Texto: Rodrigo Garcia | rodrigogarcia@saopaulo.sp.leg.br
Edição: Sândor Vasconcelos | sandor@saopaulo.sp.leg.br
A trajetória de Herculano de Freitas teve abrangência nacional. Comerciário no Rio Grande do Sul, governador no Paraná, vereador em São Paulo e ministro do Supremo Tribunal Federal no Rio de Janeiro, então capital do País. Também estudou em Pernambuco e trabalhou em Santa Catarina. “Os pulmões de Herculano de Freitas respiraram os ares da Pátria, as pancadas de seu coração bateram sempre em uníssono com as pancadas do coração nacional”, afirmou o vereador paulistano Ulysses Coutinho, em 1928.
Batizado com a versão brasileira de Wladislaw, um nome eslavo, Uladislau Herculano de Freitas Guimarães nasceu em Arroio Grande (RS), em 25 de novembro de 1865. Ainda jovem, seu pai, Rogério José de Freitas Guimarães, morreu e os três filhos foram trabalhar no comércio de Pelotas (RS) para ajudar a mãe, Joaquina Caetana de Freitas Guimarães. Aos 18 anos, entrou na Escola Militar de Porto Alegre. Mas teve de abandonar a carreira militar por causa de um problema nos olhos, que o acompanharia por toda a vida.
Depois de se mudar para São Paulo, começou o curso de Ciências Jurídicas e Sociais na Faculdade de Direito do Largo São Francisco (USP). Na faculdade e na imprensa, Herculano de Freitas começou a se destacar por sua oratória, usada em defesa das ideias republicanas. Era uma “figura simpática e elegante (no estilo dos estadistas ingleses), de voz clara e bem timbrada”, recordou-se o jornalista João Sampaio em uma série de artigos, publicada no jornal O Estado de S. Paulo em novembro de 1965.
Ainda jovem estudante, casou-se com Clotilde Glicério, filha de um destacado político da região de Campinas (SP), o general Francisco Glicério, que depois iria se tornar ministro da Agricultura, o primeiro da República. O apoio do sogro ajudou Herculano de Freitas a conquistar muitos cargos.
INÍCIO DA VIDA PÚBLICA
No começo da vida pública, foi nomeado chefe da Polícia do Paraná. Depois foi escolhido para ser vice-governador (que na época se chamava vice-presidente) paranaense. Com a renúncia do governador José Marques Guimarães, ele assumiu a chefia do Executivo em 18 de fevereiro de 1890 e governou até 4 março de 1890.
Nesse ano, voltou à capital paulista e foi nomeado professor da Faculdade de Direito de São Paulo, a mesma em que havia estudado. “Suas aulas de direito constitucional não eram simples dissertações doutrinárias, eram exposições claras e eloquentes da constituição aplicada, da constituição em vida, em ação, em movimento”, descreveu Vicente Rao, ex-ministro da Justiça e das Relações Exteriores, no jornal O Estado de S. Paulo. Em 1915, Freitas se tornou diretor da instituição.
Em 1891, assumiu seu primeiro cargo no Poder Legislativo: intendente (vereador) de São Paulo. Eram tempos difíceis para a Câmara Municipal. Em 15 de janeiro de 1890, um decreto do governador Prudente de Morais determinou que a instituição passaria a ser chamada de Conselho de Intendência e que seus membros não seriam mais eleitos pelo povo. Passariam a ser nomeados pelo governador. O decreto 13/1890 determinava: “os Conselhos de Intendência compor-se-ão de 3 a 9 membros, conforme a importância dos municípios, e deliberarão sobre todos os assuntos da competência das Câmaras Municipais”.
O vereador Francisco de Pennaforte Mendes de Almeida protestou contra a decisão do governador, conta o historiador Ubirajara de Farias Prestes Filho no livro Câmara Municipal de São Paulo: panorama histórico. “A substituição das Corporações eleitas para o governo local das cidades por corporações nomeadas pelo governo é uma opressão tão grande, que, desde muitos séculos, foi repelida pelas próprias leis da guerra e, nas maiores revoluções, têm as Câmaras Municipais permanecido incólumes ante a destruição e recomposição de todas as autoridades”, declarou Pennaforte.
Mas os protestos foram em vão. O mandato dos vereadores eleitos, que deveria terminar em 6 de janeiro de 1891, foi encerrado em 13 de janeiro de 1890, quando assumiram os intendentes nomeados. Herculano de Freitas entrou no Conselho de Intendência no ano seguinte, em 2 de janeiro. Mas sua participação no Poder Legislativo paulistano durou menos de um ano. Após muitos protestos, o Conselho encerrou suas atividades em 15 de dezembro de 1892.
NOVAS ESFERAS
Durante a vida pública, Herculano de Freitas também foi deputado estadual, senador estadual (de 1891 a 1930, o Poder Legislativo do Estado era composto por uma Assembleia e um Senado), deputado federal, secretário da Justiça e Segurança Pública do Estado de São Paulo e ministro da Justiça e de Negócios Interiores.
Em 1925, ele atingiu o auge de sua carreira. Foi indicado pelo então presidente da República, Arthur Bernardes, para ser ministro do Supremo Tribunal Federal. Assumiu em 28 de janeiro de 1926. Mas teve pouco tempo para demonstrar seu conhecimento jurídico, pois morreu menos de quatro meses após a posse, em 14 de maio, no Rio de Janeiro, onde foi sepultado. “Sua permanência foi truncada, sem lhe dar tempo de inscrever-se os notáveis – como era de prever-se – entre os seus pares”, lamentou o jornalista João Sampaio na série de artigos do Estadão.
Segundo a Secretaria de Documentação da Câmara paulistana, só mais dois ex-vereadores chegaram ao STF: Américo Brasiliense de Almeida Mello e João Mendes de Almeida Junior. Ambos foram vereadores de 1881 a 1883. Durante o Império, quando a mais alta Corte do País era o Supremo Tribunal de Justiça, outros dois ministros passaram antes pelo Parlamento paulistano: Ernesto Ferreira França e João Gomes de Campos.
Dois anos após a morte de Uladislau, sua esposa, Clotilde, doou os 5 mil livros do político à Biblioteca da CMSP. Ao agradecer a doação, em sessão de 23 de maio de 1928, o então presidente da Casa, Luiz Fonceca, declarou que Freitas “foi um homem cultíssimo, cheio de curiosidades intelectuais de largo saber, não apenas nas matérias em que se especializou, mas também em vários departamentos da ciência e até nas belas artes”.
Além de apaixonado por Direito e política, Herculano de Freitas também adorava cavalos de corrida. Foi proprietário do Haras Itupu, na zona sul de São Paulo, presidente do Jockey Club de São Paulo (1920-1921) e tem uma corrida com seu nome: Clássico Presidente Herculano de Freitas. No local onde ficava o haras, também há um bairro e um parque batizados com o nome do político: Jardim Herculano. E na Bela Vista, região central da cidade, mais uma homenagem: a Rua Herculano de Freitas.
SAIBA MAIS
Livro
PRESTES FILHO, Ubirajara de Farias. Câmara Municipal de São Paulo: panorama histórico. Imprensa Oficial. 2016.
Sites
Supremo Tribunal Federal. www.stf.jus.br
Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil – Fundação Getulio Vargas. cpdoc.fgv.br