Especial: educador defende escola bilíngue para surdos em SP

Tarde de segunda-feira, dia 16 de setembro. Um silêncio, vez ou outra interrompido, paira nos corredores da Escola Municipal de Educação Especial Helen Keller. Nas salas de aula, professores da Educação Infantil e do 1º ao 5º ensinam os alunos por meio da Libras (Língua Brasileira de Sinais), principal forma de comunicação dos surdos. A escola, que é um dos poucos estabelecimentos de ensino bilíngue para surdos em São Paulo, não é aceita pelo MEC (Ministério da Educação), que incentiva as escolas inclusivas.

Professor de matemática na Helen Keller, Neivaldo Zovico defende que as escolas inclusivas não são as mais apropriadas para pessoas que têm esse tipo de deficiência, pois elas precisam da troca com seus pares para se desenvolverem plenamente e de materiais próprios para a aprendizagem. Quem tem outras deficiências ou até baixa audição consegue aprender em escolas desse tipo, pois compreendem a linguagem oral, mas o surdo não, afirma. Durante a audiência pública realizada na Câmara Municipal que debateu as mudanças no programa Mais Educação São Paulo, da Prefeitura, Zovico falou da necessidade de concursos para professores surdos e de mais escolas bilíngues na capital paulista.

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Surdo de nascença, o professor nunca teve vergonha de seu problema, que é de fundo genético. Pelo contrário, sempre foi desinibido e bastante expansivo. Filho de um casal de ouvintes, ele e o irmão Nelson, que também é surdo, tiveram dificuldades para estudar quando criança em Limeira, cidade onde nasceram, pois lá não havia escolas especiais, somente salas de aula compostas por alunos de idades diferentes. Foi esse o motivo que fez a família se mudar para São Paulo. Eles alugaram uma casa na Aclimação e os meninos foram matriculados na Helen Keller.

Na época, o método de ensino da escola era outro. Acreditava-se que por meio da oralização os alunos aprenderiam a falar. Eles eram muito rígidos e se a gente se comunicasse por sinais, logo chamavam a nossa atenção. Do portão para fora era outra história e aí usávamos livremente os sinais, nossa primeira língua, lembra. Neivaldo estudou na escola até a antiga 4ª série (atual 5º ano) e dali para frente enfrentou grandes dificuldades por onde passou. Até deixar de cursar o colegial ele quis.

Incentivado por um amigo, o limeirense prosseguiu nos estudos, prestou vestibular e cursou matemática na Unifai. Formou-se em 2001 e começou a dar aulas em 2007. Hoje, ensina em LIBRAS na escola Helen Keller e no Instituto Santa Terezinha.

Oficialmente reconhecida em 2002, a LIBRAS é utilizada atualmente pela maioria dos surdos. Mistura a Língua de Sinais Francesa e a antiga língua de sinais brasileira. Foi importante o reconhecimento da LIBRAS porque mostra que o indivíduo surdo não é mudo e tem uma língua própria, afirma o professor.

A surdez definitivamente é um obstáculo que Zovico ultrapassa com tranquilidade. Aos 47, está namorando e procura se divertir sempre que possível. Adora ir ao cinema, por exemplo, e quando está em casa, gosta de assistir aos programas de humor da televisão. Segundo o professor, as piadas que os ouvintes contam são divertidas. Infelizmente nem todos os programas têm legenda, ressalta. 

Sem pensar duas vezes, Zovico afirma que hoje em dia a vida de um surdo é bem mais fácil do que há 30 anos e a tecnologia foi uma das maiores responsáveis por isso. Agora, com o celular e o videofone posso conversar com a minha namorada em paz. Antigamente, como precisava de alguém para fazer a ligação para mim, essa pessoa ficava sabendo de tudo o que eu queria falar. Dava para namorar desse jeito?, brinca. (Rafael Carneiro da Cunha)

 *A entrevista com Neivaldo foi feita por meio de uma intérprete.

(20/9/2013 – 16h20)

 

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