Nº13 – Ambiente

O verde da selva de pedra

Fábricas de água e ares-condicionados naturais, as árvores melhoram a vida na cidade, mas ainda são poucas em São Paulo

Fausto Salvadori Filho | fausto@saopaulo.sp.leg.br

CUIDADO — Lorena planta ipê no Parque Augusta, um dia antes da reintegração

Ricardo Rocha/CMSP

Falta verde em São Paulo. Levando em conta a cobertura vegetal em parques e praças, a cinzenta capital paulista tem 2,6 m² de áreas verdes para cada habitante do Município, segundo os dados da Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente. É quatro vezes menos do que o índice recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) – 12 m² por habitante.

Como as árvores são “fábricas de água”, que também atuam como ares-condicionados naturais, aliviam o barulho, combatem a poluição e previnem enchentes (veja mais no infográfico), é fácil imaginar como a falta de arborização contribuiu para lançar São Paulo numa feroz crise hídrica e ainda ajudou a deixar a cidade cada vez mais quente, poluída e sujeita a alagamentos. E, como nada é simples em São Paulo, quem vive em ruas arborizadas nem sempre está feliz, pois morre de medo de ser morto pela queda de uma árvore na próxima chuva. Ao mesmo tempo, há quem brigue até com a polícia para garantir mais verde na cidade.

HIGIENÓPOLIS — Márcio receia queda de galhos no colégio de seus filhos

Fábio Lazzari/CMSP

Foi o que aconteceu na manhã de 4 de março, quando a região central viu policiais militares retirarem, com ameaças e algumas cassetadas, um grupo de ativistas que defendia a preservação total do Parque Augusta, no bairro da Consolação, uma área verde com 24,7 mil m² e mais de 600 árvores remanescentes da mata atlântica.

“É muito triste ver tantos cidadãos tendo de brigar para ter mais verde na cidade de São Paulo”, lamentou o vereador Toninho Vespoli (PSOL). Ao lado de Gilberto Natalini (PV), foi ao Parque Augusta acompanhar o despejo dos ativistas, que ocupavam o local desde 17 de janeiro. A Justiça havia determinado a reintegração de posse do terreno a pedido das suas proprietárias, as construtoras Setin e Cyrela, que pretendem utilizar 40% do terreno para construir torres de apartamentos. Diante dos escudos dos policiais, os ativistas atravessaram os portões do parque carregando mudas de árvores e cartazes em que pediam a aplicação da Lei 15.941, que em 2013 autorizou a Prefeitura a criar o Parque Augusta.

Para o vereador Aurélio Nomura (PSDB), um dos autores do projeto de lei (PL) que criou o parque, em 2006, o atual plano das construtoras vai contra os objetivos da lei. “O meu projeto não falava em meio parque, mas em um parque integral”, afirma. O PL é assinado também pelos vereadores Gilson Barreto (PSDB), Mario Covas Neto (PSDB), Patrícia Bezerra (PSDB), Ricardo Nunes (PMDB), Ricardo Young (PPS) e Toninho Vespoli (PSOL), e pelos ex-vereadores Coronel Camilo, Coronel Telhada, Floriano Pesaro e Juscelino Gadelha.

Após aprovação na Câmara Municipal de São Paulo (CMSP), o projeto foi sancionado pelo prefeito Fernando Haddad (PT), em 23 de dezembro de 2013. O objetivo era pôr fim a uma disputa que se arrastava desde 1970, quando pela primeira vez o terreno foi declarado de utilidade pública para transformação num parque. Ainda no final de 2013, uma semana após a sanção, as construtoras fecharam os portões do parque. Em 7 de abril, foram obrigadas a reabri-los por conta de uma decisão judicial. Neste ano, conseguiram um sinal verde do Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (Conpresp), que autorizou a construção das torres.

ESSENCIAIS — Árvores são fundamentais para amenizar calor, poluição e enchentes

Fábio Lazzari/CMSP

A ocupação do Parque Augusta reuniu milhares de pessoas, de professores e arquitetos a crianças e moradores de rua, que buscavam resistir à especulação imobiliária e, ao mesmo tempo, descobrir novas maneiras de conviver na cidade. Em dois meses, plantaram 200 árvores brasileiras, criaram uma horta e uma biblioteca comunitárias e promoveram oficinas, palestras e debates, além de shows de músicos como Arnaldo Antunes e Karina Buhr. “Estamos aqui numa luta por qualidade de vida e pelo direito, que todos temos, de viver num ambiente saudável”, explicou a bióloga Lorena Gebara, 27 anos, uma das ativistas expulsas. Ela lembra que a falta de árvores está na raiz (sem trocadilhos) de problemas tão graves como os recordes de temperatura no verão paulistano ou a crise hídrica que esvazia as torneiras do Município.

MEDO DE ÁRVORE

Enquanto tantos brigam por mais árvores, outros que moram à sombra delas nem sempre se sentem felizes. É o caso do economista Márcio Moraes, 45 anos, morador de Higienópolis, na região central. “Sempre que chove por aqui eu me sinto inseguro. Fico pensando se mais alguém vai morrer pela queda de uma árvore”, conta.

PROTESTO — Ativistas do Parque Augusta cobram aplicação de lei aprovada na Câmara

Fausto Salvadori Filho/CMSP

Em dois meses, Márcio viu duas pessoas serem mortas em seu bairro: o passageiro de um táxi, esmagado por um tronco que despencou na Rua Itacolomi, em 22 de dezembro, e um homem eletrocutado depois que a queda de uma árvore derrubou fios de alta tensão na Rua Tupi, em 25 de fevereiro. O medo maior, porém, Márcio sente pelos dois filhos, de 3 e 9 anos, que estudam no Colégio Renascença, na Rua São Vicente de Paula. “Há três árvores ali com risco visível de queda de galhos de grande porte”, aponta. Segundo ele, um dos galhos já caiu, amassando um carro. O economista afirma que técnicos da Subprefeitura da Sé foram ao local e retiraram amostras das árvores, mas não lhe deram retorno sobre o estado delas. Em 7 de abril, a Subprefeitura Sé disse à Apartes que as árvores da rua estavam sendo vistas e analisadas. “Podas estão sendo feitas durante esta semana, mas nenhuma árvore possui contaminação interna que obrigue a sua retirada”, afirmou a assessoria de imprensa.

A facilidade com que as árvores caem e matam em São Paulo é fruto (de novo, sem trocadilhos) de uma longa série de erros adotados na arborização. “O modelo de gestão da arborização urbana vem sendo executado de maneira errada há décadas. Tanto as espécies como o porte das árvores precisam ser repensados”, afirma Adriana Inês Rossetti, engenheira agrônoma da Secretaria das Subprefeituras.

QUEDA — Árvore cai em carro do vereador Andrea Matarazzo (em destaque)

Assessoria Andrea Matarazzo (foto maior)
e Fábio Lazzari/CMSP (foto menor)

Além do erro histórico de arrancar as espécies nativas da mata atlântica e substituí-las por árvores importadas, menos adaptadas ao ambiente local, o plantio das árvores não levou em conta questões como a qualidade do solo, o comportamento das raízes ou a interferência, por cima, dos fios da rede elétrica, e, por baixo, das redes subterrâneas de esgoto, telefonia, luz (veja mais no infográfico). A engenheira lembra que bastaria plantar corretamente as árvores para tornar a vida na cidade suportável. “Como temos poucos parques, o plantio ao longo da malha viária é importante para reduzir a temperatura ambiente”, explica.

Para tentar agilizar a manutenção do verde paulistano, os vereadores Andrea Matarazzo (PSDB), Alfredinho (PT), Claudinho de Souza (PSDB), Reis (PT), Rubens Calvo (PMDB), e Toninho Paiva (PR), junto com os ex-vereadores Coronel Camilo, Coronel Telhada e Roberto Tripoli, elaboraram um PL que originou a Lei 16.137/2015, sancionada em 16 de março pelo prefeito. A legislação autoriza os subprefeitos a delegarem para os engenheiros agrônomos da Prefeitura a competência de autorizar podas de árvores. Até então, o serviço só podia ser aprovado pelo próprio subprefeito, o que tornava o processo muito burocrático. “A espera para uma poda em São Paulo pode chegar a dois anos, o que é um absurdo”, critica Matarazzo. O vereador conhece o problema de perto: em 13 de fevereiro, uma árvore caiu sobre o seu carro, no Largo do Arouche, região central. “Foi uma sorte ninguém ter sido atingido”, declarou, na época.

Em audiência pública realizada na CMSP sobre o projeto das podas, o engenheiro agrônomo Marcelo Cocco Urtado, arborista certificado pela International Society of Arboriculture, disse que a cidade só conseguirá dar conta da questão do verde quando criar um Plano Diretor de Arborização, a exemplo do que existe em Porto Alegre (RS). Sem esse instrumento, o agrônomo acredita que os diferentes setores do poder público seguirão batendo cabeça. Ele cita como exemplo o Manual Técnico de Arborização Urbana, da Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente, que não recomenda o plantio em calçadas com menos de 1,90 m. O manual não conversa com a Lei de Zoneamento, que prevê a maioria das calçadas com menos de 1,90 m em loteamentos. “Na prática, estão proibindo árvores em loteamentos novos”, explica.

Segundo Urtado, um Plano de Arborização ajudaria a harmonizar as diferentes normas e definiria, por exemplo, que espécies poderiam ser plantadas, com que tamanho, em cada bairro da cidade. “É importante fazer uma discussão com a população e todos os órgãos públicos envolvidos para que todos falem a mesma língua”, sugere.

A ÁRVORE E O POETA

Só no ano passado, a Prefeitura de São Paulo afirma ter realizado 102 mil podas e 14 mil remoções de árvores. Embora insuficiente para evitar quedas e mortes, o número é alto o bastante para gerar uma grande sobra de madeira. E qual o destino desse material? De acordo com a Lei 14.723/2008, proposta por Gilberto Natalini e que criou o Programa de Aproveitamento de Madeira de Podas de Árvores (Pampa), os restos de podas, remoções e quedas deveriam ser aproveitados como lenha para fornos, adubo ou matéria-prima para utensílios domésticos.

“O objetivo era impedir que esse material fosse jogado fora em aterros sanitários, onde ocupa um espaço enorme e ainda vira gases do efeito estufa quando se decompõe”, afirma o vereador. “Infelizmente, essa lei praticamente não está sendo cumprida e a Prefeitura leva tudo para os aterros.” Neste ano, Natalini entrou com uma representação no Ministério Público para obrigar o Executivo a aplicar o Pampa. Antonio Storel, coordenador de Resíduos Sólidos Orgânicos da Autoridade Municipal de Limpeza Urbana (Amlurb), disse à Apartes que a aplicação do programa precisa superar “vários obstáculos técnicos”. Segundo ele, para ser processado, cada volume de poda precisa receber ao menos um terço do volume de outros resíduos ricos em nitrogênio. Para isso, a Amlurb estuda misturar os restos da poda com resíduos da coleta seletiva de feiras livres.

Outra norma proposta por Natalini, que, segundo ele mesmo, ainda não “pegou” é a Lei 13.319/2002, que reserva áreas verdes nos estacionamentos. Pela legislação, todo estacionamento com 100 m² ou mais de área deve reservar um espaço para o plantio de árvores, na proporção de uma para cada 40 m². “Se fosse cumprida, essa lei aumentaria de 300 mil a 400 mil o número de árvores na cidade”, conta.

Os danos materiais provocados pelas quedas de árvores são tema do PL 165/2012, de Aurélio Nomura, que propõe facilitar a indenização das vítimas pela Prefeitura. Se o projeto virar lei, quem sofrer prejuízo provocado por esse tipo de acidente poderá protocolar um requerimento em uma comissão que funcionará na Procuradoria Geral do Município, com apresentação de provas, e pedir ressarcimento. A comissão terá até um mês para responder ao cidadão. Uma vez aprovado o pedido, o pagamento será feito no primeiro semestre do ano seguinte. Segundo Nomura, o objetivo é acelerar o processo de indenizações. “De um jeito ou de outro, o Executivo terá que indenizar o cidadão, já que a Prefeitura é responsável pelas quedas. Então, é melhor fazer de forma rápida”, diz.

A inspiração para o projeto veio de um episódio envolvendo o prefeito Jânio Quadros, dois poemas e uma árvore. A árvore em questão caiu sobre o automóvel Del-Rey do médico Marcelo Toledo, em 1986, no bairro de Perdizes. Toledo teve a ideia de enviar ao prefeito um pedido de indenização em forma de poema. “Não ventava, nem chovia/ era um dia bem normal/ e meu carro, junto à guia/ parado, em lugar legal./ Quem vive da Medicina/ não pode – como direi? -/ se uma árvore cai em cima/ substituir um Del Rey”, dizia um trecho da petição.

Jânio não fez por menos e respondeu ao médico-poeta também em versos. Em despacho publicado no Diário Oficial de 6 de julho de 1987, ele ordenava ao seu secretário de Finanças, Carlos Alberto Manhães Barreto, que fizesse o pagamento: “O vegetal era nosso,/ como a prova a petição;/ devo pagar, e eu posso,/ a pouca indenização./ O remédio, pois, eu acho/ é saldar o prejuízo;/ assim decido e despacho/ ao Manhães que tem juízo”, dizia o despacho poético.

Saiba como plantar

Para incentivar a arborização, a Secretaria do Verde e do Meio Ambiente (SVMA) promove uma campanha permanente para que os moradores de São Paulo plantem uma árvore na calçada ou em sua propriedade. Munida de foto e comprovante de residência, cada pessoa pode retirar até dez mudas, nos endereços abaixo. Na retirada, os técnicos da SVMA orientam o tipo de espécie ideal, conforme as informações sobre o local onde será plantada.

Viveiro Manequinho Lopes – Parque Ibirapuera
Av. Pedro Álvares Cabral, s/nº (Portão 10) – Vila Mariana

Viveiro Arthur Etzel (Carmo) – Parque do Carmo
Av. Afonso de Sampaio e Souza, 951 – Itaquera

Viveiro Harry Blossfeld (Cotia) – Parque Cemucam
Rua Mesopotâmia, s/n (km 25 da Rodovia Raposo Tavares, sentido capital)

Parque  M’Boi Mirim
Estrada do M’Boi Mirim, 7.100 – Jardim Ângela

Parque Previdência
R. Pedro Peccinini, 88 – Jd. Ademar

Parque Ecológico Chico Mendes
Rua Cembira, 1201 – Vila Curuçá Velho

Parque do Trote
Rua Nadir Dias Figueiredo, s/n – Portaria 1

A Câmara e as árvores

Conheça outras leis e projetos sobre arborização criados pelos vereadores

LEIS

14.902/2009, de Roberto Tripoli (PV) Prevê punição para os danos em árvores provocados pela colocação de adereços, enfeites, placas e similares.
14.676/2008, de Toninho Paiva (PR) – Cria calendário anual para o plantio de árvores nas vias e logradouros públicos.
14.186/2006, de Paulo Frange (PTB) – Cria o Programa Municipal de Arborização Urbana.

PROJETOS

PL 29/2014, de Toninho Paiva (PR) – Estabelece a remoção de árvores nas vias públicas que, por causa de doença ou outros motivos, possam ameaçar pessoas e o patrimônio público e privado.
PL 885/2013, de Gilberto Natalini (PV) Prevê penalidades para infrações cometidas contra árvores.
PL 790/2013, de Gilberto Natalini (PV) Cria regras para o plantio de mudas para compensação ambiental.

PAIXÃO — Imagens e esculturas de árvores se espalham pelo escritório de Ricardo

Gute Garbelotto/CMSP

ENTREVISTA

Ricardo Cardim, ambientalista

Poucas pessoas conhecem as árvores da capital como o ambientalista Ricardo Cardim. Conhecido como “Dr. Árvore”, ele é mestre em botânica pela Universidade de São Paulo (USP) e criador do site Árvores de São Paulo. Na sua busca pelas espécies que cobriam a cidade antes da chegada dos bandeirantes, descobriu, entre 2010 e 2012, áreas nativas de cerrado, uma vegetação até então considerada extinta por aqui. A descoberta levou à criação de três reservas ecológicas, com uma área de 33.090 m², e rendeu a Ricardo uma Medalha Anchieta e o Diploma de Gratidão da Cidade de São Paulo, concedidos, em 2010, pelo então vereador José Luís Penna.

Por que cai tanta árvore em São Paulo?

Ricardo Cardim – Não é natural. Nas cidades bem arborizadas do mundo, como Paris, não acontece esse festival de quedas na época das chuvas. Todas as cidades têm tempestades de maior ou menor grau. O que acontece é que São Paulo tem um descaso histórico com suas árvores. A arborização ainda é encarada pelo Poder Executivo como uma coisa supérflua. É um desafio achar uma rua em São Paulo em que não existam árvores doentes, sufocadas pelo cimento ou com espécies inadequadas. Aí, logicamente, ocorre um festival de quedas todo ano por causa desse descaso histórico. É preciso entender que o que torna viável a vida humana num ambiente artificial, como é a cidade, são as áreas verdes.

Por que é tão necessário ter árvores na cidade?

Vou começar com a questão da água. A vegetação urbana tem dois papéis fundamentais nessa questão. Quando chove, retém a água (uma árvore detém até 70% da chuva na copa) e encaminha lentamente para uma área permeável logo abaixo do tronco, se existir essa área. Essa água vai para o lençol freático, que alimenta nossos reservatórios e consequentemente nossas torneiras. A planta também tem a capacidade, pela fotossíntese, de liberar vapor de água no ar. Ela tira água do fundo da terra (quanto maior a árvore, mais fundo ela tira) e leva essa umidade para a atmosfera, o que vai propiciar a chuva. Quanto mais umidade no ar, mais favorável para a precipitação acontecer. Basta lembrar que São Paulo era a terra da garoa até os anos 60, 70. Deixou de ser porque perdeu o cinturão verde e as áreas de brejo, que viraram as marginais e as avenidas Aricanduva, Água Espraiada. É importante ter em mente que a vegetação é fábrica de água.

CALÇADA TOMADA — Figueira, espécie inadequada para calçadas, na Vila Mariana

Fausto Salvadori Filho/CMSP

O calor e a falta de água atuais são consequência da falta de árvores?

Exatamente. Hoje o clima da cidade se comporta como um deserto. A gente tem chuvas muito fortes, muito rápidas, que causam inundações. É fundamental ter mais vegetação para diminuir as temperaturas. É uma questão também social, porque as áreas que têm menos verde são justamente as mais pobres. As pessoas que moram ali vão ter menos saúde. O verde reduz a temperatura, aumenta a umidade do ar, segura a água das enchentes, diminui a poluição sonora, recicla os gases tóxicos do ar, fabrica oxigênio e serve de abrigo para a fauna da cidade que combate as pragas urbanas, como baratas e cupins. E cria conforto psicológico. Se o verde não fosse uma questão importante, as propagandas das construtoras não teriam crianças brincando no meio de bosques.

Por que falta espaço para novas áreas verdes?

A cidade cresceu de uma forma que privilegiou sempre a especulação imobiliária e o transporte automotor individual. Sobrou muito pouco para o verde. O que a gente precisa para tornar a cidade equilibrada de novo vai ser alcançado vegetando áreas construídas, como telhados e paredes verdes.

Como foi o processo de arborização em São Paulo?

São Paulo historicamente era um local de biodiversidade extraordinária. Tinha uma vegetação muito rica, com cerrado, mata atlântica, araucária, várzeas. Também era muito rico em rios. Tinha mais de 300, com água límpida, corrente. Era um local abundante em tudo. O europeu veio para cá, destruiu a vegetação nativa e colocou espécies estrangeiras. Havia preconceito contra tudo que era nosso, porque era considerado mato. A árvore mais comum da cidade, a tipuana, é boliviana. Nos jardins brasileiros hoje, sem exceção, quase 90% da vegetação vêm de Madagascar, da Europa, da Ásia, de pessoas que escolheram lá fora o que a gente deve usar aqui dentro.

Qual é a consequência dessa importação?

A gente extinguiu praticamente toda a nossa flora e fauna originais, que levaram milhões de anos para existir. Viramos uma cidade totalmente desconectada da nossa cultura e das nossas raízes naturais. Isso, além de causar um extermínio em massa de bichos e plantas que a gente sequer chegou a conhecer, provocou profundos desequilíbrios ecológicos. Os cupins, que causam prejuízos de milhões por ano para a cidade, vieram da Ásia. Não se tem como combater isso naturalmente, porque desequilibrou toda a fauna. Somos responsáveis pela morte de milhares de espécies que existiam na cidade.

As quedas frequentes das árvores também têm relação com o fato de não serem daqui?

Com certeza. A espécie nativa, que evoluiu durante milhares de anos no território paulistano, sabe crescer na época da chuva e parar na hora da seca. A planta exótica, não. Ela cresce na hora errada. As nossas plantas estão acostumadas há milênios com as pragas locais. As estrangeiras acabam infestadas e caem mais fácil.

Muitos moradores dizem que a Prefeitura não dá conta de atender aos pedidos de poda.

Isso é uma faca de dois gumes. São Paulo perde grande parte da sua floresta urbana por ano por causa de podas desnecessárias causadas pela falta de enterramento da fiação elétrica. Quando se corta um galho, abre caminho para o cupim e o fungo, e daqui a três anos essa árvore adoece e cai. A culpa é da concessionária que fez a poda equivocada. Somando tudo, é como se a gente cortasse uma floresta enorme todo ano. Cabe ao poder público cobrar das concessionárias o enterramento dos fios.

Saiba mais

Site
Árvores de São Paulo. http://arvoresdesaopaulo.wordpress.com

Livro
Manual Técnico de Arborização Urbana. Secretaria do Verde e do Meio Ambiente. 2015. Disponível no site da Prefeitura de São Paulo.

Comente sobre essa matéria:

Facebook Twitter

Envie críticas ou sugestões:

Email: apartes@saopaulo.sp.leg.br