Parecer n° 41/2001

AT.2 – Parecer nº 041/01.

Ref.: Consulta datada em 28.02.2001, do Presidente da CPI – TCM ao Presidente da Câmara Municipal de São Paulo (protocolo de recebimento na Presidência nº. 472, de 01.03.01).
Interessado(a)(s): Vereador x..x.x.x.x.x.x.x, Presidente da CPI – TCM.

Assunto: Poderá a Comissão Parlamentar de Inquérito, constituída com base no Requerimento RDP nº. 27/2001 (·CPI do TCM·), convocar Conselheiros e ex-Conselheiros do Tribunal de Contas do Município de São Paulo para depor?

Sr. Assessor Chefe,

1. É solicitada manifestação desta Assessoria Jurídica, acerca de consulta dirigida ao Exmo. Sr. Presidente desta Casa Legislativa pelo nobre Vereador x.x.x.x.x.x.x.x, DD. Presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito constituída por força do Requerimento RDP nº. 27/2001 (·CPI do TCM·).

Procura-se resposta para a indagação que assim pode ser sintetizada: poderá a ·CPI do TCM· convocar Conselheiros e ex-Conselheiros do Tribunal de Contas do Município de São Paulo para depor?

2. Embora genericamente formulada, na própria consulta já se alinham algumas ordens de considerações, a demandar um cuidadoso e ponderado exame dos múltiplos fatores envolvidos, com vistas a definir uma solução sustentável, à luz do ordenamento vigente.

2.1. De um lado, pela primeira série desses aspectos aflorados no texto exordial, faz-se necessário levar na devida conta que as Comissões Parlamentares de Inquérito, criadas pela Câmara Municipal de São Paulo, têm ·poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos no Regimento Interno· (art. 33, ·caput·, LOM), bem como, no que importa à questão em tela, que podem, ·no interesse da investigação· (art. 33, § 1º, LOM): a) ·tomar depoimento de autoridade municipal, intimar testemunhas e inquiri-las sob compromisso· (art. 33, § 1º, inciso I, LOM); b) ·solicitar informações ou depoimenos de autoridade ou cidadãos· (art. 33, § 1º, combinado com art. 32, § 2º, IX, LOM); e c) requerer ao juízo competente quando venha a ocorrer, pela segunda vez, o não comparecimento do intimado (art. 92, inciso III do Regimento Interno da Câmara Municipal de São Paulo – RI/CMSP. combinado com art. 33, ·caput· e § 1º da LOM).

Oportuno assinalar, como faz com propriedade o i. consulente, que os poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, em matéria de interesse do Município, atribuídos às comissões de inquérito do parlamento paulistano nos termos do art. 33 da LOM, encontram seu fundamento de validade no art. 13, § 2º da Constituição Estadual paulista, respaldados, ambos os dispositivos, no art. 58, § 3º da Constituição Federal.

2.2. De outro lado, e no sentido inverso, cumpre observar que o egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, na ADIN nº. 11.754-0/6, declarou inconstitucional a parte final do inciso IV do parágrafo 2º, do artigo 32 da Lei Orgânica do Município de São Paulo – LOM/SP (expressão declarada inconstitucional: ·e os Conselheiros do Tribunal de Contas para prestar informações sobre assuntos inerentes às suas atribuições·). Dessa decisão colegiada terminativa, como se pode constatar, resultou insubsistente a previsão de competência às Comissões permanentes e temporárias desta Edilidade para convocar os Conselheiros do TCM a fim de prestarem informações sobre assuntos inerentes às suas atribuições.

3. A solução para a aparente antinomia, entrevista nas duas séries argumentativas descritas nos subitens anteriores, somente resultará de uma necessária e equilibrada ponderação entre, de um lado, as funções e poderes da CPI, e de outro, a natureza e as funções institucionais do Tribunal de Contas municipal, bem como do decorrente regime jurídico do exercício das funções a cargo dos senhores Conselheiros do TCM, especialmente o que respeita às suas garantias e prerrogativas, instituídos com o fim de lhes permitir o adequado exercício das funções.

4. Feitas essas considerações, mostra-se então possível uma resposta direta à pergunta formulada: a ·CPI do TCM· não poderá convocar Conselheiros ou ex-Conselheiros do Tribunal de Contas municipal para depor.

4.1. Tal conclusão fundamenta-se, quanto aos atuais Conselheiros, na cristalina e inequívoca proclamação da inconstitucionalidade da parte final do inciso IV do parágrafo 2º, do artigo 32 da Lei Orgânica do Município de São Paulo – LOM/SP, como já referido.

Quanto aos ex-Conselheiros, também concorre como fundamento a consideração de que sua atual situação jurídica quanto às funções que exerceram, como Conselheiros, é de ser tida como correspondente à sua eventual condição do cidadão comum, em relação ao qual não cabe convocação para depor perante CPI, mas apenas convite (a teor do art. 32, parágrafo 2º, inciso IX da LOM/SP), ou intimação (caso se encontre, quanto ao objeto de investigação, em situação de testemunha, a teor do art. 33, parágrafo 1º, inciso I, do mesmo diploma).

4.2. Para melhor visualizar a extensão dos efeitos do acórdão prolatado em sede de controle concentrado de constitucionalidade, vale reproduzir o dispositivo da LOM, no que importa, bem como repetir a indicação da parte declarada inconstitucional, como segue.

·Art. 32 – A Câmara terá Comissões permanentes e temporárias, (…).
§ 2º – Às Comissões, em razão da matéria de sua competência, cabe: (…)
IV – convocar os Secretários Municipais, os responsáveis pela administração direta e indireta e os Conselheiros do Tribunal de Contas para prestar informações sobre assuntos inerentes às suas atribuições;·.

O § 1º do artigo 33, do mesmo diploma, estende às Comissões Parlamentares de Inquérito, no interesse da investigação, as atribuições previstas no mencionado inciso IV, entre outras.

Ocorre que, como já referido, foi declarada inconstitucional a seguinte parte final deste inciso IV: ·e os Conselheiros do Tribunal de Contas para prestar informações sobre assuntos inerentes às suas atribuições·.

4.3. Apenas para argumentar, poder-se-ia dizer que os efeitos dessa decisão judicial se cingiriam tão-somente às atribuições das demais espécies de Comissões parlamentares da Edilidade, não se estendendo, esses efeitos, ao ponto de afetar as atribuições das CPIs, constitucionalmente expressas como poderes de investigação próprios das autoridades judiciais. Esta última hipótese, porém, não resiste a um exame mais acurado.

4.3.1. Primeiro, porque, cuidando-se de convocação, os poderes da CPI não diferem daqueles conferidos às outras espécies de comissões parlamentares, guardando nesta parte idêntica natureza e regime jurídico; assim, a referida declaração de inconstitucionalidade também se reflete nos poderes de convocação das CPIs, no tocante aos Conselheiros do TCM.

4.3.2. Segundo, e não menos importante, porque os fundamentos da decisão declaratória de inconstitucionalidade em causa apontam para a sua aplicabilidade, no particular, às CPIs, porque tais fundamentos têm seu fulcro na constitucional proclamação das garantias e prerrogativas reconhecidas como essenciais ao exercício das funções dos membros dos Tribunais de Contas, instituídas em favor da necessária autonomia e independência desses órgãos, sem embargo de suas funções de auxílio aos Parlamentos no tocante ao controle externo.

4.4. Com efeito, em consonância aos termos do acórdão em tela, e em simetria ao previsto nos arts. 75 e 73, parágrafo 3º da Constituição Federal, é certo que aos Conselheiros do TCM/SP aplicam-se as normas pertinentes aos Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado (art. 151 e seu parágrafo único da Constituição Estadual), sendo que estes (e, portanto, também aqueles), terão as mesmas garantias e prerrogativas dos Desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado (art. 31, parágrafo 3º, Constituição Estadual).

Em suma, restou assentado, no r. acórdão em comento:

·Mas, como não pode a Assembléia Legislativa convocar Desembargadores ·para prestar informações sobre assuntos inerentes às suas atribuições· e, por isso, não pode convocar Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado para fazê-lo, também não pode a Câmara Municipal convocar Conselheiros do Tribunal de Contas Municipal, para aquele fim· (cf. cópia anexa, do voto do e. Desembargador Salles Penteado, Relator designado).

5. A par disso, nada impede que o Conselheiro se disponha a comparecer para falar à Comissão, espontaneamente ou em resposta a eventual convite da mesma. Neste sentido, José Luiz Mônaco da Silva, em mais de uma passagem de seu livro ·Comissões Parlamentares de Inquérito· (Ed. Ícone, SP, 1999, págs. 60 e 62).

6. Para finalizar, resta apenas, ao que parece, examinar – ainda que muito brevemente – a possibilidade ou não de ser o Conselheiro intimado para depor como testemunha perante a CPI municipal.

A questão remete-se à controvérsia, que não se mostra pacificada, acerca da possibilidade ou não de poder o magistrado servir como testemunha.

A respeito, a Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Lei Complementar nº 35, de 14.03.1979) prevê no artigo 33 que são prerrogativas do magistrado, entre outras: I – ser ouvido como testemunha em dia, hora e local previamente ajustados; e II – ·não estar sujeito a notificação ou a intimação para comparecimento, salvo se expedida por autoridade judicial·.

Em sentido idêntico – e considerando que a Lei nº 1.579, de 18.03.1952, que ·dispõe sobre as Comissões Parlamentares de Inquérito·, prevê (arts. 3º e 6º) que o processo e a instrução desses inquéritos, bem como as intimações de testemunhas, obedecerão supletivamente, no que couber, as normas do processo penal – verifica-se que o artigo 221 do Código de Processo Penal estabelece que, entre outras altas autoridades, os membros do Poder Judiciário, bem como os membros dos Tribunais de Contas, ·serão inquiridos em local, dia e hora previamente ajustados entre eles e o Juiz·.

A par desses dispositivos, outros elementos da questão são apontados nos seguintes escólios doutrinários:
·Também se tem afirmado que não podem servir como testemunhas o membro do Ministério Público e o juiz que oficiaram no inquérito policial ou na própria ação penal, pois essa posição é incompatível com a de parte ou julgador (arts. 252, II, 258 e 564, I, do CPP e 405, § 2º, do CPC). Na verdade, o que a lei dispõe é que, tendo sido ouvido como testemunha, está o juiz impedido de exercer a jurisdição e o membro do Ministério Público de exercer suas funções no processo· (Júlio Fabbrini Mirabete, Código de Processo Penal Interpretado, Ed. Atlas, SP, 1994, 2ª ed., págs. 260/261).

· ·(…) a regra proibitiva do art. 252, II, do CPP veda ao juiz exercer jurisdição no processo em que houver de servir como testemunha, não proibindo o contrário, ou seja, que o magistrado sirva de testemunha em demanda em que funcionou, a respeito de fatos havidos em seu desenrolar, e lógico, desde então impossibilitado de voltar a exercer atividade jurisdicional na causa· (RT 665/277)· (Mirabete, ob. cit., pág. 261).

O mesmo renomado autor, com propriedade, aponta jurisprudência que trata do conteúdo de um dos ·lados da balança· envolvidos na controvérsia doutrinária e jurisprudencial, ao qualificar a obrigação da pessoa de depor como testemunha, se arrolada, como dever de ordem pública, resultante do preponderante interesse público no esclarecimento dos objetos de investigação (Mirabete, ob. cit., pág. 260: TJSP, RT 620/295). No outro lado da balança, encontram-se todas as considerações – que não são poucas nem irrelevantes – centradas no tema das prerrogativas e garantias necessárias ao exercício autônomo e independente das funções próprias do órgão.

De toda forma, caso venha a Comissão Parlamentar de Inquérito entender e decidir, por seu colegiado, no sentido de promover a intimação de Conselheiro do TCM para depor como testemunha, de todo recomendável será, nesta hipótese, que a decisão seja tomada à vista de prévia motivação, em que constem elementos necessários e suficientes a evidenciar a situação in casu, como seja: no interesse do esclarecimento do(s) fato(s) determinado(s) objeto(s) de investigação da CPI, demonstrar-se presente a necessidade de ser ouvido o Conselheiro ou o ex-Conselheiro do TCM, que porventura tenha tomado conhecimento pessoal de fatos relacionados ao objeto da CPI.

O cuidado mostra-se recomendável, haja vista uma eventual – e não pouco provável, em face da natureza controvertida da matéria – necessidade de medidas judiciais no caso de desatendimento a tal suposta intimação.

7. Por todo o exposto, finaliza-se com a seguinte síntese conclusiva:

7.1. A ·CPI do TCM· não poderá convocar Conselheiros ou ex-Conselheiros do Tribunal de Contas municipal para depor.
7.2. Poderá a CPI considerar a hipótese de dirigir convite a Conselheiro ou ex-Conselheiro do TCM.
7.3. Quanto à possibilidade, ou não, de ser o Conselheiro ou ex-Conselheiro intimado para depor como testemunha perante a CPI municipal, a matéria é controvertida. De tal sorte, caso venha a Comissão Parlamentar de Inquérito entender e decidir, por seu colegiado, no sentido de promover referida intimação, de todo recomendável será, nesta hipótese, que a decisão seja tomada à vista de prévia motivação, em que constem elementos necessários e suficientes a evidenciar a situação, qual seja: no interesse do esclarecimento do(s) fato(s) determinado(s) objeto(s) de investigação da CPI, demonstrar-se presente a necessidade de ser ouvido o Conselheiro ou ex-Conselheiro do TCM, que porventura tenha tomado conhecimento pessoal de fatos relacionados ao objeto da CPI.

É o parecer, que submeto à elevada consideração de V. Sa.

São Paulo, 16 de março de 2001.

Sebastião Rocha
Assessor Técnico Supervisor (Substº.)
OAB/SP nº 138.572

Ref. Par. 041/01
À D.G.
Senhora Diretora Geral da Secretaria da Câmara:

Honra-nos sua Excelência, o Nobre Presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito objeto do requerimento RDP nº 27/2001, Vereador x.x.x.x.x.x.x..x, consultando-nos acerca da possibilidade de legal de que se proceda à convocação de Conselheiros e ex-Conselheiros para depor, vis-à-vis ao permissivo consubstanciado no inciso IV, parágrafo 2º, do artigo 32 da LOMSP, perante a CPI presidida pelo Consulente.

Curvo-me às respeitáveis considerações aduzidas pelo I. Assessor Sebastião Rocha, em parecer que tenho a satisfação de elevar ao conhecimento de V.Sa., objetivando contribuir a elucidação do problema veiculado na presente consulta; considerações essas que acompanho.

Com efeito, o trânsito em julgado de decisão vazada em sede de controle concentrado de constitucionalidade, nada obstante a enfática contrariedade desta Assessoria na oportunidade do debate processual originário, decisão essa tendo por parcialmente insubsistente o poder de convocação, tal como previsto na Lei Orgânica deste Município, trouxe como subproduto um vasto campo de incerteza a povoar o tema.

É certo que a dicção que já não mais se tem por eficaz direcionava o poder de convocação genérico, potencialmente rotineiro, e extensivo, a qualquer das comissões, quer permanentes quer temporárias, deste Legislativo. A despeito da vigorosa objeção desta Assessoria, no corpo do debate do processo que ensejou a referida declaração, ora no exame meramente consultivo do problema, permito-me confessar que daquele modo amplo e inespecífico, com que o poder de convocação figurara na LOMSP, seria certamente um veículo de temerária utilização, tendo presentes as prerrogativas dos Conselheiros.

O mesmo não me pareceria de igual modo temerário, fosse o poder de convocação meramente restrito a comissões parlamentares de inquérito; particularmente se a hipótese fosse, como o é no caso ora em exame, CPI que tem por finalidade específica investigar fatos certos que dizem respeito ao próprio órgão em que têm assento os Ínclitos Conselheiros da E. Corte de Contas.

E assim porque, no mesmo diapasão, figuram os poderes das CPIs disciplinados por preceito que ao meu ver comportará hermenêutica segundo os cânones da clássica formulação: exceptiones sunt strictissimae interpretationis. Entretanto, bem obtempera o parecer que encaminho, no sentido de que a matéria suscita controvérsia.

Eis as razões pelas quais considero aconselhável que nos fixemos aos parâmetros do seguinte aconselhamento: 1) em havendo pertinência de esclarecimentos pela via da prova oral, poderão os Nobres Conselheiros vir a ser convidados a comparecer perante a CPI que tenha por objeto fato determinado, concernente à respectiva Corte, como é o caso; 2) em caso de não atendimento ao convite acima – hipótese, por sinal, que pessoalmente creio improvável, tendo presentes os elevados predicados pessoais dos I. Conselheiros, bem como o reconhecido descortino de seu atual Presidente, Prof. Edson Simões – e havendo, para além das circunstâncias enumeradas no item anterior, a intenção de ouvi-los, por parte dos membros dessa específica CPI, estou em que se poderá reiterar o propósito de oitiva mediante o emprego da figura da intimação para prestar esclarecimentos na qualidade de testemunhas; 3) em caso de não comparecimento na forma e dentro das circunstâncias referidas no item anterior, e tendo subsistentes os propósitos de que se faça eficaz a intimação, caberá a Sua Excelência, o Nobre Vereador Consulente, em nome da maioria da Comissão por ele presidida, propor a Sua Excelência, o Sr. Presidente da Câmara Municipal de São Paulo, que se ultimem as providências judiciais porventura cabíveis à espécie, no exercício das atribuições que lhe confere o artigo 16 c/c a alínea “b” do inciso VI do artigo 17, ambos do Regimento Interno desta Casa.

Com minhas homenagens, segue à apreciação superior, cabendo-me recomendar seja o presente expediente objeto de autuação específica, por cópia, retornando o respectivo original ao Nobre Consulente para que dele se faça juntada aos autos da respectiva CPI, nesse último caso, naturalmente, se assim julgar-se oportuno proceder.

São Paulo, 16 de março de 2.001.

ANTÔNIO RODRIGUES DE FREITAS JÚNIOR

Assessor Técnico Legislativo Chefe

OAB/SP 69.936