Envelhecimento é tratado pela CPI da Violência Contra Trans e Travestis

André Bueno | REDE CÂMARA SP

Reunião da CPI da Violência Contra Pessoas Trans e Travestis desta sexta-feira (27/5)

ANDREA GODOY
DA REDAÇÃO

A CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Violência Contra Pessoas Trans e Travestis realizou uma reunião nesta sexta-feira (27/5) sobre o envelhecimento dessa faixa da população e os desafios, que podem ser sanados por meio de políticas públicas. Os participantes falaram sobre o etarismo e a “invisibilidade” de idosos, principalmente de transexuais e travestis. Também da falta de protocolos especiais na saúde para idosos com esta orientação sexual e da falta de pesquisas sobre o tema.

Na primeira parte da reunião, travestis falaram sobre suas percepções e dificuldades com o envelhecimento e na segunda, foi a vez de representantes da Prefeitura responderem sobre programas voltados à terceira idade, além da participação de uma professora universitária, que coordena um grupo de estudo acadêmico sobre LGBTQIA +.

Thaís Azevedo, presidente da ONG Pela Vidda-SP, voltada ao apoio de pessoas vivendo com HIV/Aids, afirmou que nas unidades de saúde ainda há desrespeito ao nome social. “Temos dificuldades de ser respeitadas, pois tem profissionais que nos chamam pelo nome civil”, revelou. Ela também falou que as pessoas no Poder Público que tem preconceito e questões pessoais contra a comunidade LGBTQIA + perseguem e dificultam o acolhimento de políticas públicas necessárias.

A professora e diretora de teatro Esther Antunes, relatou dificuldades com a empregabilidade desde que assumiu sua transexualidade. “Estou há 7 anos desempregada, já trabalhei muito desde 1974, recolhi INSS até os meus 55 anos e não consegui me aposentar ainda”, contou.

Esther trabalhou na direção de peças de clubes e deu aula em uma universidade, mas disse que após deixar de ser Marcos Antunes não teve os contratos renovados. “Eu me quebrei inteira. Com todo o meu currículo, eu não consigo um trabalho e acho que a idade complica muito, pois na sociedade se diz que o velho sempre vai dar trabalho, por isso preferem contratar o mais novo”, concluiu.

A fundadora da igreja Trans ICM Séforas, pastora Jacqueline Chanel, falou sobre envelhecimento, mas também contou sua história de militância e fé. Foi na década de 90, que ela começou sua jornada ao organizar um movimento no Pará contra a matança de gays e travestis, que estava em alta naquele Estado. Ela também trabalhou junto à Secretaria da Saúde, indo à boates ajudar na informação sobre prevenção de Infecções Sexualmente Transmissíveis, deu entrevistas na TV e foi ameaçada de morte.

Já em São Paulo ela, que afirmou “sempre ter cuidado da própria espiritualidade”, enfrentou várias exclusões em igrejas evangélicas tradicionais, até que entrou em contato com o evangelho inclusivo. Jacqueline foi consagrada pastora e implantou a primeira igreja trans no Brasil. Na pandemia chegou a entregar 6 mil refeições solidárias por mês à população em situação de rua.

Sobre o envelhecimento, a pastora Jacqueline também reforçou a discriminação sentida no sistema de saúde. “Não respeitam o seu nome social, te ferem, tratando você pelo seu nome civil. A pessoa prefere adoecer do que ser humilhada”, ponderou.

A presidente da CPI,  vereadora Erika Hilton (PSOL) perguntou se a igreja Trans sofre perseguição tal como as religiões de matriz africana e a pastora afirmou que “não há agressão física, porém que eles são demonizados por fundamentalistas nas redes sociais”.

A vereadora Juliana Cardoso (PT) quis saber a opinião da pastora sobre parlamentares evangélicos “que combatem as pautas LGBTQIA+ e fazem discursos contrários a essas causas”. Jacqueline respondeu que “a maioria dos religiosos são fundamentalistas”. “Em nome de Deus eles até matam. Só o que podemos fazer é mostrar o amor, ajudar os moradores de rua e as pessoas de fora. Estou levando a mensagem do amor”, refletiu.

Falta de protocolos e pesquisas em saúde para LGBTQIA+

A neurocientista Sandra Ortiz, que coordena um grupo de gerontologia LGBTQIA+, foi enfática em dizer que a ciência é heteronormativa e cisgênero, pois não pesquisa o envelhecimento fora dessa perspectiva. Além disso, Sandra explicou que o grupo que coordena “tem parcerias com várias universidades para trazer a questão do envelhecimento LGBTQIA + para o meio acadêmico, nos reunimos a cada 15 dias”.

Perguntada pela vereadora Erika Hilton sobre os desafios mais comuns na saúde da terceira idade de pessoas trans e travestis relativos à terapia hormonal ao longo prazo ou  ao uso de silicone industrial, Sandra respondeu que “não tem nenhum trabalho que fale quais são as patologias mais presentes, mas compreendendo um pouco o universo da reposição hormonal há relação com diversos tipos de tumores. Muitos dos tumores são alimentados pela questão hormonal, independente do corpo: câncer de mama, útero, testículo são significativos”.

O assessor parlamentar e de gestão participativa da Secretaria Municipal da Saúde, Ivan Cáceres, afirmou que o etarismo é sofrido por todos os idosos. “A questão do envelhecimento não é só na população trans, é da cultura ocidental e capitalista, onde o velho não serve. Imagina para quem saiu da caixinha de padrão da sociedade?”, disse. “Enquanto as diferenças não forem reconhecidas o atendimento dessas pessoas não será adequado, a academia não preparou os profissionais para isso”, completou.

A coordenadora da área técnica de saúde integral da população LGBTIA+, Tania Regina Correa de Souza, informou que a Prefeitura está fazendo a revisão do protocolo trans do município. Segundo ela, os prontuários municipais vão ter campos para preencher identidade de gênero, orientação sexual e já existe uma casa alugada, que está em reforma, para abrir talvez em agosto um ambulatório para pessoas transexuais.

“Para este novo protocolo vai ter um capítulo especial para a população trans idosa. Eu sinto muito que ainda a maior queixa seja sobre o acolhimento nas unidades de saúde, isso é uma coisa que temos trabalhado incessantemente e todas as unidades são obrigadas a ter a placa de respeito ao nome social, em todas as discussões enfatizamos isso. Estamos sensibilizando os profissionais de saúde”, esclareceu.

A coordenadora da área técnica de Saúde da Pessoa Idosa da Secretaria Municipal de Saúde, Rosa Marcucci, falou sobre o PAI (Programa Acompanhante de Idoso) que atende idosos em situação de fragilidade e vulnerabilidade com suporte nas atividades de vida diárias.

A reunião presidida pela vereadora Erika Hilton (PSOL), contou ainda com o vice-presidente, vereador Eduardo Suplicy (PT), a relatora, vereadora Cris Monteiro (NOVO) e a vereadora Silvia da Bancada Feminista (PSOL). Para assistir a íntegra, basta acessar o vídeo abaixo:

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