Parecer n° 59/2016

Parecer nº 59/16
Ref.: TID xxxxxxxxxxxx
Interessado: xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx – CTI
Assunto: Possibilidade de o servidor xxxxxxxxxxxxxxxxxxx realizar o trabalho em seu domicílio

Sr. Procurador Legislativo Supervisor,

Trata-se de questionamento formulado pelo Sr. Supervisor da Equipe de Desenvolvimento e Suporte a Sistemas, ratificado pelo Sr. Coordenador do Centro de Tecnologia de Informação, acerca da possibilidade de o funcionário xxxxxxxxxxxx (RF xxxxxx), Consultor Técnico Legislativo – Informática, realizar seu trabalho em seu domicílio.

Do pedido consta esclarecimento de que o servidor está afastado por motivo de doença crônica que dificulta o trânsito pela cidade. Consta, ademais, a informação de que há a possibilidade de colaboração do servidor à distância com o uso de recursos de tecnologia. Merece destaque, outrossim, o fato de o servidor xxxxxxxxxxxxxxxxxxx possuir “conhecimentos especializados para manter aplicativos existentes na Casa, parte deles criados por ele”.

A Secretaria Geral Administrativa encaminhou os autos a esta Procuradoria para avaliação da viabilidade jurídica de (i) autorizar o servidor a trabalhar remotamente, desde que atestada sua capacidade laboral, e (ii) regulamentar o trabalho a distância nesta Edilidade.

Com relação à autorização para o servidor desempenhar sua função remotamente, para análise da matéria, imperioso seja trazido aos autos laudo médico da Secretaria de Assistência à Saúde – SGA.8, atestando sua condição e esclarecendo se o servidor tem condições físicas e psicológicas de trabalho, apenas estando impossibilitado de comparecer à Câmara Municipal.

De acordo com o art. 20-A da Lei nº 13.637/2003, compete a SGA.8 a comprovação das condições de saúde dos servidores da Câmara Municipal. Outrossim, o Ato nº 1134/2011, que dispõe sobre o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional dos servidores da Câmara Municipal, ratifica a competência da Secretaria de Assistência à Saúde – SGA.8 para a realização de exames e a emissão de atestado de saúde ocupacional, de modo que, salvo melhor juízo, o referido setor é o competente para atestar a condição de saúde do servidor pleiteante do trabalho à distância.

Além do exame médico, é indispensável que o servidor manifeste expressamente sua concordância com o pedido ora formulado, lembrando que, caso seja deferido o pedido, é necessário que seu domicílio contenha infraestrutura física e tecnológica adequada à realização de sua função.

Anote-se que a necessidade do serviço, bem como a importância do servidor para o setor em que está lotado já foram devidamente demonstradas pelos seus superiores.

Importa mencionar que o servidor esteve em licença médica por longo período. É cediço que “o funcionário licenciado para tratamento de saúde não poderá dedicar-se a qualquer atividade remunerada, sob pena de ter cassada a licença e ser promovida sua responsabilidade” (art. 140 da Lei nº 8989/79). Portanto, importante deixar claro que a licença médica é incompatível com o home office.

Tais documentos são imprescindíveis para a análise da questão, no que tange ao pleito de trabalho em domicílio em favor do servidor xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx.

Após a apresentação da mencionada documentação, sugerimos o retorno dos autos à Procuradoria a fim de analisarmos, à luz do princípio da eficiência, a possibilidade de a Mesa da Câmara autorizar o servidor a desempenhar suas funções temporariamente à distância.

No que se refere à possibilidade de regulamentar o teletrabalho, home office ou trabalho a distância nesta Casa, tecemos as seguintes considerações:

Confira-se abaixo o conceito de teletrabalho na Administração Pública:

“O teletrabalho na administração pública pode ser conceituado como aquele em que o servidor público pode desenvolver parte ou todo o seu trabalho em casa ou em qualquer outro local, apoiado na utilização das novas ferramentas tecnológicas, em especial, o computador, acesso à Internet, hardwares e softwares necessários para o desempenho de suas funções. As atividades priorizadas devem ter como referência as atribuições em que seja possível, em função da característica do serviço, mensurar objetivamente o desempenho do servidor e a qualidade do serviço prestado (Matias-Pereira, 2013)” (in http://www.unb.br/noticias/unbagencia/artigo.php?id=638, acesso em 26 de fevereiro de 2016).

O trabalho a partir do domicílio do funcionário parece ser uma tendência, especialmente em cidades grandes, como São Paulo:

Isso porque há inegáveis vantagens não apenas para o funcionário, que otimiza seu tempo sem a necessidade do deslocamento ao trabalho, mas também para a Administração, que não necessitará de tanto espaço físico e mobiliário.

Há, inclusive, vantagens para a cidade como um todo, que será beneficiada com significativa melhora na mobilidade urbana e, consequentemente, diminuição da poluição atmosférica.

Não bastasse, basta uma breve pesquisa pela internet para se deparar com pesquisas mencionando os benefícios do home office para o empregador:

“Entre as vantagens da utilização desse instituto se pode mencionar a redução do estresse do empregado, a maior produtividade, a proteção ao meio ambiente com o trânsito de menor fluxo de veículos, redução da poluição, a economia de espaço físico, etc.” (http://www.canalabertobrasil.com.br/colunas/rh/teletrabalho-na-administracao-publica/, acesso em 26 de fevereiro de 2016).

“Com uma parcela de seus servidores trabalhando fora do TCU é previsível significativa redução no consumo de energia elétrica, água, papel, insumos de informática, entre outros. Além de incorrer na diminuição de espaços necessários para a acomodação de servidores e equipamentos.
O teletrabalho é ecológico. Dispensando a obrigatoriedade da presença de parte de seus servidores, o TCU concorre para a redução do volume de tráfego nas capitais, especialmente na hora do rush. Com a consequente diminuição da emissão de gás carbônico, contribuindo para uma atmosfera mais saudável, na cidade e para a sustentabilidade do planeta.
Teletrabalho é qualidade de vida. Pode o servidor produzir mais e com melhor qualidade, quando não está amarrado à obrigatoriedade de comparecimento ao local de trabalho. Ele pode harmonizar o cumprimento de sua responsabilidade profissional, com as suas obrigações de família e outras que lhe proporcionem crescimento pessoal, profissional e de cidadania”. (http://escoladeredes.net/profiles/blogs/adocao-de-teletrabalho-na, acesso em 26 de fevereiro de 2016).

Conforme demonstrado no requerimento, o trabalho à distância (também chamado de “teletrabalho” e “home office”) já é realidade em alguns órgãos públicos, tais como o Tribunal de Justiça de São Paulo, o Tribunal Superior do Trabalho, o Supremo Tribunal Federal, o Banco do Brasil, o Tribunal de Contas da União, o Serpro – Sistema Federal de Processamento de Dados, dentre outros.

Até mesmo no âmbito da Municipalidade de São Paulo houve recentemente a implementação da jornada de trabalho fora das dependências físicas da Administração aos servidores municipais lotados na Secretaria Municipal de Finanças e Desenvolvimento Econômico, nos termos do Decreto nº 56.370, de 26 de agosto de 2015.

Além do mencionado Decreto Municipal, houve a edição da Portaria SF 167, de 1º de setembro de 2015, com a regulamentação interna sobre o trabalho à distância na Secretaria Municipal de Finanças e Desenvolvimento Econômico.

Tais órgãos definiram critérios e requisitos para regulamentar o trabalho remoto.

Há, outrossim, projeto de lei em trâmite perante a Câmara dos Deputados, o qual visa acrescer § 3º ao art. 19 da Lei nº 8.112/1990, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais, para autorizar a implantação do sistema de escritório remoto (home office) no serviço público, com o seguinte teor: “Fica autorizada a implantação do sistema de escritório remoto no âmbito do serviço público, que consiste na atividade ou no conjunto de atividades realizadas fora das dependências físicas do órgão ou entidade, quando os resultados puderem ser efetivamente mensuráveis, conforme se dispuser em regulamento”.

No que tange às relações trabalhistas regidas pela CLT, a legislação prevê expressamente o trabalho remoto, sendo a informática o elo entre empregado e empregador.

Art. 6o Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego. (Redação dada pela Lei nº 12.551, de 2011)
Parágrafo único. Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio. (Incluído pela Lei nº 12.551, de 2011).

A CLT determina que são equivalentes as subordinações exercidas por meios telemáticos e informatizados e aquelas exercidas pessoalmente, de modo que é inquestionável a subordinação jurídica nessa relação, a caracterizar a relação empregatícia.

Não há barreira, portanto, ao trabalho prestado fora das dependências da empresa, na legislação que rege as relações de emprego.

Todavia, no âmbito do serviço público municipal não basta que não seja vedado o home office, necessário se faz que seja expressamente permitido. De fato, “a lei, ou, mais precisamente, o sistema legal é o fundamento jurídico de toda e qualquer ação administrativa. A expressão “legalidade” deve, pois, ser entendida como “conformidade à lei e, sucessivamente, às subsequentes normas que, com base nela, a Administração expeça para regular mais estritamente sua própria discrição”, adquirindo então um sentido mais extenso. Ou seja, é desdobramento de um dos aspectos do princípio da legalidade o respeito, quando da prática de atos individuais, aos atos genéricos que a Administração, com base na lei, haja produzido para regular seus comportamentos ulteriores” (CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO, in “Curso de Direito Administrativo”, 17ª edição, São Paulo: Malheiros, 2004, pág. 67).

Sendo assim, caso seja do interesse da Mesa da Casa, será necessário normatizar o trabalho a distância a fim de efetivá-lo na Câmara Municipal.

Para tanto, sugere-se a criação de um “Grupo de Estudos” a fim de debater quais seriam os critérios para adesão ao trabalho à distância, oportunidade em que poderiam ser definidos, por exemplo:

1) quais setores poderiam implementar tal método;
2) como se daria a adesão ao trabalho em domicílio;
3) como ocorreria a comprovação da frequência;
4) qual o perfil do funcionário que poderia exercer suas funções a distância;
5) quais as exigências físicas e tecnológicas do domicílio para viabilizá-lo;
6) como dar-se-á a aferição dos resultados e da produtividade.

Ao definir as hipóteses em que o home office é possível no serviço público municipal há que se ter em vista os princípios constitucionais que regem a Administração Pública, especialmente o princípio da eficiência, mediante a demonstração clara de que a produtividade do serviço público não será comprometida, aliada, ademais, à redução de custos operacionais.

Importante, também, definir as hipóteses possíveis para adesão do servidor a este método de trabalho, para que não haja alegação de ofensa ao princípio da isonomia.

Daí a importância do mencionado Grupo de Estudos e eventual adoção de um projeto piloto, o qual, se for o caso, pode abranger o servidor ora objeto do presente questionamento.

A respeito da importância de que a implantação do teletrabalho seja precedida de um projeto piloto, confira-se a experiência relatada no SERPRO:

“No Serviço Federal de Processamento de Dados – SERPRO, empresa pública vinculada ao Ministério da Fazenda, o teletrabalho foi decorrente do projeto denominado “Implantação e Resultados de um Programa de Teletrabalho”, cuja conclusão tem o seguinte teor:
Conclui-se também que para a implantação do modelo para o Teletrabalho precisamos: tomar conhecimento do modelo de gestão da organização, efetivar a análise por meio de avaliação das atividades dos cargos, das características do perfil dos empregados que exercem os cargos avaliados, selecionar candidatos voluntários, capacitar o empregado para o eficaz cumprimento de suas atividades em domicílio e fazer avaliação da ergonomia na residência do empregado passível de ser um Teletrabalhador. A introdução do Teletrabalho não significa exclusivamente mudanças organizacionais automáticas, mas sim a busca de satisfação, eficiência, do nível de responsabilidade e autonomia, bem como mudanças nos processos de tomada de decisão, facilitado por uma nova visão cultural da organização. O contexto social, cultural e estratégico do Projeto Piloto Teletrabalho possui um impacto importante no envolvimento e percepções dos Teletrabalhadores. Foi observado nesta fase que a participação dos Telegerentes é de primordial importância e que cabe a eles as correções de rumo para o alcance dos objetivos pretendidos pelo Projeto Piloto Teletrabalho. Os resultados apresentados nesta avaliação não nos oferecem os subsídios necessários para um diagnóstico completo, e só após a conclusão de todo o processo pode-se aferir os resultados comparando-os com os estimados no relatório inicial de viabilidade para implantação deste projeto. No entanto, as análises técnicas dos dados e informações apresentados até o momento apontam indícios positivos e uma linha de desenvolvimento crescente. As expectativas dos Teletrabalhadores com relação ao Teletrabalho têm sido identificadas como fator de vantagem na redução de custos, aumento de produtividade e melhoria da qualidade de vida profissional, propiciando a flexibilidade na realização do trabalho ao seu biorritmo profissional e pessoal. Ressaltam-se, ainda, ganhos indiretos em vestuário, locomoção e o tempo empregado na trajetória para o Trabalho”. (Joselma Oliveira Pinto, Analista de Sistemas, Administradora de Empresas e professora universitária com mestrado pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), em Engenharia da Informação. Gerente do Projeto Teletrabalho do Serpro integrando à Unidade de Alinhamento Estratégico da Organização. Publicações: Dissertação de Mestrado, in http://www.csjt.jus.br/c/document_library/get_file?uuid=774a3695-4cbe-4d44-9006-706fd66a5573&groupId=955023).

Em suma, é possível regulamentar o trabalho à distância, caso seja do interesse da Mesa da Câmara, especialmente tendo em vista o avanço tecnológico e a inegável dificuldade de mobilidade em cidades como a nossa.

Junto ao presente cópia da Lei nº 12.551/2001, que alterou o art. 6º da CLT, do Projeto de Lei 2.723/15, da Câmara dos Deputados, da Resolução nº 568/16, do Supremo Tribunal Federal, do Provimento Conjunto 05/15, do Tribunal de Justiça e da Corregedoria Geral de Justiça de São Paulo, das Portarias nº 139/09 e nº 99/10 do Tribunal de Contas da União, do Decreto nº 56.370/15, do Município de São Paulo, e da Portaria 167/15, da Secretaria Municipal de Finanças e Desenvolvimento Econômico do Município de São Paulo. Junto, também, breve pesquisa sobre o home office na Administração Pública.

Em suma:

(i) No que tange ao pedido para que o servidor xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx exerça suas funções de seu domicílio, aguardamos sejam apresentados os documentos que evidenciem expressamente sua concordância com o pedido ora formulado, bem como laudo médico da Secretaria de Assistência à Saúde – SGA.8, atestando sua condição de saúde e esclarecendo se o servidor tem condições físicas e psicológicas de trabalho, apenas estando impossibilitado de comparecer à Câmara Municipal. Após a apresentação de tais documentos, sugerimos o retorno dos autos à Procuradoria, para verificar a possibilidade jurídica de a Mesa da Câmara autorizar o trabalho à distância, à luz do princípio da eficiência;

(ii) Já no que se refere ao questionamento sobre a regulamentação do trabalho à distância nesta Edilidade, este regulamento é possível no âmbito do serviço público, conforme demonstram os diversos exemplos trazidos aos autos, sugerindo-se, a critério da Mesa, a criação de um Grupo de Estudos e a eventual adoção de um projeto piloto, a fim de debater quais os requisitos e exigências para viabilizar o home office.

É o meu parecer, que submeto à superior consideração de Vossa Senhoria.

São Paulo, 04 de março de 2016.

LILIAN VARGAS PEREIRA POÇAS
Procuradora Legislativa
OAB/SP 184.138

Home office. Doença crônica.