Parecer nº 580/2017
Ref.: TID 15393628
Processo nº 1163/2016
Interessado: XXXXXXXXXXXXXX
Assunto: Corte remuneratório – Ato nº 1339/2016
Dra. Procuradora Legislativa Chefe,
Trata-se de defesa administrativa apresentada por servidor, em razão da aplicação do Ato nº 1339/2016.
Conforme se pode extrair da análise dos autos, o servidor foi notificado da redução de sua remuneração em 12 de julho de 2016, tendo apresentado sua defesa em 22 de julho do mesmo ano. Tempestivamente, portanto.
Alega, em suma, que (i) a incompetência de SGA para decidir sobre a defesa administrativa ofertada; (ii) a necessidade de prévia defesa; (iii) a necessidade de instauração de regular processo administrativo; (iv) a ausência dos demonstrativos de cálculo. Requereu, ao final, a nulidade do Ato da Mesa nº 1339/16, por ausência de defesa prévia, anulando-se, consequentemente, o processo instaurado, determinando-se nova notificação em processo autuado e com numeração própria, com folhas numeradas e rubricadas, devidamente acompanhado de demonstrativo detalhado de cálculo e de fundamentação jurídica.
Em 31 de agosto de 2016, foi determinado às folhas 17, verso, dos autos a discriminação das verbas consideradas pela Câmara Municipal como vantagens pessoais, bem como a apresentação de memória de cálculo dos vencimentos do servidor, a fim de evitar questionamentos futuros e esclarecer como se chegou ao valor que supera o teto remuneratório.
Por fim, em 13 de fevereiro de 2017 (vide folhas 22/23 dos autos), o servidor foi notificado para apresentação de alegações finais em 5 (cinco) dias. Em 20 de fevereiro de 2017, a inventariante e pensionista do servidor apresentou petição expondo suas alegações finais. Não apresentou documentação apta a comprovar sua condição de inventariante. Na oportunidade, alegou:
a) Impossibilidade de se perquirir sobre a ‘correção’ do redutor;
b) Violação ao princípio do contraditório e ampla defesa;
c) Ausência de efeito vinculante para a Administração Pública de repercussão geral;
d) Princípio da segurança jurídica face à jurisprudência consolidada a respeito da matéria “teto constitucional” e a impossibilidade de se aplicar efeitos “ex tunc” à mudança de interpretação;
e) Alteração de remuneração durante período vedado pela legislação eleitoral;
f) Nulidade do Ato 1339/16 por vício formal.
Requereu (i) a nulidade do Ato 1339/16; (ii) a restituição dos valores já descontados sobre os vencimentos do peticionário e a cessação dos descontos levados a efeito, (iii) a absorção paulatina dos valores que superam o teto; (iv) o resguardo de sua decisão judicial, alegando que o exercício do contraditório e ampla defesa se estende até o julgamento de eventual recurso na instância administrativa.
Constam juntados ao processo os documentos de fls. 114 a 124 e 129 a 150 desentranhados do processo nº 1389/2016. Nestes, consta atestado de dependentes fornecido pelo IPREM relacionando como dependente Maria Isabel Cavalca.
Preliminarmente, há que se abordar a questão da sucessão no presente processo, haja vista que o servidor faleceu no curso do processo. Em que pese a notificação para apresentação de alegações finais ter sido expedida em fevereiro deste ano em nome do servidor falecido, mesmo após a Edilidade ter sido noticiada do falecimento do servidor em novembro de 2016, tendo em conta que a dependente habilitada pelo IPREM ofertou petição contendo alegações finais, entendo deva ser tomado como válido o ato de notificação praticado por esta Edilidade.
É o relatório do essencial. Passo a opinar.
I) Da incompetência do Secretário Geral Administrativo
Aduz, em resumo, que o Sr. Secretário Geral Administrativo não possui competência para emitir decisão acerca da defesa administrativa apresentada. Requer, por conseguinte, a remessa do processo à Mesa Diretora, para que sejam tomadas as providências cabíveis.
Em relação ao aspecto suscitado, não se vislumbra interesse por parte do servidor, haja vista que, em momento algum, a Secretaria Geral Administrativa foi investida na competência para rever atos promovidos pela Mesa Diretora.
Com efeito, o fato de a notificação de fls. 15 referir que a “defesa escrita” deveria ser dirigida ao Secretário Geral Administrativo não implica dizer que a referida defesa seria apreciada e julgada por tal autoridade. Tratava-se, em vez disso, de simples orientação destinada a melhor organizar o trâmite processual.
Além disso, o próprio Secretário Geral Administrativo deixou claro, em despacho à fl. 21, que as medidas tomadas no curso do processo, dentre outras finalidades, a de disponibilizar as informações necessárias ao embasamento da decisão da Mesa Diretora que, ao fim e ao cabo, é o órgão competente para o julgamento administrativo.
Despiciendo, assim, mencionar que diversos processos semelhantes ao presente já receberam, inclusive, julgamento de mérito, verificando-se, em tais casos, a atuação do órgão competente para tanto: a Mesa Diretora.
II) Da necessidade de defesa prévia
Por meio da presente defesa, o servidor se insurge, em síntese, contra o Ato da Mesa nº 1339/16, que revogou o artigo 8º do Ato da Mesa nº 1.142/2011, compatibilizando as práticas administrativas desta Câmara Municipal com o entendimento jurisprudencial consagrado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário 60.6358 com Repercussão Geral, tema 257, no qual ficou definido que “computam-se para efeito de observância do teto remuneratório do art. 37, XI, da Constituição da República, também os valores percebidos anteriormente à vigência da Emenda Constitucional nº 41/2003 a título de vantagens pessoais pelo servidor público”.
No presente tópico, o servidor, antes de ingressar no mérito da questão, alega que o referido ato administrativo não poderia produzir efeitos antes da concessão do direito de defesa prévia ao servidor.
No que se refere ao direito ao contraditório e à ampla defesa, o artigo 2º do Ato da Mesa nº 1339/2016 estabelece expressamente que “o servidor será cientificado do eventual corte resultante do disposto no artigo 1º deste Ato, cabendo-lhe o direito de defesa, sem efeito suspensivo dos efeitos daquele artigo, nos termos do artigo 9º do Ato nº 1.142, de 31 de março de 2011”.
Foi conferido, portanto, o direito ao contraditório. Entretanto, a apresentação da defesa administrativa não suspende os efeitos do Ato da Mesa.
A Mesa Diretora, diante do recente posicionamento da mais alta Corte do país a respeito do tema, exposto no acórdão proferido no Recurso Extraordinário 60.635 (com Repercussão Geral, tema 257), o qual foi publicado em 7 de abril de 2016, houve por bem aplicar imediatamente o limite remuneratório, estabelecendo que o exercício do direito de defesa pelo servidor não suspende os efeitos do disposto pelo Ato, garantindo-se, assim, a preservação das finanças públicas.
Ponderou-se que, uma vez pagas, tais quantias não seriam devolvidas pelos servidores ao erário após a apreciação da defesa, pois verbas remuneratórias têm natureza alimentar e, portanto, não são passíveis de restituição.
Daí porque é possível afirmar que, no caso em apreço, o exercício do direito ao contraditório sem o efeito suspensivo atende o interesse público, pois é fundamentado na cautela no trato com as finanças públicas.
Entretanto, é relevante destacar que o Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo conferiu liminares em mandados de segurança a diversos servidores que foram ao Poder Judiciário questionar a ausência de efeito suspensivo da defesa administrativa e consequente ofensa ao princípio do contraditório e da ampla defesa.
No entender do Órgão Especial, o corte remuneratório deveria ser precedido de processo administrativo onde se conferisse oportunidade para o servidor questionar o ato administrativo, nos moldes preconizados pelo art. 5º, LV, da Constituição Federal.
Decidiu o Órgão Especial, no julgamento do mérito do MS nº 2154548-90.2016.8.26.0000, o quanto a seguir exposto:
“Todo ato administrativo que repercuta na esfera individual do administrado, como no caso de redução de proventos de aposentadoria, tem de ser precedido de processo administrativo que assegure a este o contraditório e a ampla defesa (STJ, RMS nº 11.813/PR)”
“O poder-dever de autotutela administrativa, que impõe aos órgãos públicos o controle de seus próprios atos, corrigindo ilegalidades e revogando aqueles inconvenientes ou inoportunos, não é absoluto, devendo ser observadas as garantias do devido processo legal.”
Por outro lado, o Supremo Tribunal Federal, após a Repercussão Geral sobre o tema, ainda não se pronunciou definitivamente sobre a necessidade ou não de contraditório prévio para aplicação do limite de remuneração do servidor público. Com efeito, o STF tem duas decisões divergentes sobre o tema. Em decisão monocrática do Ministro Dias Toffoli, este entende sobre a desnecessidade de contraditório prévio ao corte de vencimentos:
“Começo afastando a alegação de violação à ampla defesa e contraditório, uma vez que esta Corte já reconheceu que deliberações dos Conselhos constitucionais da magistratura e do Ministério Público que não respeitem a condições individuais dos interessados (mas ao contrário, incidam sobre ato ou norma com caráter de generalidade), prescindem da necessidade de notificações dos interessados, uma vez que nenhuma consideração particular afeta a eles afeta deterá potencial para interferir na deliberação a ser adotada, que necessariamente terá efeitos uniformes para todos os interessados. Nesse sentido:
‘Mandado de segurança. Ato do Conselho Nacional de Justiça. Anulação da fixação de férias em 60 dias para servidores de segunda instância da Justiça estadual mineira. Competência constitucional do Conselho para controle de legalidade dos atos administrativos de tribunal local. Ato de caráter geral. Desnecessidade de notificação pessoal. Inexistência de violação do contraditório e da ampla defesa. Férias de sessenta dias. Ausência de previsão legal. 1. Compete ao Conselho Nacional de Justiça “o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário” (§ 4º), “zelando pela observância do art. 37 e apreciando, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Poder Judiciário” (inciso II, § 4º, art. 103-B). 2. No caso, a deliberação do CNJ se pautou essencialmente na ilegalidade do ato do Tribunal local (por dissonância entre os 60 dias de férias e o Estatuto dos Servidores do Estado de Minas Gerais). Quanto à fundamentação adicional de inconstitucionalidade, o Supremo tem admitido sua utilização pelo Conselho quando a matéria já se encontra pacificada na Corte, como é o caso das férias coletivas. 3. Sendo o ato administrativo controlado de caráter normativo geral, resta afastada a necessidade de notificação, pelo CNJ, dos servidores interessados no processo. 4. A conclusão do Supremo Tribunal pela inconstitucionalidade, a partir da Emenda Constitucional nº 45/04, das férias coletivas nos tribunais, se aplica aos servidores do TJMG, cujo direito às férias de 60 dias se estabeleceu em normativos fundamentados nas férias forenses coletivas. 5. Ordem denegada. (MS 26739/DF, Relator o Min. Dias Toffoli, Segunda Turma, DJe de 14/6/16)’
Quanto ao mérito propriamente dito, é de se observar que a deliberação combatida encontra-se de acordo com a Jurisprudência desta Corte, reafirmada em sede de recursos extraordinários com repercussão geral reconhecida. É que o Plenário deste Supremo Tribunal, ao concluir o julgamento do RE n.º 606.358/SP, paradigma do Tema n.º 257 – Inclusão das vantagens pessoais no teto remuneratório estadual após a Emenda Constitucional n.º 41/2003 –, da Gestão por Temas da Repercussão Geral, decidiu no sentido de que a exclusão, para efeito de cálculo do teto remuneratório, de valores correspondentes a vantagens de caráter pessoal, ainda que percebidos antes do advento da EC n.º 41/2003, representa ofensa direta ao artigo 37, incisos XI e XV, da Constituição Federal, e que o corte dos valores que perpassam o limite constitucional não implica violação a princípios constitucionais, em especial ao da garantia da irredutibilidade de vencimentos.” (MS 27019/MA – Relator: Min. Dias Toffoli – 29/09/2016)
Diametralmente oposta, a Primeira Turma do STF, em caso semelhante, entendeu sobre a necessidade de contraditório prévio ao corte nos vencimentos, conforme se verifica a seguir:
“O embargante volta a insistir na falta de análise do tema sob o ângulo dos artigos 37 da Constituição Federal e 17 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Diz da omissão quanto à alegação de inexistência de direito adquirido à forma de remuneração e ao dever da Administração em corrigir eventuais excessos, reduzindo, de ofício, os valores que estejam sendo pagos, sem necessidade de autorização do servidor.
Vejam o contido no acórdão prolatado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas:
“O presente mandamus versa sobre supressão de parcelas dos vencimentos de servidor público estável, em virtude da adequação à regra constitucional do teto remuneratório.
É verdade que a regra do art. 37, inc. XI, da Constituição Republicana vincula todas as esferas do Governo, devendo ser observada no âmbito da administração pública direta e indireta.
Entretanto, se a Administração vem pagando ao servidor parcela salarial decorrente de prêmio anual de produtividade que integrava os vencimentos, não pode suprimi-la em virtude de mudança de interpretação a respeito da aplicação da regra de limite remuneratório, sem possibilitar ao servidor o contraditório e a ampla defesa.”
Às folhas 234 e 235, neguei seguimento ao extraordinário, mencionando expressamente os dispositivos acima citados. Ou seja, não se discute a possibilidade de a Administração rever a remuneração do servidor, muito menos afirmou-se a existência de direito adquirido ao valor que vem sendo pago. Apenas tem-se como pressuposto, conforme anteriormente salientado, o direito do servidor ao contraditório e à ampla defesa, considerada a redução nos vencimentos que se pretende realizar. Essa premissa é inafastável e decorre da orientação adotada pelo Supremo no julgamento de mérito do recurso extraordinário nº 594.296/MG, com repercussão geral reconhecida.” (RE 586311ED-AGR-ED/AM, 23/08/2016, Primeira Turma)
Há que se ressaltar que recentemente, mais especificamente em 06 de junho de 2017, houve decisão proferida pelo Ministro Luís Roberto Barroso em recurso extraordinário interposto pela Edilidade Paulistana em face de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo sobre o tema versado nestes autos. No caso em apreço, o Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu a segurança aos impetrantes tendo em vista a ausência de prévia oportunidade para apresentação de defesa frente ao corte remuneratório perpetrado nos vencimentos dos servidores. A Câmara Municipal recorreu da decisão, sustentando não ser necessária a realização do prévio contraditório e ampla defesa para a adequação da remuneração dos servidores ao teto constitucional, uma vez que o art. 37, XI, encerra norma de aplicação imediata. O Ministro Relator deu provimento ao recurso, por entender que a decisão proferida pelo Tribunal de origem não está alinhada com a orientação daquela Corte. Esta decisão pende de julgamento de recurso.
Assim sendo, por não existir posição consolidada pelo Supremo Tribunal Federal acerca da necessidade de contraditório prévio ao corte de vencimentos, e tendo em vista a recente decisão acima relatada, não há que se falar em ilegalidade da conduta perpetrada pela Administração quando da aplicação do abate-teto antes do contraditório.
De qualquer forma, no caso específico sob análise, entendo que a presente questão encontra-se superada, já que, conforme informações prestadas pelo Setor Judicial desta Procuradoria, o servidor impetrou mandado de segurança e teve liminar parcialmente deferida “apenas para determinar a suspensão dos descontos referentes ao Ato da Mesa nº 1339/16 dos vencimentos dos impetrantes”.
A Procuradoria se manifestou, em 08/12/2016, no sentido de que não se adotasse qualquer providência para cumprimento da liminar, haja vista o falecimento do servidor, tendo em conta o caráter personalíssimo do mandamus. A Secretaria Geral Administrativa, entretanto, determinou o cumprimento da liminar, cessando-se os descontos sobre eventuais verbas rescisórias e pensão a ser recebida pelos dependentes do servidor.
No mérito, a segurança foi concedida apenas para oportunizar ao servidor a apresentação de defesa em regular processo administrativo, antes de se proceder ao corte em seus vencimentos. No caso específico do servidor, tendo em vista que faleceu no curso do processo judicial, entendeu o Judiciário que o writ serviria para que os herdeiros do servidor buscassem os meios legais para seu recebimento.
Assim sendo, obteve judicialmente a oportunidade de litigar durante quase todo o processo administrativo sem que incidisse corte remuneratório sobre os seus vencimentos e pensão devida a seus dependentes, não tendo ocorrido efetivo prejuízo ao administrado durante a maior parte do processo administrativo.
III) Da necessidade de instauração de processo administrativo regular
Alega, em síntese, que não foi aberto processo administrativo regular para a promoção de medida que restringiu direito do servidor, sendo que os atos materiais teriam sido praticados por meio de simples procedimento informal, o que não garantiria a necessária higidez do processo.
Em primeiro lugar, deve-se ter em mente que, nada obstante a desconfiança exposta pelo servidor, os atos administrativos praticados até aqui são presumivelmente válidos, inexistindo dispositivo legal que imponha a necessidade de autenticação das cópias com a finalidade de conferir tal presunção.
Com efeito, conforme a autorizada doutrina, trata-se de uma quádrupla presunção, de veracidade, de legalidade, de legitimidade e de licitude. Logo, até o momento nada há que se oponha à presunção conferida aos atos comunicados ao servidor por meio das cópias enviadas. Tudo, sem prejuízo de eventual prova em sentido contrário. (MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo, Curso de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 2001, fl. 138).
De se destacar, ademais, que nada obstante tratar-se de presunção relativa, o servidor não chegou sequer a apontar indício de falsidade documental, do que se conclui que a presunção incidente sobre os atos praticados no bojo do presente processo administrativo não deve mesmo ser afastada. Parece-nos, pois, infundada a desconfiança expressa.
Ressalte-se, ainda, que as objeções acerca da real existência do processo administrativo devem ser analisados sob o mesmo prisma, já que as presunções de veracidade, legalidade, legitimidade e licitude decorrem da sua própria natureza. Além disso, é certo que a relação jurídico-processual teve início com a primeira notificação, não há que se confundir processo com autos do processo. Os autos do processo administrativo materializam e instrumentalizam relação jurídica bilateral já existente.
IV) Da ausência dos demonstrativos de cálculo
Não prosperam também as objeções calcadas na ausência de motivação detalhada acerca da discriminação das verbas abrangidas pelo Ato da Mesa nº 1339/2016.
Em relação a este ponto, observamos que o ato em questão foi fartamente motivado, de maneira a deixar claro que Mesa da Câmara Municipal de São Paulo tinha o intuito de alinhar as práticas administrativas da Casa com o entendimento jurisprudencial consagrado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário 60.6358 com Repercussão Geral, tema 257, no qual ficou definido que “computam-se para efeito de observância do teto remuneratório do art. 37, XI, da Constituição da República, também os valores percebidos anteriormente à vigência da Emenda Constitucional nº 41/2003 a título de vantagens pessoais pelo servidor público”.
À luz desse entendimento, o ato contra o qual se insurge o servidor limitou-se a revogar o artigo 8º do Ato da Mesa nº 1.142, de 31 de março de 2011. Nada mais coerente com o propósito adotado pela Mesa, já que o referido artigo 8º dispunha que “Para os servidores que ingressaram no serviço público municipal até dezembro de 2003, fica assegurada a percepção dos valores correspondentes às vantagens de ordem pessoal integradas à respectiva remuneração até a data de publicação da Emenda à Lei Orgânica nº 32/2009, na forma da lei ou de decisão judicial transitada em julgado, hipótese em que o correspondente excesso do limite remuneratório será absorvido, paulatinamente, nas alterações subsequentes do teto.”.
Logo, não se vislumbra, novamente, nenhuma razão para inconformismo. Os valores que, por força do Ato da Mesa nº 1339/2016 passaram a ser considerados para efeito de aplicação do artigo 37, XI da Constituição da República são aqueles descritos no dispositivo normativo supramencionado, por força da revogação operada. Para facilitar a identificação, a Administração ainda teve a prudência de elaborar demonstrativos didáticos às fl.20.
Quanto às demais exceções previstas no artigo 6º do Ato da Mesa 1142/11, nada foi alterado, inexistindo dúvida quanto às verbas que compõem a remuneração a ser considerada para efeito de aplicação do teto remuneratório. Trata-se, inclusive, do regramento que balizou a elaboração dos demonstrativos referidos supra.
V) Da impossibilidade de se perquirir sobre a ‘correção’ do redutor
Alega o servidor que a notificação em questão se limitou a apontar que as verbas relativas ao Código 149 foram deduzidas de forma proporcional à data da edição do Ato nº 1339/16 e que não se indicou, de forma específica, o efetivo valor de tal redução, haja vista que apenas se instruiu referida notificação com cópia do comprovante de pagamento do mês de junho/2016.
Entendo não prosperar a alegação do servidor. Isto porque a carta de notificação é clara em informar que “no mês de junho/2016 constaram de sua remuneração verbas pessoais incorporadas até dezembro de 2003 (ATS – Código 149), que excederam o limite remuneratório constitucional e que foram reduzidas a esse limite”. O holerite juntado à carta é claro em demonstrar quais verbas foram retidas a título de abate-teto.
Dessa forma, entendo que não há qualquer tipo de correção a ser efetuada na Carta de Notificação.
VI) Princípio da segurança jurídica face à jurisprudência consolidada a respeito da matéria “teto constitucional” e a impossibilidade de se aplicar efeitos “ex tunc” à mudança de interpretação: da manutenção da expressão nominal dos vencimentos
O servidor apresenta pedido subsidiário para que ao menos seja preservado o valor nominal dos seus vencimentos, até que seja absorvido pelo teto remuneratório.
Em suas alegações finais, sustenta a necessidade de preservar a segurança jurídica, afirmando que a jurisprudência antiga do Supremo Tribunal Federal era no sentido de não incluir as vantagens pessoais anteriores à Emenda Constitucional 41/2003 no cálculo do teto remuneratório. Cita o voto divergente do Ministro Marco Aurélio no julgamento do Recurso Extraordinário nº 606.358. Conclui requerendo o congelamento da expressão nominal dos vencimentos, até que, paulatinamente, o excesso seja absorvido pelo teto que corresponde ao subsídio mensal legalmente fixado para o cardo de Prefeito.
Neste ponto, importante esclarecer o quanto segue:
Durante a vigência da interpretação anterior dada pelo Supremo Tribunal Federal, vigorava o entendimento de que, para os servidores que ingressaram no serviço público municipal até dezembro de 2003, ficava assegurada a percepção dos valores correspondentes às vantagens de ordem pessoal integradas à respectiva remuneração até a data de publicação da Emenda, hipótese em que o correspondente excesso do limite remuneratório seria absorvido, paulatinamente, nas alterações subsequentes do teto.
No âmbito da Edilidade, regulamentou-se a matéria por meio do art. 8º do Ato 1142/2012. Na redação original, entendeu-se que para os servidores que ingressaram no serviço público municipal até dezembro de 2003, ficaria assegurada a percepção dos valores correspondentes às vantagens de ordem pessoal integradas à respectiva remuneração até a data de publicação da Emenda à Lei Orgânica nº 32/2009, na forma da lei ou de decisão judicial transitada em julgado, hipótese em que o correspondente excesso do limite remuneratório seria absorvido, paulatinamente, nas alterações subsequentes do teto.
Com a edição do Ato 1228/13, alterou-se a sistemática, passando-se a entender que aos servidores que ingressaram no serviço público até dezembro de 2003 ficaria assegurada a percepção das vantagens de ordem pessoal integradas à respectiva remuneração até aquela data, na forma da lei ou de decisão judicial transitada em julgado, hipótese em que o correspondente excesso do limite remuneratório seria absorvido, paulatinamente, nas alterações subsequentes do teto.
Com a recente mudança de orientação jurisprudencial, entendeu o Supremo Tribunal Federal, por meio de sua Repercussão Geral, que inclusive referidas vantagens já em dezembro de 2003 deveriam se submeter ao teto remuneratório.
Daí porque o Ato 1339/16 revogou o artigo 8º do Ato 1142/2012, por entender que a sistemática anterior não estava mais em sintonia com o entendimento da mais alta Corte do país.
Importa mencionar que o Ato 1339/16 não desconstituiu a situação existente antes de sua edição, produzindo efeitos a partir de sua publicação e não para o passado.
Vale consignar a diferença entre efeitos retroativos e retrospectivos:
Destarte, são duas as características marcantes do fenômeno da retrospectividade: a primeira consiste na circunstância de que os eventos focados pelo pressuposto da norma legal retrospectiva, veiculada pela lei nova, foram produzidos antes de sua entrada em vigor; a segunda é a de que a incidência dessa norma legal não provoca uma reconfiguração dos efeitos jurídicos transcorridos sob o império da lei antiga.
A primeira nota mostra a especificidade dos efeitos retrospectivos em face dos efeitos imediatos e prospectivos, a despeito dos pontos em comum que permitem situá-los nessa categoria mais ampla. Ou seja, existe situação de pendência (eficacial e não fática) e, enquanto desdobramento no presente das consequências jurídicas de fato ocorrido no passado, existem aspectos fáticos desenvolvidos ao longo do período de vigência da lei nova; mas, ao contrário do que sucede nas hipóteses comuns de eficácia imediata e prospectiva, o fato-base dos efeitos jurídicos se realiza inteiramente no passado, isto é, durante a vigência da lei revogada.
Já a segunda nota serve para que se faça uma distinção nítida entre os fenômenos da retroatividade e da retrospectividade:
“Duas aplicações realmente distintas da lei nova podem ser vislumbradas. Uma delas repousa sobre a ideia da preexistência da lei nova e obriga os sujeitos de direito a reexaminar seus atos passados para deles extrair outras consequências jurídicas; a outra não repousa sobre essa ideia e corresponde à noção de retrospectividade, tal qual a definem os autores que a ela recorrem: a lei nova se contenta em influir para o futuro sobre situações jurídicas constituídas no passado, mas que se prolongam prospectivamente” (RAMOS, Elival da Silva. A proteção aos direitos adquiridos no Direito Constitucional Brasileiro, São Paulo: Saraiva, 2003, p. 38/39)
Tal diferenciação faz-se importante a fim de que se possa concluir que a Emenda Constitucional n. 41/2003 não aboliu direitos e garantias individuais e tampouco retroagiu para atingir tais direitos. Em verdade, apenas irradiou efeitos retrospectivos, aplicando-se a fatos pendentes, isto é, atingindo os efeitos prospectivos (para o futuro) de direitos conquistados sob a égide do regramento constitucional anterior.
E tal efeito é plenamente permitido pelo ordenamento constitucional brasileiro, haja vista que, segundo maciça Doutrina, a cláusula de proteção disposta no artigo 5º, XXXVI, da Carta Magna aplica-se, exclusivamente, ao Legislador infraconstitucional.
Sobre o assunto, dissertou o I. Professor Elival da Silva Ramos:
Nesse sentido pronunciou-se Hugo de Brito Machado do qual extraímos o seguinte excerto:
“Nada, entretanto, impede que o próprio constituinte, ao fazer a Constituição, ou ao emendá-la, determine expressamente que o preceito novo aplica-se a projeções de fatos anteriores, pois a limitação residente no princípio da irretroatividade, mesmo inscrito na Constituição, a ele não se dirige. Nem seria válido o argumento segundo o qual a garantia do direito adquirido constitui um direito fundamental, inatingível por emendas à Constituição, por força de seu art. 60, §4º, IV. Essa garantia constitucional é uma limitação de poderes do legislador ordinário. O legislador dotado de poder constituinte, mesmo que apenas reformador, de uma norma retroativa, tende a abolir a garantia da irretroatividade das leis”.
Antes mesmo do citado articulista, Carmen Lúcia Antunes Rocha, preocupada embora com o direito adquirido em face do Constituinte originário, já houvera disseminado essa intelecção da cláusula constitucional, ao escrever que “o preceito contido no artigo5º, XXXVI, da Constituição da República é direito fundamental do indivíduo, oponível ao legislador infraconstitucional”.
Bem mais explícito e enfático a respeito é o posicionamento de Martins Cardozo:
“Realmente, por força da regra inserida no art. 60, §4º, IV, da nossa atual Constituição, a regra de que ‘ a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada’ não pode ser objeto de futuras alterações. Contudo, não se deve in casu perder a real dimensão daquilo que efetivamente, por força do preceito em apreço, não pode ser juridicamente alterado por força de uma modificação constitucional futura. O que não pode ser modificado é o direito individual que todos possuem de não ter por lei nova, isto é, por norma jurídica introduzida pelo legislador infraconstitucional, a realização de ofensas a seus direitos adquiridos, ou a outros direitos subjetivos gerados por atos jurídicos perfeitos ou por uma decisão judicial imodificável. A norma do art. 5º, XXXVI, não está voltada ao legislador constitucional. Este poderá continuar por via de novos dispositivos a estabelecer exceções à regra geral”.
E, mais adiante, arremata o citado autor:
“Em síntese: o que veda a nossa lei maior é que futuras emendas constitucionais venham a estabelecer a possibilidade de que tenha a nossa legislação infraconstitucional poderes para prejudicar direitos adquiridos, atos jurídicos perfeitos e a coisa julgada. Não proíbe, ao revés, nenhuma perspectiva, que o próprio legislador constitucional, por via de emendas, tenha tais prerrogativas”.
Também Celso Bastos não aceita que, por força do disposto no inciso XXXVI do art. 5º da Constituição, possam os direitos adquiridos impedir a projeção de efeitos retroativos ou retrospectivos por parte de emendas constitucionais. Retomou, no entanto, a doutrina de Caio Mário da Silva Pereira e Carlos Velloso, ao preconizar que dessa disposição se deve extrair um condicionamento à eficácia imediata retrospectiva dos atos do Poder Constituinte de revisão, de modo a lhe exigir explícita manifestação para o sacrifício de direitos adquiridos(…) (sem destaques no original – Op.cit., p. 236/238)
Como se vê, encontra grande amparo na Doutrina a ideia de que a garantia da proteção ao direito adquirido volta-se apenas ao legislador infraconstitucional, sendo certo que o artigo 17 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, no que tange à observância do limite remuneratório constitucional previsto no artigo 37, inciso XI, cuida de, expressamente, excluir a possibilidade de “invocação de direito adquirido ou percepção de excesso a qualquer título”.
Desta feita, ao adotar o entendimento esposado em decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal em sede de repercussão geral de modo a nortear a aplicação do teto remuneratório no âmbito de aplicação da Edilidade, não conferiu a Mesa efeito retroativo à referida decisão, visto que não desconstituiu as situações já consolidadas. A Mesa apenas projetou seus efeitos em relação ao futuro, ou seja, em relação aos pagamentos que ainda virá a efetuar relativamente aos vencimentos dos servidores, aplicando-se a nova sistemática daqui para frente, de modo a não rever os pagamentos que já foram feitos anteriormente, não ofendendo, por conseguinte, a segurança jurídica.
Por outro lado, cumpre dizer que a forma de corte remuneratório pretendida pelo servidor, na qual o excesso do limite remuneratório é absorvido paulatinamente nas alterações subsequentes do teto (conforme previa o ora revogado art. 8º do Ato 1142/11), foi analisada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, concluindo-se pela regularidade da forma de aplicação do teto, redundando no arquivamento, devidamente homologados pelo I. Conselho Superior, em outubro de 2015 (PJPP – CAP 686/2012 – sobre a CMSP).
Todavia, com a mudança de posicionamento do Supremo Tribunal Federal em novembro de 2015 e publicação do acórdão em abril de 2016, expressamente determinado a inclusão de todas as vantagens de ordem pessoal, inclusive as anteriores a 2003, no limite constitucional de remuneração, a Mesa Diretora houve por bem adequar-se à nova decisão, editando o Ato 1339/16, que está em sintonia com a mais recente jurisprudência.
Em relação à necessidade de se assegurar a irredutibilidade de vencimentos, o Supremo Tribunal Federal já manifestou seu posicionamento sobre o tema, estabelecendo que a garantia da irredutibilidade não se aplica às hipóteses em que se pretende sustentar recebimento de vencimentos acima do limite constitucional. Confira-se:
EMENTA : CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. TETO DE RETRIBUIÇÃO. EMENDA CONSTITUCIONAL 41/03. EFICÁCIA IMEDIATA DOS LIMITES MÁXIMOS NELA FIXADOS. EXCESSOS. PERCEPÇÃO NÃO RESPALDADA PELA GARANTIA DA IRREDUTIBILIDADE. 1. O teto de retribuição estabelecido pela Emenda Constitucional 41/03 possui eficácia imediata, submetendo às referências de valor máximo nele discriminadas todas as verbas de natureza remuneratória percebidas pelos servidores públicos da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, ainda que adquiridas de acordo com regime legal anterior. 2. A observância da norma de teto de retribuição representa verdadeira condição de legitimidade para o pagamento das remunerações no serviço público. Os valores que ultrapassam os limites pré-estabelecidos para cada nível federativo na Constituição Federal constituem excesso cujo pagamento não pode ser reclamado com amparo na garantia da irredutibilidade de vencimentos. 3. A incidência da garantia constitucional da irredutibilidade exige a presença cumulativa de pelo menos dois requisitos: (a) que o padrão remuneratório nominal tenha sido obtido conforme o direito, e não de maneira ilícita, ainda que por equívoco da Administração Pública; e (b) que o padrão remuneratório nominal esteja compreendido dentro do limite máximo pré-definido pela Constituição Federal. O pagamento de remunerações superiores aos tetos de retribuição de cada um dos níveis federativos traduz exemplo de violação qualificada do texto constitucional. 4. Recurso extraordinário provido. (destacamos; Recurso Extraordinário 609381, j. 02-10-2014).
Em outras palavras, não se pode alegar o princípio da irredutibilidade dos vencimentos como justificativa para não aplicação do art. 37, XI, da Constituição Federal.
VII) Da ausência de efeito vinculante para a Administração Pública em decisão judicial com repercussão geral
Com relação à inexistência de efeito vinculante das decisões proferidas em sede de repercussão geral, de fato, salvo no caso de “os recursos versarem sobre questão relativa a prestação de serviço público objeto de concessão, permissão ou autorização, o resultado do julgamento será comunicado ao órgão, ao ente ou à agência reguladora competente para fiscalização da efetiva aplicação, por parte dos entes sujeitos a regulação, da tese adotada”, não há vinculação do quanto decidido para os atos praticados pela Administração Pública.
O entendimento fixado na Repercussão Geral n. 257 produz os efeitos previstos nos artigos 1.035 e seguintes do Código de Processo Civil. Quanto aos efeitos da decisão do tema de Repercussão Geral, assim dispõe o artigo 1.040 do mesmo Diploma:
Publicado o acórdão paradigma:
I – o presidente ou o vice-presidente do tribunal de origem negará seguimento aos recursos especiais ou extraordinários sobrestados na origem, se o acórdão recorrido coincidir com a orientação do tribunal superior;
II – o órgão que proferiu o acórdão recorrido, na origem, reexaminará o processo de competência originária, a remessa necessária ou o recurso anteriormente julgado, se o acórdão recorrido contrariar a orientação do tribunal superior;
III – os processos suspensos em primeiro e segundo graus de jurisdição retomarão o curso para julgamento e aplicação da tese firmada pelo tribunal superior;
IV – se os recursos versarem sobre questão relativa a prestação de serviço público objeto de concessão, permissão ou autorização, o resultado do julgamento será comunicado ao órgão, ao ente ou à agência reguladora competente para fiscalização da efetiva aplicação, por parte dos entes sujeitos a regulação, da tese adotada.
Assim, em regra, a decisão da tese de Repercussão Geral irradia efeitos apenas no âmbito jurisdicional, afetando processos judiciais versantes sobre a mesma tese, que estejam em tramitação ou venham a ser propostos. Como exceção, nos termos do inciso IV do artigo supracitado, estão apenas os casos que envolvem questão relativa a prestação de serviço público objeto de concessão, permissão ou autorização, hipóteses em que o resultado do julgamento será comunicado ao órgão, ao ente ou à agência reguladora competente para fiscalização da efetiva aplicação da tese adotada, por parte dos entes sujeitos a regulação.
Desta feita, a publicação da tese da Repercussão Geral n. 257 passa a produzir efeitos sobre os processos em trâmite ou que venham a ser ajuizados que discutirem a mesma temática nela delimitada.
Significa dizer que a simples publicação da tese da Repercussão Geral n. 257 não tem o condão automático de invalidar normas, atos administrativos, situações concretas já consolidadas ou coisas julgadas. Entretanto, não se pode ignorar que a referida tese de Repercussão Geral produzirá efeitos diretos sobre futuras demandas que eventualmente possam surgir questionando normas, atos administrativos, situações fáticas e, até mesmo, coisas julgadas, neste caso as passíveis de anulação ou rescisão judicial.
Destarte, embora inexistente efeito vinculante na tese consolidada na Repercussão Geral n. 257 do E. STF, é certo que tal precedente, assim como os anteriores que outrora deram embasamento às normas ora vigentes sobre o tema, podem servir de orientação para nova interpretação da Lei pelo administrador público.
Assim, optou o administrador público, in casu, por se adequar ao novo e consolidado entendimento da Corte que detém a última palavra sobre a matéria constitucional, a fim de melhor gerir os recursos públicos e evitar a ocorrência de eventuais demandas que viessem a questionar suas normas por discreparem da interpretação pacificada do teor do artigo 37, inciso XI, da Constituição Federal.
O que ocorreu foi sua consideração enquanto precedente jurisprudencial vinculante no âmbito judicial. Há que se observar que nos “considerandos” do Ato n. 1339/16 não há qualquer menção à existência de eventual efeito vinculante da Repercussão Geral n. 257 no âmbito administrativo, não havendo que se falar, portanto, em vício de motivação.
Ademais, passando a interpretação firmada na Repercussão Geral n. 257 a ser diretamente aplicada aos casos sub judice de alguns de seus servidores, não poderia a Câmara Municipal de São Paulo permitir que tratamento diverso pudesse ser dado aos demais, sob pena de violação ao princípio da isonomia.
Contudo, em que pese a existência da Repercussão Geral 257, que vincula o Judiciário a decidir as demandas a ele apresentadas nos termos da decisão proferida, há que se mencionar, para conhecimento desta Egrégia Mesa Diretora, a existência de decisões judicias proferidas após a Repercussão Geral em sentido contrário ao nela decidido. Há que se ressaltar que referidas decisões foram proferias por Câmaras de Direito Público, e não pelo Órgão Especial do E. Tribunal de Justiça, órgão máximo daquele Tribunal, sendo que este, ao analisar o mérito de mandado de segurança interposto por outros servidores desta Casa sobre o mesmo tema, já manifestou entendimento sobre o Ato 1339/16, esclarecendo que ele está em sintonia com o posicionamento do Supremo Tribunal Federal:
Vale dizer, a Mesa Diretora da Câmara Municipal de São Paulo apenas agiu com observância ao comando normativo do acórdão proferido no julgamento do RE nº 606.358/SP, objeto de repercussão geral, não se revestindo o ato impugnado, nessa parte, de nenhuma ilegalidade ou abuso de poder, afigurando-se despropositado rediscutir aqui a posição perfilhada pelo E. Supremo Tribunal Federal, sobretudo à luz do disposto no artigo 927, inciso III, do Novo Código de Processo Civil, que impõe aos Juízes e Tribunais observância aos pronunciamentos do Pretório Excelso.
…
Merece prosperar, portanto, o inconformismo dos impetrantes, permanecendo suspensos os descontos relativos ao Ato da Mesa no 1.339/16, até julgamento final na via administrativa, restituindo-se os valores reclamados, ressalvando-se, porém, à Câmara Municipal adequar os proventos ou vencimentos dos impetrantes ao teto remuneratório após conclusão do correspondente processo administrativo. (MANDADO DE SEGURANÇA Nº 2163002-59.2016.8.26.0000, Relator Desembargador Renato Sartorelli, j. 09/02/2017).
Em suma, o Tribunal Paulista entendeu que deveria ter sido dada a oportunidade de defesa prévia à aplicação do Ato 1339/16, sendo que no mérito não há ilegalidade ou abuso de poder em sua aplicação.
VIII) Da alteração de remuneração durante período vedado pela legislação eleitoral;
Alega o servidor que a Edilidade havia ultrapassado o período limite para alteração da remuneração, nos termos do art.73, inciso III, da Lei 9.504/97. Contudo, entendo que onde o servidor disse inciso III, ele quis dizer inciso VIII. O inciso em questão dispõe, ipsis literis:
Art. 73.
…
VIII – fazer, na circunscrição do pleito, revisão geral da remuneração dos servidores públicos que exceda a recomposição da perda de seu poder aquisitivo ao longo do ano da eleição, a partir do início do prazo estabelecido no art. 7º desta Lei e até a posse dos eleitos.
Da simples leitura do inciso, depreende-se que não é possível fazer revisão geral da remuneração dos servidores, o que não foi o caso operado pela edição do Ato 1339/16. O ato em questão apenas revogou dispositivo do Ato 1142/12 que previa que ficava assegurada a percepção dos valores correspondentes às vantagens de ordem pessoal integradas à respectiva remuneração até dezembro de 2003, hipótese em que o correspondente excesso do limite remuneratório seria absorvido, paulatinamente, nas alterações subsequentes do teto. Dessa maneira, não se operou revisão geral da remuneração dos servidores, tendo sido apenas aplicado comando constitucional.
IX) Conclusão
Ante todo o exposto, lamentavelmente, a meu ver, não há ilegalidade no Ato 1339/16.
De qualquer forma, no caso específico sob análise, entendo que a presente questão encontra-se superada, já que, conforme informações prestadas pelo Setor Judicial desta Procuradoria, o servidor impetrou mandado de segurança e teve liminar parcialmente deferida “apenas para determinar a suspensão dos descontos referentes ao Ato da Mesa nº 1339/16 dos vencimentos dos impetrantes”. A Procuradoria se manifestou, em 08/12/2016, no sentido de que não se adotasse qualquer providência para cumprimento da liminar, haja vista o falecimento do servidor, tendo em conta o caráter personalíssimo do mandamus. A Secretaria Geral Administrativa, entretanto, determinou o cumprimento da liminar, cessando-se os descontos sobre eventuais verbas rescisórias e pensão a ser recebida pelos dependentes do servidor.
No mérito, a segurança foi concedida apenas para oportunizar ao servidor a apresentação de defesa em regular processo administrativo, antes de se proceder ao corte em seus vencimentos. No caso específico do servidor, tendo em vista que faleceu no curso do processo judicial, entendeu o Judiciário que o writ serviria para que os herdeiros do servidor buscassem os meios legais para seu recebimento.
Diante da apresentação de defesa pelo servidor e de alegações finais por sua dependente, bem como da apreciação de todas as alegações tecidas, entendo que o contraditório e a ampla defesa foram observados.
Desta forma, tendo em vista que eventual recurso no bojo deste processo administrativo não possuirá efeito suspensivo (art. 36, §1º, da Lei Municipal nº 14.141/2006 e art. 176, § 1º da Lei 8989/79), com a publicação da decisão do presente processo administrativo no Diário Oficial, conforme previsto no artigo 25 da Lei Municipal nº 14.141/2006, restará cumprida a condição suspensiva imposta pelo Poder Judiciário, sendo possível a aplicação do Ato nº 1339/16.
É a minha manifestação, que submeto ao juízo de Vossa Senhoria.
São Paulo, 29 de junho de 2017
Érica Corrêa Bartalini de Araujo
Procuradora Legislativa Supervisora – Setor Jurídico-Administrativo
OAB/SP 257.354