Nº13 – Crise hídrica

Para não secar as fontes

Com leis, debates e investigações, Câmara participa da luta para solucionar problema da falta de água

Rodrigo Garcia | rodrigogarcia@saopaulo.sp.leg.br

Foto do sistema Cantareira de abastecimento de água

AMEAÇA — Reserva atual do sistema Cantareira é inferior à do mesmo
período do ano passado e risco de racionamento continua

Comunicação Sabesp

Apesar do grande volume de chuvas em março, o risco de um racionamento de água não está descartado na cidade de São Paulo. Com isso, ganham ainda mais importância as campanhas para se evitar o desperdício, e a Câmara Municipal de São Paulo (CMSP) também tem participado desse esforço. Além de aprovar projetos que tratam da economia de água, os vereadores têm organizado encontros para analisar a questão e uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) investiga o contrato da Prefeitura com a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp).

CONSCIÊNCIA — Claudinho de Souza criou o Dia de Mobilização pela Despoluição das Águas do Rio Tietê

Marcelo Ximenez/CMSP

Em março, após muitos debates, os vereadores aprovaram um substitutivo ao Projeto de Lei (PL) 529/2014, que estabelece advertência inicial para quem for flagrado lavando calçadas com água tratada. O desperdício poderá ser punido com multa de R$ 250, mas apenas em caso de reincidência. Na terceira vez em que isso ocorrer, o valor cobrado passa para R$ 500.

A CMSP ainda aprovou uma emenda ao PL 529, proposta pelo líder de governo, Arselino Tatto (PT), que prevê a implantação de sistemas de capacitação, armazenamento e utilização de águas pluviais em equipamentos públicos, por parte da Sabesp. A emenda e o projeto de lei, assinado por Ari Friendebach (PROS), José Police Neto (PSD), Laércio Benko (PHS), Mário Covas Neto (PSDB), Nabil Bonduki (PT), Nelo Rodolfo (PMDB), Paulo Frange (PTB) e pelo ex-vereador Roberto Tripoli, seguiram para sanção do prefeito Fernando Haddad (PT).

Os parlamentares também aprovaram, em 18 de março, o substitutivo do PL 870/2013, apresentado por 44 vereadores, que prevê o reuso de água para lavagem de ruas, calçadas, praças públicas, monumentos, pátios, estacionamentos, caminhões, piscinões e outras áreas em que não há necessidade do uso do recurso potável.

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INCENTIVO — Adilson Amadeu propôs criar programa de IPTU Verde, mas o prefeito vetou

Gute Garbelotto/CMSP

O projeto fixa também o prazo de três anos para que lava-rápidos e postos de combustível providenciem estrutura para armazenar água de chuva para lavagem de veículos.

O texto do substitutivo foi elaborado a partir de vários projetos que estavam sendo analisados na Casa. A sistematização das propostas foi feita pelo vereador Natalini (PV). Para ser tornar lei o projeto tem de ser sancionado pelo Executivo.

No mesmo pacote de iniciativas aprovadas e que aguardam sanção do prefeito está o PL 39/2011, de Adilson Amadeu (PTB), que institui o IPTU Verde, com incentivos e descontos no imposto para imóveis que adotarem medidas de economia de recursos. Mas o prefeito vetou o projeto, que voltou para a Câmara. Além dos PLs acima, os parlamentares aprovaram em primeira discussão outras propostas para proteger e economizar água. (ver quadro).

DEBATES

Com a finalidade de averiguar os contratos entre a Sabesp e a Prefeitura e a falta de água em vários bairros da cidade, foi instalada na Câmara Municipal uma CPI. A Comissão tem ouvido depoimentos de representantes de diversos setores e feito diligências para apurar as consequências da crise hídrica para a população. Ao mesmo tempo, o Palácio Anchieta, sede da CMSP, tem sido palco de eventos para discutir os desdobramentos dessa crise.

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REAPROVEITAMENTO — Águas da chuva devem ser armazenadas e utilizadas nos prédios públicos, defende Arselino Tatto

Gute Garbelotto/CMSP

Por iniciativa da Frente Parlamentar pela Sustentabilidade, juntamente com outras entidades, foi realizada a Virada da Água – Caminhos para a Abundância. O evento contou com exposições sobre a importância de soluções criativas para o meio ambiente, além de demonstrações de cisternas e formas de filtragem da água.

A Escola do Parlamento da CMSP também participou da campanha. Junto com a Procuradoria-Geral do Município e outros órgãos, realizou a sétima edição do Fórum da Cidade, cujo tema este ano foi Quem Cuida da Cidade? – Cidadania e Recursos Hídricos. Durante os debates, ocorridos na Câmara, especialistas em direito e meio ambiente discutiram como a água pode ser utilizada de uma forma mais consciente.

A CMSP ainda recebeu autoridades internacionais sobre o assunto, que expuseram as soluções encontradas em suas cidades. Uma delas foi a arquiteta norte-americana Mia Lehrer, que mostrou como os programas de reuso da água e de tratamento de esgoto têm ajudado Los Angeles a combater a falta de água sem prejudicar a população. “Criamos o Programa Uma Água, indicando que a água, potável ou não, é uma só. Então a água não potável pode se transformar em potável”, explicou Mia no debate Cidades Sustentáveis e Crise Hídrica, organizado pelo vereador José Police Neto (PSD).

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MODELO — Programa de Conservação e Uso Racional da Água foi copiado por outros municípios, conta Nomura

Mozart Gomes/CMSP

Por sua vez, o urbanista Carlos Leite falou, no mesmo evento, sobre seu projeto para revitalizar o Rio Piracicaba e como São Paulo poderia seguir o exemplo de Piracicaba, no interior paulista. Segundo ele, o problema da capital não é a falta de água, mas sim a forma como o Município foi se desenvolvendo, sem respeitar o curso dos rios e sem proteger os mananciais.

Já um encontro da série Segundas Paulistanas procurou responder a questão “o que precisamos aprender com a crise hídrica?”. O objetivo do evento, organizado pelo vereador Ricardo Young (PPS), foi discutir com pesquisadores, ativistas ambientais e a sociedade novos hábitos para que a escassez de água seja superada.

PROBLEMA HISTÓRICO

Não é de hoje que a Câmara preocupa-se com o futuro da água. Há 10 anos, os vereadores aprovaram a Lei 14.018/2005, que instituiu o Programa Municipal de Conservação e Uso Racional da Água e Reuso em Edificações. A norma incentiva ações simples, que podem ser tomadas mesmo em casa, como pôr restritores de vazão em chuveiros, arejadores nas torneiras, trocar as descargas contínuas por vasos sanitários com caixas acopladas de seis litros e colocar hidrômetros individualizados nos condomínios, além de priorizar a captação e o reuso de água. O autor da proposta, vereador Aurélio Nomura (PSDB), disse que a lei fez tanto sucesso que foi copiada por outros municípios do Brasil.

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RESERVATÓRIO — Minicisterna para guardar água das chuvas é uma das opções analisadas pela Frente Parlamentar pela Sustentabilidade

Luiz França/CMSP

Nomura já havia apresentado um PL que em 1996 virou a Lei 11.998, determinando que em 21 de março seja comemorado o Dia Municipal da Água. “É preciso chamar a atenção para que haja ações de fato, a fim de que esse bem finito possa ser preservado para as próximas gerações”, afirma o parlamentar na justificativa do projeto.

Além de leis, investigações e debates, a Câmara tomou medidas práticas para economizar água. As torneiras dos banheiros do Palácio Anchieta passaram por manutenção e tiveram a vazão da água reduzida. A lavagem das escadas e corredores passou a ser feita com pano úmido.

Os esforços estão sendo reconhecidos. Segundo uma pesquisa da revista sãopaulo, publicada pelo jornal Folha de S.Paulo, as torneiras da Câmara possuem uma vazão ideal de água. A reportagem testou os equipamentos de 17 locais públicos da cidade e utilizou critérios da Sabesp para avaliar se o fluxo era excessivo (acima de 100 ml/segundo), ideal (entre 40 e 100 ml/segundo) ou desconfortável (menor que 40 ml/segundo). No Palácio Anchieta, a vazão apurada pela revista foi de 50 ml/segundo.

 

Projetos aprovados em 1ª votação

*Situação dos projetos até no dia 30 de março

PL

VEREADOR

PROPOSTA

185/2011

Eliseu Gabriel (PSB)

Proíbe descarte de óleo no esgoto.

267/2014

Conte Lopes (PTB)

Obriga o uso de instalações sanitárias mais econômicas.

381/2014

Noemi Nonato (PROS)

Determina que prédios tenham reserva de água de reuso.

362/2011

Sandra Tadeu (Democratas)

Determina que condomínios tenham reservatórios para captação de água pluvial.

50/2008

Aurélio Miguel (PR)

Cria o Programa Municipal de Combate ao Aquecimento Global e às Mudanças Climáticas.

 

Um rio desperdiçado

Muita gente passa pela Marginal do Tietê, umas das principais vias de São Paulo, vê tanta água e se indaga como uma cidade cortada por um rio tão grande pode estar enfrentando uma crise hídrica.  “Por que não se usa essa água?”, pergunta-se. A resposta é simples: porque está poluída. Já esteve pior, mas ainda está suja, muito suja. Despoluir o Tietê, um rio de grande importância histórica e simbólica, é fundamental para que suas águas sejam mais utilizadas.

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TIETÊ — Rio já chega a São Paulo poluído
por causa do esgoto das outras cidades

Comunicação Sabesp

Essa é uma luta que os paulistanos abraçam. A Lei 14.075/2005 tornou 12 de outubro o Dia de Mobilização pela Despoluição das Águas do Rio Tietê. Nessa data, devem ser realizados eventos que incentivem a tomada de consciência sobre a importância de despoluir o rio e seus afluentes, afirma o vereador Claudinho de Souza (PSDB), autor da proposta. Ele explica que escolheu esse dia porque desde 2004 uma procissão fluvial é realizada na altura da Ponte do Piqueri, zona oeste de São Paulo, para celebrar o Dia de Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil, e também para denunciar as más condições do rio. “Essa data é para provocar a sociedade a prestar atenção nos descuidos que estamos tendo com o Tietê”, completa Souza.

DESPOLUIÇÃO

Desde a década de 1990, a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) vem realizando ações para despoluir o Tietê, como a ampliação do tratamento de esgotos. Segundo a empresa, a mancha de poluição do rio já diminuiu 70%. “A Sabesp está realizando a sua parte, implantando a infraestrutura necessária para tratamento de esgoto”, afirmou a empresa em nota oficial à Apartes. Ela ressaltou que só pode atuar nas áreas que estão urbanizadas, ou seja, nas áreas regulares.

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ESFORÇO — Ações contra a poluição do Tietê
têm dado resultados, mas ainda são insuficientes

Comunicação Sabesp

Segundo especialistas em recursos hídricos, as ações da Sabesp têm obtido resultados positivos, contudo ainda insuficientes. “Há avanços, mas são lentos”, lamenta a geógrafa Stela Goldenstein, diretora-executiva da ONG Águas Claras do Rio Pinheiros. “Nesse ritmo, nossos filhos talvez possam tomar banho no Tietê quando forem bem velhinhos”, brinca.

A geógrafa explica que a poluição do trecho paulistano do Tietê é basicamente de três tipos: das indústrias, dos esgotos não tratados e a difusa (na maioria das vezes, lixo jogado na rua). A industrial caiu bastante, principalmente por causa do aumento da fiscalização da Companhia Estadual de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb) e da saída de muitas fábricas da região metropolitana, segundo Stela.

Hoje, o principal problema é a falta de saneamento. Nesse aspecto, São Paulo é vítima de outros municípios, que têm poucas casas ligadas à rede de saneamento. “O Tietê já entra poluído em nossa cidade”, lamenta a geógrafa. Segundo ela, uma forma de diminuir esse tipo de poluição é que todas as casas sejam ligadas à rede de esgoto e que este seja tratado antes de chegar ao Tietê. Quanto à poluição difusa, a Sabesp e a geógrafa concordam que a população pode fazer muito para diminuí-la, principalmente não jogando lixo nas ruas.

 

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