Doações de órgãos caem durante a pandemia
Luiz Augusto Carneiro D’Albuquerque revela que, apesar da queda no número de transplantes, a recusa familiar na hora da doação diminuiu, tornando possível a continuidade do serviço
De acordo com levantamento da Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos, o número de doadores caiu 6,5% no Brasil no primeiro semestre de 2020 em relação ao ano passado. O professor Luiz Augusto Carneiro D’Albuquerque, da Faculdade de Medicina (FM) e diretor do Serviço de Transplantes de Órgãos do Aparelho Digestivo do Hospital das Clínicas (HC) da USP, conversou com o Jornal da USP no Ar sobre esse assunto.
Segundo ele, a pandemia de coronavírus teve um efeito muito ruim nas taxas de doação pelo País, mas com algumas diferenças regionais. “No Norte, Nordeste e Sul, tivemos um grande impacto da covid-19 e uma diminuição de até 40% das doações. Porém, na região Sudeste, principalmente em São Paulo e Rio de Janeiro, o número de doações se manteve estável em relação ao ano passado e até aumentou um pouquinho, para nossa surpresa”, diz o médico. “Entretanto, no geral, tivemos uma grande redução do número de transplantes. Considerando que nós deveríamos aumentar o número de doações em quase 15% e acabamos tendo uma diminuição da mesma proporção, isso é bem negativo.”
Dados de junho deste ano indicavam que mais de 40 mil pacientes estavam na lista de espera de doação de órgãos. Cada tipo de transplante possui diferentes características, sendo que alguns deles podem ser postergados, caso o clima não seja favorável, como no caso da pandemia. Por outro lado, para outras pessoas necessitadas, o risco de não fazer o transplante é o preço da vida. Por isso, D’Albuquerque comenta que as atividades de transplante feitas no HC foram transferidas para um hospital covid-free, o Instituto do Coração (InCor), tornando possível a continuidade dos programas. Nessas condições, já foram realizados 44 transplantes de fígado, ao passo que no ano passado foram feitos 38.
O professor também ressalta que pessoas diagnosticadas com covid-19 não podem ser submetidas às operações de transplante, por conta da série de infecções causadas pela doença no organismo. “Nesse sentido, a Secretaria da Saúde e a Central de Transplantes do Estado de São Paulo adotaram medidas pioneiras e elogiáveis, fornecendo testes RT-PCR para os doadores desde março. Além disso, nós realizamos tomografias do pulmão, afastando qualquer dúvida sobre o diagnóstico do paciente, contribuindo para uma atuação muito segura”, conta o diretor.
Um dado positivo é que a recusa das famílias para a doação caiu significativamente, para cerca de 20%, de acordo com D’Albuquerque. Esse dado é considerado como uma contrapartida em relação à queda do número de doadores, balanceando seus efeitos. “A doação é um ato de solidariedade e, nesta situação de covid-19, esse sentimento veio muito à tona. Isso só reforça a importância da doação, de deixarmos nossa vontade explícita a nossos familiares. Uma recusa de doação pode significar a perda de até 14 vidas nessa cadeia de benefícios”, comenta ele. Apesar da pandemia, o médico acredita que, com a continuidade dos serviços de transplante, foi possível obter esse resultado positivo.
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