Parecer nº 248/2011
Memorando Procuradoria nº 245/2011
Estudo acerca da posição atual dos Tribunais de Segunda Instância e Superiores sobre a possibilidade de exoneração de servidoras ocupantes de cargo de livre provimento em comissão durante o período gestacional e pós-gestacional
Senhor Procurador Supervisor,
Trata-se de expediente em que se requer estudo e parecer para fim de orientação da Alta Administração desta Casa quanto à manutenção ou não da atual sistemática que possibilita a exoneração de servidoras em exercício de cargo de livre provimento durante o período de gestação e pós-gestacional, tendo em vista as manifestações do Setor Judicial desta Procuradoria a propósito de decisão judicial que reconheceu a ex-servidora, ocupante de cargo de livre provimento em comissão, o direito à estabilidade gestacional, condenando a Municipalidade ao pagamento de indenização.
Analisando-se a legislação pertinente à matéria, verificamos estar a licença-maternidade contemplada na Constituição Federal, artigos 7º, XVIII, e 39, §3º, e no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal, artigo 10, inciso, II, alínea b, conforme se verifica a seguir:
Constituição Federal:
“Art 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
(…)
XVIII – licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias;
(…)”
“Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão conselho de política de administração e remuneração de pessoal, integrado por servidores designados pelos respectivos Poderes.
(…)
§3º Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir. (negritamos)
(…)”
Ato das Disposições Constitucionais Transitórias:
“Art. 10. Até que seja promulgada a lei complementar a que se refere o art. 7º, I, da Constituição:
(…)
II – fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa:
(…)
b) da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.”
Da leitura dos artigos, percebe-se ter a Constituição Federal conferido às servidoras públicas o direito à estabilidade provisória e à percepção de licença-maternidade.
A grande questão cinge-se àquelas servidoras ocupantes de cargo de livre provimento em comissão, ou seja, àquelas servidoras nomeadas para exercer cargos em que a confiança entre nomeante e nomeado é inerente e em que a exoneração se dá ad nutum.
Em posicionamento anterior, verificado através dos pareceres nº 30/07 e 012/00, proferidos por esta Procuradoria, entendeu-se, à época, não se aplicarem a tais servidoras a estabilidade de que trata o art. 10, item II, alínea b, do ADCT da Constituição Federal. Isto porque se entendeu que a possibilidade de exoneração a qualquer tempo dos servidores exercentes de cargo exclusivamente em comissão é intrínseca à natureza de tais cargos, cujo principal atributo é justamente a demissibilidade ad nutum do servidor na oportunidade em que se afigurar mais conveniente para o administrador.
Verificou-se, à época, não ter sido a questão devidamente analisada pelos Tribunais, tanto estaduais quanto superiores, não havendo, portanto, pacificação da matéria.
A situação hodierna, contudo, mostra-se diferente. Através de vários julgados colhidos nos sítios de pesquisa de repertório jurisprudencial dos Tribunais e juntados ao presente estudo, verifica-se ter o Supremo Tribunal Federal, que é o Tribunal guardião da Constituição e último a se manifestar em matérias que envolvam questões constitucionais, firmado posição no sentido de se deferir a estabilidade provisória e o benefício da licença-maternidade às servidoras ocupantes de cargo em comissão, conforme se verifica a seguir:
“RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. SERVIDORA PÚBLICA. CARGO EM COMISSÃO. LICENÇA-MATERNIDADE E ESTABILIDADE PROVISÓRIA. PRECEDENTES. JULGADO RECORRIDO DIVERGENTE DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RECURSO PROVIDO.
(…)
3. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem se firmado no sentido de que as servidoras públicas, inclusive as contratadas a título precário, independentemente do regime jurídico de trabalho, têm direito à licença-maternidade de cento e vinte dias e à estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, conforme o art. 7º inc. XVIII, da Constituição da República e o art. 10, inc. II, alínea b, do Ato das Disposições Constitucionais Provisórias, e que a demissão de servidora pública no gozo de licença-gestante é ato arbitrário e contrário à Constituição.” (negritamos)
(…)
(RE 509775/SP – São Paulo, Relatora Ministra Carmen Lúcia, DJe-030, DIVULG 18/02/2010, PUBLIC 19/02/2010)
“O entendimento desta Corte firmou-se no sentido de que as servidoras públicas e empregadas gestantes, independentemente do regime jurídico de trabalho, têm direito à licença-maternidade e à estabilidade provisória, conforme o art. 7º, XVIII, da Constituição e o art. 10, II, b, do ADCT.”
(…)
(RE 612294/SE, Relator Ministro Gilmar Mendes, DJe DIVULG 01/06/2011, PUBLIC 02/06/2011)
“A jurisprudência desta Corte tem entendido que as servidoras públicas, inclusive as contratadas a título precário, independentemente do regime jurídico de trabalho, têm direito à licença-maternidade de 120 (cento e vinte) dias e à estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, conforme o artigo 7º, XVIII, da Constituição Federal e o artigo 10, II, b, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.
Entendeu, ainda, que a demissão de servidora pública no gozo de licença-gestante constitui ato arbitrário e contrário à Constituição Federal.”
(…)
(RE 585895/MG, Relator Ministro Gilmar Mendes, DJe DIVULG 16/12/2010 PUBLIC 17/12/2010)
“1.A servidora nomeada para exercer cargo em comissão não pode simplesmente ser exonerada por estar grávida. 2. Ainda que não haja norma expressa para proteger a funcionária, pode-se-lhe aplicar os dispositivos constitucionais relativos ao trabalhador em geral (art. 5º, parágrafo 2º, 7º, inc. II, alínea b, do ADCT). 3. Sentença mantida para que seja paga à apelada uma indenização equivalente ao período consistente ao início da gestação até o quinto mês após o parto.”
(…)
(RE 518592/ES, Relator Ministro Joaquim Barbosa, DJe 06/09/2010 PUBLIC 08/09/2010)
A partir do quanto exposto acima e dos demais julgados juntados ao presente estudo, todos no mesmo sentido, verifica-se que para o Supremo Tribunal Federal a dispensa imotivada de gestante configura ato contrário à moralidade administrativa e à dignidade da pessoa humana, nos termos do art. 10, inciso II, alínea b do ADCT da Constituição Federal, motivo pelo qual vem sendo conferido às gestantes o direito à estabilidade provisória e à licença-maternidade.
O Superior Tribunal de Justiça, através de julgado recente envolvendo a questão, juntado ao presente estudo, manifestou-se de acordo com a jurisprudência dominante no Supremo Tribunal Federal:
“CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDORA PÚBLICA. DISPENSA DE FUNÇÃO COMISSIONADA NO GOZO DE LICENÇA-MATERNIDADE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. PROTEÇÃO À MATERNIDADE. OFENSA. RECURSO PROVIDO.
1. A estabilidade provisória, também denominada período de garantia do emprego, prevista no art. 10, inc. II, letra “b”, do ADCT, visa assegurar à trabalhadora a permanência no seu emprego durante o lapso de tempo correspondente ao início da gestação até os primeiros meses de vida da criança, com o objetivo de impedir o exercício do direito do empregador de rescindir unilateralmente e de forma imotivada o vínculo laboral.
2. O Supremo Tribunal Federal tem aplicado a garantia constitucional à estabilidade provisória da gestante não apenas às celetistas, mas também às militares e servidoras públicas civis.
3. Na hipótese, muito embora não se afaste o caráter precário do exercício de função comissionada, não há dúvida de que a ora recorrente, servidora pública estadual, foi dispensada porque se encontrava no gozo de licença maternidade. Nesse cenário, tem-se que a dispensa deu-se com ofensa ao princípio de proteção à maternidade. Inteligência dos arts. 6º e 7º, inc. XVIII, da Constituição Federal e 10, inc. II, letra “b”, do ADCT.
4. Recurso ordinário provido”
(RMS 22361/RJ, Relator Arnaldo Esteves Lima, Julgamento 08/11/2007, DJ 07/02/2008).
Em outro julgado, entendeu devida a indenização substitutiva à gestante exonerada:
“ADMINISTRATIVO. SERVIDORA PÚBLICA. CARGO EM COMISSÃO. LIVRE NOMEAÇÃO E EXONERAÇÃO. GESTANTE. DIREITO À INDENIZAÇÃO SUBSTITUTIVA. RECURSO ORDINÁRIO PROVIDO.
1.Servidora pública temporária, ocupante de cargo de livre nomeação, exonerada durante a gestação, em contrariedade ao inciso XVIII do art. 7º da CF e alínea b do inciso II do art. 10 do ADCT.
2. É devida a indenização substitutiva correspondente à remuneração desde a dispensa da servidora até cinco meses após o parto.
3. Deve ser afastada a incidência das Súmulas 269 e 271 do STF, quando o Mandado de Segurança é impetrado, na origem, antes da emergência do direito à indenização, que consistia em pedido subsidiário da recorrente, para permanecer no cargo. Precedente do STF: RMS 24.263/DF, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, DJU 09.05.2003.
4. Recurso Ordinário parcialmente provido, apenas para assegurar o direito à percepção da indenização substitutiva.” (RMS 25274/MG, Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJ 17/12/2007).
“RECURSO ORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDORA PÚBLICA DESIGNADA EM CARÁTER PRECÁRIO. EXONERAÇÃO DURANTE A GESTAÇÃO. LICENÇA-MATERNIDADE. ESTABILIDADE PROVISÓRA. ART. 7º, XVII, DA CONSTITUIÇÃO. ART. 10, II, B, DO ADCT. INDENIZAÇÃO SUBSTITUTIVA DA ESTABILIDADE PROVISÓRIA. POSSIBILIDADE. VALORES POSTERIORES À IMPETRAÇÃO. SÚMULAS 269 E 271/STF. PRECEDENTES.
As servidoras públicas, incluídas as contratadas a título precário, independentemente do regime jurídico de trabalho, possuem direito à licença-maternidade e à estabilidade provisória, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, consoante dispõem o art. 7º, XVIII, da Constituição Federal e o art. 10, inciso II alínea b, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, sendo a elas assegurada indenização correspondente às vantagens financeiras pelo período constitucional da estabilidade.”
(…)
(RMS 26069/MG, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 01/06/2011, Data do julgamento 28/04/2011)
Entendeu, contudo, em outro julgado, ser possível a exoneração quando decorrer não da gravidez, mas de outro motivo justificável, conforme se depreende da ementa extraída e demonstrada a seguir:
“RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. CARGO EM COMISSÃO. LIVRE NOMEAÇÃO E EXONERAÇÃO. GESTANTE. REINTEGRAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO ORDINÁRIO DESPROVIDO.
1. Os ocupantes de cargos em comissão não possuem direito a permanência no cargo, podendo ser exonerados a qualquer momento, de acordo com os critérios de conveniência e oportunidade da Administração. Precedentes.
2. Consoante as informações prestadas, a dispensa se deu em razão da aposentadoria do juiz com o qual a impetrante trabalhava como assessora. Portanto, passível de exoneração ad nutum, e não pelo fato fato (sic) de a recorrente estar grávida. É inviável, portanto, anular o ato administrativo que exonerou a impetrante, com um dia de licença-maternidade.” (RMS 25138/MG, Relator Ministro Felix Fischer, DJe 30/06/2008)
O Tribunal de Justiça de São Paulo, em julgados mais antigos, diverge da posição trazida pelo Supremo Tribunal Federal. Na Apel. 263.624.5/5-00, cujo Relator foi Castilho Barbosa, entendeu-se que, em razão da precariedade da natureza do cargo, não faria a servidora jus à reintegração de cargo, conforme se verifica a seguir:
“Apelação Cível – Mandado de Segurança – Anulação de Ato Administrativo e Reintegração de cargo – Denegação da segurança – Exoneração durante o estado de gravidez – Cargo em comissão – Possibilidade – A funcionária Pública nomeada em comissão é demissível ‘ad nutum’ – Art. 7º e seus incisos da Constituição Federal que não se aplica aos funcionários públicos – Recurso improvido”.
Em outro julgado, o Tribunal Paulista entendeu pela possibilidade de exoneração, mas por se tratar de dispensa motivada. Seguem trechos do julgado:
“AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS E DE REINTEGRAÇÃO AO CARGO – Servidora municipal exonerada durante a gravidez – Dispensa que decorreu de previsão constitucional – Art. 169, da CF, pelo fato do Município ter excedido o limite de gastos com pessoal, apurado pelo TCE – Servidora que estava em estágio probatório – Inaplicabilidade da estabilidade provisória – Dispensa motivada – Ação improcedente – Recurso não provido.” (Apel. nº 765.763.5/9-00, Relator Urbano Ruiz, 19/01/2009).
“Mandado de Segurança – Ocupante de cargo de Auxiliar Parlamentar de Assembleia Legislativa, em comissão – Exoneração – Gravidez – Pretendida anulação do ato administrativo que exonerou a impetrante – Cargo em Comissão – Inexistência de direito líquido e certo – Não incidência, no caso, da proteção do artigo 10, II, “b”, do ADCT – Ordem denegada
(…)
…No caso, a impetrante foi nomeada para o cargo em 21.04.06, sua filha Thais nasceu em 06.09.06 (fls. 12) e sua exoneração foi publicada no DOE de 13.09.06, decorrente do falecimento do deputado estadual ocorrido em 09.09.06. Se ela estava lotada no gabinete, como ocupante de cargo de Auxiliar Parlamentar em comissão, e se a transitoriedade era inerente, não poderia ser alcançada pela pretendida estabilidade. Até porque sua exoneração não foi arbitrária nem injusta, mas corolário da morte de quem a nomeara.
A circunstância que cercou a exoneração é relevante, pois o artigo 10, II, “b”, do ADCT dispõe que ‘fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto’. Além de a impetrante, nomeada em 21.04.06 quando já estava grávida, ser ocupante de cargo em comissão, fora de proteção da norma mencionada, sua exoneração não foi arbitrária e sem justa causa.
3. Pelo exposto e coerente com o voto que proferi antes no acórdão mencionado, denego a segurança”.(MS nº 141.013-0/9-00, Relator Laerte Nordi, 28/03/2007).
“RESPONSABILIDAE CIVIL. Município de Paranapanema. Indenização por dano material e moral. Servidora pública. Cargo de Coordenador de Esporte provido em comissão. Exoneração durante a gravidez. Dispensa que decorreu de vício existente na nomeação, o qual foi reconhecido em compromisso de ajustamento de conduta firmado entre a Municipalidade e o Ministério Público Estadual. Dispensa motivada, que não ocorreu em razão da gravidez. Legalidade da exoneração. Inexistência do dever de indenizar. Sentença que julgou improcedente o pedido. Recurso improvido.”
(Apelação com revisão nº 990.10.341112-9, voto nº 178/11, Relator Antonio Carlos Villen, 21/02/2011)
Apesar de em alguns julgados ainda se adotar a posição mais antiga, a maioria deles vem adotando o posicionamento atual da Corte Constitucional, conforme se verifica a seguir e dos demais julgados juntados ao presente :
“TUTELA ANTECIPADA. Concessão para imediato pagamento do salário maternidade. Exercício de cargo em comissão. Dispensa durante o período de licença-gestante. Ofensa à estabilidade constitucional provisória. Artigo 10, II, ‘b’, do ADCT da CF. Decisão mantida. Recurso não provido.” (AI nº 944.427.5/0-00, Relator Edson Ferreira, 23/09/2009)
“EMENTA. DIREITO ADMINISTRATIVO – SERVIDORA PÚBLICA MUNICIPAL COMISSIONADA – GESTANTE – ESTABILIDADE CONSTITUCIONAL – DIREITO – EXISTÊNCIA – DEMISSÃO – VENCIMENTOS DEVIDOS – A autora, então servidora pública comissionada, foi demitida no terceiro mês de gravidez, da qual a Administração municipal tinha inclusive ciência. A estabilidade da gestante, prevista no art. 7º, XVIII, da Constituição Federal combinado com o art. 10, II, ‘b’, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, aplica-se também à servidora comissionada, pois é cláusula constitucional de proteção à maternidade – Precedente do STF – Entendimento do STJ – HORAS EXTRAORDINÁRIAS – BANCO DE HORAS – CRÉDITO NÃO GOZADO – PAGAMENTO DEVIDO – São devidas também as horas extraordinárias creditadas em seu banco de horas, uma vez que a servidora não teve a oportunidade de compensá-las, sob pena de enriquecimento ilícito do Município – Nega-se provimento ao recurso”. (Apelação cível nº 785.282-5/0-00, Relator Xavier de Aquino, 27/07/2009).
“SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. Cargo em comissão. Exoneração ad nutum. Estabilidade provisória em razão da gravidez enseja pagamento de verbas indenizatórias decorrentes. Inteligência dos arts. 7º, XVIII e 39, §3º da CF c.c. art. 10, II, b, do ADCT.”
(AC nº 990.10.485.907-7 – Taboão da Serra – 3ª vara cível. Voto nº 23.228, Relator Evaristo dos Santos, 06/12/2010).
“RESPONSABILIDADE CIVIL – Servidora grávida exonerada de cargo em comissão – Pretensão de pagamento das verbas trabalhistas desde a data da exoneração, até a data do nascimento do seu filho, além de danos morais – Admissibilidade – A exoneração deve respeitar as garantias constitucionais da licença-gestante e período de estabilidade remunerado – Inteligência dos arts. 7º, inciso XVIII e 39, §3º, da Constituição Federal e art. 10, II b, do ADCT – Sentença reformada – Recurso provido em parte.”
(Apelação com revisão nº 994.07.192078-7, 4ª Câmara – Seção de Direito Público – Relatora Ana Luiza Liarte – 18/04/2011).
“AÇÃO ORDINÁRIA – Estabilidade provisória prevista na regra do artigo 10, II, b, do ADCT. – Reintegração aos quadros da Municipalidade ou indenização por todo o período correspondente ao lapso temporal em que a servidora esteve indevidamente afastada do trabalho, em razão da gravidez. O desconhecimento do estado gravídico, por parte do empregador, não afasta o direito ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade. – ‘A natureza híbrida da relação de emprego público leva a respectiva entidade patronal a ser regida por regras oriundas tanto do Direito do Trabalho como do Direito Administrativo’ (Sergio Torres Teixeira, Proteção à relação de emprego, SP, LTr, 1988, p.349) – Recurso não provido”. (Apelação Cível nº 0002579-84.2009.08.26.0654, Voto nº 20, Relator Luiz Sérgio Fernandes de Souza, 11/04/2011).
Este, portanto, o panorama da questão nos Tribunais, assim resumido:
• Para o Supremo Tribunal Federal, a questão vem se firmando no sentido de que a dispensa imotivada de gestante configura ato contrário à moralidade administrativa e à dignidade da pessoa humana, motivo pelo qual vem sendo conferido o direito às gestantes à licença-maternidade e à estabilidade provisória;
• O Superior Tribunal de Justiça e o Tribunal de Justiça de São Paulo vêm se posicionando favoravelmente à estabilidade provisória, apesar de ainda haver alguns julgados divergindo sobre a matéria.
Por ser o Supremo Tribunal Federal o guardião da Constituição e dele emanar o posicionamento definitivo sobre as questões constitucionais, entendo deva prevalecer nesta Casa o entendimento de que às servidoras ocupantes de cargo exclusivamente em comissão seja conferida a estabilidade provisória prevista nos arts. 7º, XVIII, e 39, §3º, da CF, e artigo 10, inciso, II, alínea b, do ADCT da CF.
Entendo, ainda, ser possível adotar posicionamento do STJ e do TJSP no sentido de que a exoneração da servidora gestante é possível quando decorrer não da gravidez, mas de outro motivo justificável, tal como término da legislatura, do mandato da autoridade nomeante não reeleita, bem como morte da autoridade nomeante, sem prejuízo de outras hipóteses.
Em relação à questão da possibilidade de nomeação de outro servidor para preenchimento do cargo enquanto a servidora gozar de licença-maternidade, necessário sejam tecidas algumas considerações.
A Lei Federal 8.213/1991, que regula o Regime Geral de Previdência Social, em seus artigos 71 e 72, § 1º, dispõe que:
“Art. 71. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade.”
“Art. 72. O salário-maternidade para a segurada empregada ou trabalhadora avulsa consistirá numa renda mensal igual a sua remuneração integral. (Redação dada pela lei nº 9.876, de 26.11.99)
§ 1o Cabe à empresa pagar o salário-maternidade devido à respectiva empregada gestante, efetivando-se a compensação, observado o disposto no art. 248 da Constituição Federal, quando do recolhimento das contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço. (Redação dada pela Lei nº 10.710, de 5.8.2003)
(…)”
Percebe-se que a Câmara efetuará o pagamento do benefício diretamente às servidoras, ressarcindo-se de tais valores quando efetuar o recolhimento ao INSS das contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço.
Entretanto, não deve ser analisado somente quem suportará o encargo do pagamento dos valores decorrentes de licença-maternidade, ou seja, se a Câmara Municipal de São Paulo ou se o Órgão de Previdência pertinente, qual seja, o Instituto Nacional de Seguridade Social, nos termos do §13 do artigo 40, da Constituição Federal, mas também os termos da lei que prevê o número de cargos de que será composto cada Gabinete.
O art. 6º da Lei Municipal nº 13.637/2003 dispõe que:
“Art. 6º – Os Gabinetes dos Vereadores compõem-se de cargos de Chefia e Assistência.
§ 1º – Cada Gabinete contará com 01 (um) Chefe de Gabinete e até 17 (dezessete) Assistentes Parlamentares.
§ 2º – Poderão ser lotados no Gabinete até 04 (quatro) servidores afastados de outros órgãos públicos municipais, estaduais e federais ou entidades estatais, hipótese em que substituirão, em igual número, os Assistentes Parlamentares previstos no parágrafo anterior deste artigo.
§ 3º – No caso do Vereador optar por um Assistente Parlamentar, dentre os 17 (dezessete), para exercer as funções de Assistente de Imprensa, o mesmo deverá ser portador de registro profissional correspondente, no Ministério do Trabalho.”
Da redação do caput do artigo e de seu §1º, verifica-se que cada vereador poderá nomear no máximo 18 pessoas para exercerem cargo em comissão em seu gabinete. Sendo assim, por não existir vacância do cargo quando a servidora se encontra em gozo de licença-gestante, não há como ser nomeado outro servidor para preenchimento do cargo, visto não se encontrar este vago.
Importante ressaltar que a Lei Federal nº 11.770/08 criou o programa Empresa Cidadã , destinado à prorrogação da licença-maternidade por 60 dias mediante a concessão de incentivo fiscal. Referida lei, em seu artigo 2º , autoriza a administração pública direta, indireta e fundacional a instituir programa que garanta prorrogação da licença-maternidade a suas servidoras. O Município de São Paulo, por meio do Decreto Municipal nº 50.672/2009, dispôs sobre a possibilidade de as servidoras sujeitas ao Regime Geral de Previdência Social, que é o caso daquelas servidoras exercentes de cargo exclusivamente em comissão, prorrogarem a licença por 60 (sessenta) dias, conforme se extrai da leitura dos artigos seguintes:
“Art. 1º. Fica instituído, no âmbito da Administração Pública Direta, Autárquica e Fundacional do Município de São Paulo, o Programa de Prorrogação da Licença à Gestante e à Adotante previsto no artigo 2º da Lei Federal nº 11.770, de 9 de setembro de 2008.
Art. 2º. Serão beneficiadas pelo Programa de Prorrogação da Licença à Gestante e à Adotante as servidoras públicas municipais vinculadas ao Regime Geral de Previdência Social – RGPS, lotadas ou em exercício nos órgãos integrantes da Administração Pública Direta, Autárquica e Fundacional, em gozo do benefício salário-maternidade de que tratam os artigos 71 e 71-A da Lei Federal nº 8.213, de 24 de julho de 1991.
§ 1º. A prorrogação será garantida à servidora pública que requeira o benefício na seguinte conformidade:
I – para as servidoras em gozo do benefício de que trata o artigo 71 da Lei Federal nº 8.213, de 1991: até 30 (trinta) dias, contados da data do parto;
(…)
§ 2º. Na hipótese do inciso I do § 1º deste artigo, a prorrogação terá a duração de 60 (sessenta) dias e iniciar-se-á no dia subsequente ao término da vigência do benefício de que trata o artigo 71 da Lei Federal nº 8.213, de 1991. (negritamos)
(…) “
Resta compatibilizar o dispositivo com a norma constitucional que prevê a estabilidade provisória e o direito à licença-gestante. A estabilidade provisória, como já foi visto, é garantida por 5 meses após o parto, enquanto o direito à licença-gestante constitucional é garantido por 120 dias. Dessa maneira, o período de estabilidade a ser garantido à gestante pelo ADCT é o de 5 meses após o parto. Entretanto, o deferimento de prorrogação de licença-maternidade por 60 dias pode vir a implicar num aumento de prazo de gozo de licença-gestante, devendo-se entender, consequentemente, que caso o período de gozo de licença-gestante ultrapasse os 5 meses previstos no ADCT, o período de estabilidade provisória da servidora acaba sendo ampliado.
Em resumo: caso haja deferimento da prorrogação por mais 60 dias da licença-maternidade, tal período pode implicar num acréscimo de período estabilitário à servidora, terminando este com o fim da licença-maternidade, devendo ser respeitado, de qualquer maneira, o período mínimo de 5 meses após o parto. Deve-se respeitar, assim, o maior período conferido à servidora, ou seja, aquele previsto no ADCT ou aquele conferido com a prorrogação da licença-maternidade.
Por estar a prorrogação da licença-maternidade prevista em Decreto Municipal, sugiro a edição de Ato por esta Casa regulamentado a matéria.
Caso se entenda pela adoção do posicionamento exposto, qual seja, de que às servidoras ocupantes de cargo exclusivamente em comissão seja conferida a estabilidade provisória prevista no artigo 10, inciso II, alínea b, do ADCT da CF, limitada a 5 (cinco) meses após o parto, com a ressalva de ser possível a dispensa por justa causa, bem como o direito à licença-gestante prevista nos arts. 7º, XVIII, e 39, §3º, da CF, e arts. 71 e 72 da Lei Federal nº 8.213/91, com a possibilidade de prorrogação por 60 (sessenta) dias, nos termos do Decreto Municipal nº 50.672/2009, o que pode acarretar aumento do período de estabilidade, sugiro a edição de um Ato a fim de regulamentar a matéria.
Este é o meu parecer, que submeto à análise de Vossa Senhoria.
São Paulo, 21 de setembro de 2011.
Érica Corrêa Bartalini
PROCURADORA LEGISLATIVA – RF 11.230
OAB/SP 257.354