Parecer ADM n° 55/2020
Assunto: Intimação de servidor para apresentação de defesa em face de decisão que o reprovou no estágio probatório.
Dra. Procuradora Chefe,
Trata-se de consulta formulada por SGA sobre intimação de servidor para apresentação de defesa em face de decisão que o reprovou no estágio probatório.
O servidor em questão protocolou requerimento para realizar sustentação oral quando de seu julgamento, bem como se opondo à realização de julgamento virtual.
A E. Mesa Diretora, em 03 de julho, publicou a Decisão de Mesa nº 4.523/20 no Diário Oficial da Cidade após apreciar o pedido formulado, indeferindo o quanto pleiteado e determinando a cientificação do servidor acerca da retomada da fluência dos prazos dos processos e expedientes administrativos, haja vista a publicação no Diário Oficial da Cidade, em 27 de junho, do Ato nº 1.475/2020.
SGA, ao tentar intimar o servidor sobre a decisão proferida e sobre a retomada dos prazos, bem como em lhe informar de que o prazo de 15 (quinze) dias para apresentação de recurso ser-lhe-ia devolvido e contado a partir da ciência da referida Decisão da Mesa, tomou ciência de que o servidor encontra-se em gozo de férias de 30 dias, que se iniciaram em 1º de julho de 2020.
Indaga esta Procuradoria sobre as implicações legais relativamente ao fato dele se encontrar em gozo de férias.
É o breve relato do necessário. Passa-se a opinar.
Conforme já bem delineado no parecer 47/2020, o prazo para apresentação de recurso pelo servidor em comento seria retomado assim que fosse publicado Ato que retomasse os prazos dos processos administrativos, ou assim que apresentado recurso pelo servidor, o que antes sucedesse. Também foi informado naquela oportunidade que 1 (um) dia do prazo do servidor já havia transcorrido, restando-lhe 14 (quatorze) dias de prazo.
Quando o ato sobre a retomada dos prazos de processos administrativos foi publicado, o servidor não se encontrava em gozo de férias. Ou seja, em 29/06 o seu prazo voltou a correr, já que o ato foi publicado em 27/06/2020, e encontra-se correndo. Em caso semelhante, abaixo transcrito, o Supremo Tribunal Federal já teve oportunidade de se manifestar pela ausência de óbice na fluência de prazo recursal durante as férias do servidor, como deflui da seguinte decisão monocrática, posteriormente confirmada pela 1ª Turma do Tribunal:
“Também defende que o prazo para apresentação de sua defesa somente poderia correr após o término das suas férias, iniciadas em 27/6/2015.
(…)
Ademais, além de ter tido oportunidade de oferecer defesa antes do envio do processo para a Corregedoria do TCU, o próprio Corregedor determinou a abertura de novo prazo para a apresentação de defesa por parte do servidor, que, notificado no dia 26/6/2015, não se manifestou.
Além disso, o Tribunal de Contas informou que as férias do impetrante tiveram início no dia 29/6/2015, ou seja, após ter sido notificado e não tendo comprovado nos autos qualquer tentativa de interposição de recurso contra a decisão proferida na representação.
(…)
O impetrante também sustenta a necessidade de abertura de processo administrativo disciplinar para a exoneração em decorrência de reprovação no estágio probatório. Entretanto, a jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que apenas é necessária a formação de prévio processo administrativo, no qual sejam assegurados ao servidor a ampla defesa e o contraditório, o que se verifica no presente caso. Sobre essa questão, cito o RE 248.292-AgR, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ 2/3/2001:
“EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR EM ESTÁGIO PROBATÓRIO. REPROVAÇÃO. EXONERAÇÃO. LEGITIMIDADE DO ATO. 1. O ato de exoneração de servidor público reprovado no estágio probatório, em resultado apurado em processo administrativo regular, é de caráter meramente declaratório. 2. Ofensa ao artigo 41, § 1º, da Carta Federal. Alegação insubsistente. Relevante é o processamento de sindicância para apuração de falta no prazo bienal. Agravo regimental não provido.”
A exoneração decorre, com efeito, de expressa previsão legal, contida no artigo 20, § 3º, da Lei nº 8.112/1990, verbis:
“§ 2º O servidor não aprovado no estágio probatório será exonerado ou, se estável, reconduzido ao cargo anteriormente ocupado, observado o disposto no parágrafo único do art. 29.”
Por conseguinte, não há que se falar em violação ao princípio da proporcionalidade na exoneração do impetrante, pois além da determinação legal, a aprovação no estágio probatório como condição para a aquisição da estabilidade do servidor possui previsão constitucional (artigo 41, § 4º).” (MS 33744, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Julgamento: 02/02/2016, Publicação: 05/02/2016).
Antes que os prazos fossem retomados, o servidor peticionou solicitando realizar sustentação oral, conforme já mencionado. Referida petição não tem o condão de suspender o prazo de apresentação de recurso e, como se sabe, sustentação oral não guarda relação com apresentação de recurso, mas com explanação de argumentos durante o julgamento. Portanto, o último dia do prazo do servidor seria dia 13/07/2020, segunda-feira.
Apesar de já haver publicação em Diário Oficial indeferindo o pleito formulado e de haver sido publicado o Ato nº 1.475/2020 sobre a retomada automática dos prazos, SGA entende deva ser o servidor intimado e devolvido o prazo de 15 dias para recorrer. Esta seria a melhor conduta, haja vista os princípios do contraditório e ampla defesa, previstos no artigo 5º da Constituição Federal.
Quanto à intimação do servidor em férias, embora não haja previsão em nossa legislação acerca da impossibilidade de intimação ou contagem de prazo durante as férias do servidor, as soluções devem sempre ser pautadas pelos princípios do contraditório e da ampla defesa.
Nesse sentido, dispõe Maria Sylvia Zanella di Pietro:
“Na Lei nº 9.784, os princípios da ampla defesa e do contraditório estão mencionados no artigo 2º, entre os princípios a que se sujeita a Administração Pública.
O princípio da ampla defesa é aplicável em qualquer tipo de processo que envolva situações de litígio ou o poder sancionatário do Estado sobre as pessoas físicas e jurídicas. É o que decorre do artigo 5º, LV da Constituição e está também expresso no artigo 2º, parágrafo único, inciso X, da Lei nº 9.784, que impõe, nos processos administrativos, sejam assegurados os “direitos à comunicação, à apresentação de alegações finais, à produção de provas e à interposição de recursos, nos processos de que possam resultar sanções e nas situações de litígio”.
O princípio do contraditório, que é inerente ao direito de defesa, é decorrente da bilateralidade do processo: quando uma das partes alega alguma coisa, há de ser ouvida também a outra, dando-se-lhe oportunidade de resposta. Ele supõe o conhecimento dos atos processuais pelo acusado e o seu direito de resposta ou de reação. Exige:
- notificação dos atos processuais à parte interessada;
- possibilidade de exame das provas constantes do processo;
- direito de assistir à inquirição de testemunhas;
- direito de apresentar defesa escrita.
Em atendimento aos princípios do contraditório e da ampla defesa, a Lei nº 9.784 assegura ao administrado os direitos de ter ciência da tramitação dos processos administrativos em que tenha a condição de interessado, ter vista dos autos, obter cópias de documentos neles contidos e conhecer as decisões proferidas; formular alegações e apresentar documentos antes da decisão, os quais serão objeto de consideração pelo órgão competente; fazer-se assistir, facultativamente, por advogado, salvo quando obrigatória a representação, por força de lei (art. 3º, incisos II, III e IV). O artigo 46 da lei repete, em termos semelhantes, a mesma norma quanto ao direito à vista do processo e a obter certidões ou cópias reprográficas dos dados e documentos que o integram, ressalvando, porém, os dados e documentos de terceiros protegidos por sigilo ou pelo direito à privacidade, à honra e à imagem.
Além disso, a mesma lei impõe a intimação do interessado nos seguintes casos: para ciência de decisão ou efetivação de diligências (art. 26); para conhecimento de atos do processo que resultem em imposição de deveres, ônus, sanções ou restrição ao exercício de direitos e atividades e para os atos de outra natureza, de seu interesse (art. 28); para a prestação de informações ou a apresentação de provas (art. 39), para apresentar alegações, em caso de interposição de recurso (art. 62). A intimação deve ser feita com antecedência mínima de três dias úteis quanto à data de comparecimento (§ 2º do art. 26) ou para apresentação de prova ou realização de diligência (art. 41), podendo ser efetuada por ciência no processo, por via postal com aviso de recebimento, por telegrama ou outro meio que assegure a certeza da ciência do interessado (§ 3º do art. 26); no caso de interessados indeterminados, desconhecidos ou com domicílio indefinido, a intimação deve ser efetuada por meio de publicação oficial (§ 4º do art. 26).
A inobservância da lei no que diz respeito à intimação é causa de nulidade, porém o comparecimento do administrado supre sua falta ou irregularidade (§ 5º do art. 26). Além disso, o desatendimento da intimação não importa o reconhecimento da verdade dos fatos, nem a renúncia a direito pelo administrado (art. 27).” (in DIREITO ADMINISTRATIVO, 24ª edição, São Paulo: Editora Atlas, 2011, p. 401 e ss.)
Inobstante o caso em concreto não se trate de processo administrativo disciplinar:
“Deve-se observar que a reprovação no estágio probatório não acarreta penalidade para o servidor. mas simplesmente sua exoneração. Vale dizer, considerar o servidor inabilitado no estágio probatório significa tão somente afirmar que ele não possui aptidão para o exercício daquele cargo (tanto é assim que, se ele for estável, pode ser reconduzido ao cargo anteriormente ocupado). O servidor reprovado no estágio probatório não cometeu qualquer infração de natureza grave, caso em que a hipótese seria de demissão.
Não obstante a exoneração de um cargo público, em tese, não revestir caráter punitivo, o Supremo Tribunal Federal, há muito, consagrou o entendimento de que a exoneração do servidor em decorrência de inabilitação em estágio probatório deve observar o devido processo legal, em que lhe sejam previamente assegurados o contraditório e a ampla defesa.” (ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. “Direito Administrativo Descomplicado”. São Paulo: Método, 2017, p. 443)
Portanto, recomendável aguardar o término de suas férias para lhe ser devolvido o prazo para apresentação de recurso. Existe a possibilidade, ainda, de ser enviada correspondência com Aviso de Recebimento a seu endereço já neste momento, utilizando-se por analogia o art. 31 do Ato nº 1.421/2019[1], informando-lhe da retomada do seu prazo de 15 dias para apresentação de recurso em 31 de julho de 2020, ou seja, no primeiro dia útil seguinte a contar do término de suas férias.
Caso o servidor se apresente em virtude da publicação, entendo que SGA poderá elaborar termo, em duas vias (devendo uma delas ser anexada ao processo e outra entregue ao servidor), relatando sobre o seu comparecimento à Câmara e sobre a ciência do prazo para apresentar a defesa.[2] (página 266) – destaque nosso.
Por fim, não entendo recomendável que lhe venha a ser conferido novo período de férias. O Manual de Processo Administrativo Disciplinar da Controladoria-Geral da União, apesar de não ser aplicável à Edilidade Paulistana, traz disposições de ordem geral, das quais podemos nos valer. Vejamos a seguinte:
- A recomendação de que não se conceda férias a servidor que estiver respondendo a processo administrativo disciplinar:
“A comissão também deverá comunicar a notificação prévia ao titular da unidade de lotação do acusado, e também à unidade de Recursos Humanos a qual estiver vinculado, em atendimento ao art. 172 da Lei nº 8.112/90, fato que impossibilitará sua aposentadoria e exoneração voluntárias. Além disso, férias, deslocamentos, remoção, licenças e afastamentos, também podem impactar negativamente no desenvolvimento dos trabalhos apuratórios das comissões, sendo possível, de forma justificada, suspender a fruição ou indeferir os pedidos relacionados a tais benefícios.” (página 118)
É a minha manifestação, que submeto à elevada apreciação de V. Sa.
São Paulo, 08 de julho de 2020.
Érica Corrêa Bartalini de Araújo
Procuradora Legislativa Supervisora – Setor Jurídico-Administrativo
OAB/SP 257.354
[1] Art. 31. Far-se-á citação por correspondência quando o servidor não estiver em exercício, hipótese em que o mandado será encaminhado com aviso de recebimento, para o endereço residencial constante em seu prontuário.
Art. 32. Estando o servidor em local incerto e não sabido, ou não sendo encontrado, por duas vezes, no endereço residencial constante em seu prontuário, será promovida a citação por editais, publicados no Diário Oficial da Cidade de São Paulo durante 3 (três) dias consecutivos, com antecedência mínima de 5 (cinco) dias do ato a ser praticado, contados a partir da última publicação.
[2] Pág. 26 do Manual da CGU