneamento
Revista
Apartes edição 9 – Uma nova direção para São Paulo.
Apartes edição 11 – Do papel para a sua vida.
Apartes edição 13 – O passo seguinte. 

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André Bueno/CMSP

O secretário municipal de Desenvolvimento Urbano, Fernando de Mello Franco, falou à Apartes sobre o que espera da nova Lei de Zoneamento:

Qual o destaque do projeto?

Franco: O grande diferencial é essa visão sistêmica, de articulação, de fortalecimento das funcionalidades da capital, em detrimento de uma colcha de retalhos que faz uma São Paulo cada vez mais não funcional. Porque nenhuma cidade se faz como um arquipélago.

Como será São Paulo com o novo zoneamento?

A gente começa uma força de mudança, de transformação, que vem amparada sobretudo pela população mais jovem, que é mais consciente.

A cidade está mudando sua forma de se locomover. Isso pressupõe usarmos transportes públicos, meios não motorizados, seja bicicleta, seja andar a pé mesmo, que é uma delícia, para vivenciar a cidade. A gente vê o quanto as pessoas estão disputando poder voltar às ruas e fazer do espaço público seu espaço de encontro. Também temos consciência, cada vez mais, de que a mudança climática está aí, a crise de água mostra que ninguém está mentindo, e que precisamos pensar a maneira com a qual o modelo urbano vai se relacionar com o meio ambiente. A gente quer viver de uma maneira mais alegre, e isso pressupõe outra cultura urbana.

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