Guardiã Maria da Penha: acolhimento e escuta que amparam vítimas da violência doméstica

Por Mariane Mansuido | 15/11/2020

Foi em 2014 que surgiu o primeiro esboço do programa Guardiã Maria da Penha da GCM (Guarda Civil Metropolitana) de São Paulo. Ainda tímido, o projeto – que foi criado por decreto da Prefeitura – começou com somente duas viaturas e 12 guardas fixos. O propósito era desafiador: fiscalizar o cumprimento de medidas protetivas, acompanhando mulheres vítimas de violência doméstica na região central da capital paulista. E deu certo.

Seis anos depois, a operacionalização do programa cresceu para nove viaturas com 48 guardas fixos, que hoje atendem as cinco regiões da cidade. À frente desse trabalho, está a comandante-geral da GCM de São Paulo, Elza Paulina de Souza, que também é a primeira mulher a comandar a corporação.

Atendimento humanizado

“A escuta ativa e o acolhimento humanizado é o que faz a diferença no nosso trabalho”. É assim que a comandante Elza Paulina explica o êxito das ações do Guardiã Maria da Penha, que atende hoje 695 mulheres – um número que se atualiza diariamente com novas inserções ou desligamentos. Ao todo, já foram atendidas 3.325 mulheres pelo programa. 

Mesmo durante o isolamento social por conta do coronavírus, que impossibilitou muitas vítimas de procurar ajuda e acentuou a violência doméstica, o programa conseguiu aumentar as visitas às participantes, que são realizadas semanal ou quinzenal dependendo do caso. De janeiro a outubro deste ano, foram realizadas 17 mil visitas, um aumento de cerca de  30% em relação ao mesmo período de 2019, quando foram registradas 13 mil. 

Equipes fixas e capacitação constante dos guardas também justificam esses números, segundo Elza Paulina. “A gente precisa treinar o nosso ouvido, precisa acolher essa mulher. E é acolher sem julgamento”, enfatizou a comandante, que aposta no treinamento dos agentes para prestar um serviço de qualidade. “Se a mulher não se sentir fortalecida no acolhimento, ela dificilmente vai ser capaz de romper o ciclo de violência. E isso também depende de nós”, declarou. 

Porta de entrada

É por meio do MPSP (Ministério Público de São Paulo), em especial, o GEVID (Grupo de Atuação Especial de Enfrentamento à Violência Doméstica), que o programa Guardiã Maria da Penha faz contato com as mulheres que conseguiram a medida protetiva na Justiça.

Ao receber as informações dos promotores, os GCMs fazem a pré-seleção de casos, entram em contato com as vítimas realizando uma visita na residência para uma conversa inicial, e só então oferecem a oportunidade de participar do programa, que é voluntário. “Nós entendemos que toda participação deve ser voluntária, pois essa mulher já foi tão violada no seu direito, que a gente não pode violar ainda mais. Ela precisa querer fazer parte”, esclareceu a comandante da GCM.

Só após o aceite é que a mulher passa a integrar o programa que, entre os benefícios principais, oferece a fiscalização da ronda, orientação e encaminhamento para os equipamentos da rede de proteção. As mulheres que participam também têm acesso ao aplicativo Socorro Imediato, que é instalado em seu celular para que possam acionar a GCM em qualquer situação de risco de violação da medida protetiva pelo agressor. Nesses casos, a corporação identifica a viatura mais próxima do endereço e a envia para o local. 

Rede de proteção

O Guardiã Maria da Penha nasceu de uma colaboração entre a Secretaria Municipal de Segurança Urbana, Secretaria Municipal de Políticas para as Mulheres e o MPSP, portanto, não foge à regra das demais políticas públicas: precisa trabalhar em conjunto com os órgãos de proteção e apoio à mulher, como forma de garantir não somente a segurança, mas também a integridade da vida de quem está em situação de vulnerabilidade. 

“Temos a terceira melhor lei do mundo em relação ao combate à violência contra a mulher, que é a Lei Maria da Penha. Entretanto, se nós não fizermos cada qual o seu papel, a lei fica inócua”, afirmou Elza Paulina, destacando que a GCM possui uma forte parceria com as demais instituições. “Precisa ter acolhimento, precisa da assistente social, da psicóloga, da assessoria jurídica, médica, dos abrigos”, pontuou.

Ainda que a maioria dos beneficiados do Guardiã Maria da Penha sejam mulheres, também podem ser acolhidas outras vítimas de violência doméstica, como crianças e idosos. Para a comandante da CGM, além de oferecer mais segurança, o programa e toda a rede que o envolve contribui para o empoderamento e independência dos atendidos. 

“Ficamos muito felizes quando temos o desmame de uma mulher e que ela se sente empoderada no sentido de conseguir tocar a vida dali pra frente”, declarou a comandante, explicando que as mulheres podem recorrer ao serviço mesmo após o desligamento. “É importante que essa mulher saiba que, com este apoio, ela pode dar prosseguimento ao que ela escolher, ou seja, longe de uma vida violenta, longe de um violador”. 

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