Parecer n° 216/2019

Parecer SCL nº 216/2019
Memo. SGA nº 063/2019
TID 18557652
Assunto: Outorga de uso de espaço da CMSP para instalação e exploração de restaurante por parte de terceiros

Sr. Procurador Legislativo Supervisor:

O Sr. Secretário Geral Administrativo encaminha o presente expediente para que “sejam feitos os estudos necessários acerca dos aspectos jurídicos para a outorga de uso de espaço da Câmara Municipal de São Paulo com a finalidade de instalação e exploração de restaurante por parte de terceiro, seja de forma onerosa ou através de prestação de contrapartidas e, em caso positivo, orientação do(s) formato(s) para seleção do terceiro, por exemplo, por meio de pregão ou chamamento de modo a garantir isonomia entre todos os potenciais interessados”.

Em primeiro lugar, é importante analisarmos a legislação que rege o tema.

A Lei Orgânica do Município estabelece no art. 111:

“111. Cabe ao Prefeito a administração dos bens municipais, respeitada a competência da Câmara Municipal quanto àqueles utilizados em seus serviços”.

O art. 1°, § 3º, do Regimento Interno desta Câmara Municipal estabelece:

“Art. 1º […]
[…]
§ 3º – Na sede da Câmara não se realizarão atos estranhos à sua função, sem prévia autorização da Mesa”.

O art. 99 do Código Civil dispõe:
“Art. 99. São bens públicos:
I – os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças;
II – os de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias;
III – os dominicais, que constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de direito pessoal, ou real, de cada uma dessas entidades.”
Com efeito, a sede da Câmara constitui bem público de uso especial, ou seja, é um bem público destinado para o exercício de suas funções institucionais.

O Ato nº 1119/2010 regulamenta a cessão e utilização das salas, auditórios e hall do térreo do Palácio Anchieta e dá outras providências, não havendo previsão de utilização com fins comerciais.
O único Ato que regulamenta a autorização de uso de espaços da Câmara Municipal de São Paulo com fins comerciais é o Ato nº 1182/12, alterado pelo Ato nº 1298/15 para realização de filmagem e fotografia.

Portanto, preliminarmente, conclui-se que para a autorização de uso de espaços desta Casa Legislativa com a finalidade de instalação e exploração de restaurante ou similar por parte de terceiro, é necessária a edição de Ato específico da Mesa Diretora.

Não obstante, passamos à análise quanto à onerosidade ou gratuidade da cessão de uso.

A Lei Municipal nº 14.652/07 dispõe sobre as concessões e permissões de uso de áreas municipais, estabelecendo a seguinte regra geral:

“Art. 1º As concessões e permissões de uso de áreas que pertençam à Administração Pública Direta e Indireta deverão ser feitas, doravante, a título oneroso, mediante o pagamento de remuneração mensal, fixada por critérios do Executivo, ficando dispensados deste as agremiações carnavalescas, os centros desportivos comunitários ou entidades que prestem serviços sociais e culturais, devidamente propostos e avalizados pela Secretaria Municipal competente, à qual caberá a sua fiscalização”. (Destacamos)

Note-se que a Lei não faz qualquer diferenciação entre áreas externas ou internas da Administração e não encontramos legislação específica que disponha sobre outorga de uso de edifícios-sede da Administração. Assim, a nosso ver, aplica-se a regra geral prevista nesta Lei Municipal.

Portanto, a regra é a outorga a título oneroso, mediante o pagamento de remuneração mensal, fixada por critérios que, no caso da Câmara, devem ser determinados por esta Casa Legislativa.

A legislação federal segue a mesma linha. A Lei Federal nº 9.636/98 dispõe sobre a regularização, administração, aforamento e alienação de bens imóveis de domínio da União e prevê no art. 20 que não será considerada utilização em fim diferente do previsto no termo de entrega a cessão a uso de terceiros, a título gratuito ou oneroso, de áreas para exercício da atividade de apoio, definidas em regulamento, necessárias ao desempenho da atividade do órgão a que o imóvel foi entregue.

O regulamento dessa Lei Federal é o Decreto Federal nº 3.725/01 e o art. 12 exemplifica as atividades de apoio que não desvirtuam a atividade do órgão a que o imóvel foi entregue:

“Art. 12 […]
[…]
I – posto bancário;
II – posto dos correios e telégrafos;
III – restaurante e lanchonete;
IV – central de atendimento a saúde;
V – creche; e
VI – outras atividades similares que venham a ser consideradas necessárias pelos Ministros de Estado, ou autoridades com competência equivalente nos Poderes Legislativo e Judiciário, responsáveis pela administração do imóvel.”

Por sua vez, o inciso VIII do art. 13 do Decreto Federal nº 3.725/01 esclarece que “quando destinada a empreendimento de fins lucrativos, a cessão deverá ser sempre onerosa e sempre que houver condições de competitividade deverão ser observados os procedimentos licitatórios previstos em lei;”.

Portanto, no presente caso concreto, parece-nos que a outorga pretendida deve se dar de forma onerosa, nos termos da legislação de regência no âmbito municipal.

Importante notar que a remuneração deve se dar mediante o pagamento mensal de quantia a ser fixada pela Administração que, conforme pesquisa realizada em editais de outros órgãos corresponde a valor determinado por metro quadrado da área outorgada similar ao valor do contrato privado de locação e ao valor dos termos de permissão de uso firmados com as instituições bancárias que ocupam áreas desta Edilidade, não sendo possível, à luz da legislação vigente a adoção de um sistema exclusivamente de contrapartidas.

Inclusive porque um sistema exclusivo de contrapartidas não atenderia ao interesse público precípuo, podendo haver questionamento quanto à motivação do ato administrativo à luz dos princípios da impessoalidade e da moralidade.

Com efeito, a Lei Federal nº 8.666/93 determina no art. 3º que a licitação deve pautar-se em julgamento objetivo, sendo que o sistema exclusivamente de contrapartidas não se coadunaria com essa diretriz, além de eventualmente culminar em precarização dos serviços objeto da outorga, colocando em risco a segurança alimentar dos usuários.

Portanto, quanto a esse aspecto, conclui-se que a outorga para instalação e exploração de restaurante ou similares do ramo da alimentação deve se dar de forma onerosa, mediante o pagamento de contraprestação mensal a ser definida conforme critérios de mercado, com avaliação do valor do metro quadrado da região para o desenvolvimento dessa atividade econômica.

O formato da seleção do terceiro deve dar-se mediante licitação, sendo usual o Pregão Eletrônico. Não é possível adotar-se o sistema de credenciamento, pois para o objeto em tela há condições de competitividade, o que não ocorre no credenciamento.

No sistema de credenciamento a Administração Pública convoca todos os interessados em prestar os serviços ou fornecer bens que preencham os requisitos necessários para executar o objeto quando forem convocados. Assim, o credenciamento pressupõe a pluralidade de interessados e, uma vez credenciados, todos devem ser chamados a executar o objeto. Nesse caso a licitação é inexigível, pois não há competição entre os interessados. Todos estão aptos à execução do quanto solicitado pela Administração. Os exemplos mais comuns de credenciamento são para profissionais da área da saúde e, nesta Edilidade, para a contratação de professores pela Escola do Parlamento (Ato nº 1388/17).

Assim, o formato de seleção do terceiro deve dar-se mediante processo licitatório e, por tratar-se de objeto comum, pode ser realizado por meio de Pregão Eletrônico, na esteira de outros órgãos públicos.

O critério de julgamento, considerando que a contraprestação deve ser mensal, conforme determina a legislação municipal, pode ser a melhor oferta a partir de um valor mínimo previamente determinado para o metro quadrado. Sugerimos que seja a melhor oferta sobre o valor mínimo do metro quadrado pré-fixado para possibilitar, no futuro, eventual ampliação da área outorgada, mediante critério objetivo. Obtido o valor do metro quadrado é só multiplicar pela metragem outorgada e, no caso de eventual ampliação da área outorgada durante a execução do ajuste, o critério será aferido mediante mera aplicação aritmética.

Registramos Acórdãos paradigmas do Tribunal de Contas da União que recomendam a utilização de pregão eletrônico para a concessão remunerada de uso de bens públicos, inclusive de áreas comerciais em aeroportos (Acórdãos 2844/2010 e 2050/2014 – ambos do Plenário e de relatoria do Ministro Walton Alencar Rodrigues).

Nesses Acórdãos do Plenário o ilustre relator reitera as inúmeras vantagens da modalidade pregão, a legalidade do critério de julgamento pela maior oferta, em lances sucessivos, bem com a necessidade de adoção da modalidade totalmente eletrônica:

“A legislação sobre contratações públicas volta-se essencialmente para os contratos que geram dispêndios, ou seja, contratos de aquisição de bens e serviços, havendo pouca disciplina sobre os ajustes que geram receitas para a Administração Pública.

Daí por que, em se tratando de contratos de geração de receita, a utilização da legislação em vigor não prescinde da analogia.

No caso concreto, a licitação na modalidade pregão, com critério de julgamento na maior oferta, não constitui utilização de critério de julgamento não previsto por lei, mas, sim, a utilização do critério legalmente estabelecido e plenamente adequado ao objeto do certame, com a utilização do instrumento legal mais especialmente pertinente para os objetivos da Administração.

Incabível, na hipótese, a aplicação da lei de concessões, em confronto com o pregão, como pretende a representante, uma vez que o objeto licitado não é delegação de serviço público e a hipótese está expressamente prevista no Regulamento de Licitações da Infraero.

É desnecessário repetir aqui, novamente, as inúmeras vantagens comparativas da modalidade pregão para a Administração Pública em termos de proporcionar maior eficiência, transparência e competitividade.

Assim, sob a ótica da consecução do interesse público, os procedimentos licitatórios adotados pela Infraero para a concessão de uso de áreas aeroportuárias se mostram especialmente louváveis, porque concretizam os princípios da eficiência, isonomia, impessoalidade, moralidade, dentre outros.

Nesse sentido, há inúmeros precedentes, na utilização do pregão para a concessão de áreas públicas, por parte de diversos órgãos da Administração, como os Tribunais Regionais Federais (Pregão 07/2008, TRF da 1ª Região), o Ministério Público Federal (Pregão 41/2007) e a Procuradoria da República no Distrito Federal (Pregão 01/2008).

A adoção do critério de julgamento pela maior oferta, em lances sucessivos, nada mais é que a adequada aplicação da lei ao caso concreto, ajustando-a à natureza do objeto do certame, restando assegurada a escolha da proposta mais vantajosa que, conjuntamente com a isonomia de todos os interessados, constituem as finalidades primeiras de todo procedimento licitatório.

Para a concretização dos imperativos constitucionais da isonomia e da melhor proposta para a Administração, a Infraero deve evoluir dos pregões presenciais, para a modalidade totalmente eletrônica, que dispensa a participação física e o contato entre os interessados”. (Destaques nossos) (Trecho do Acórdão 2844/10 transcrito no Acórdão 2050/14 que efetuou as mesmas determinações para a Companhia de Armazéns Gerais do Entreposto de São Paulo – CEAGESP).

Quanto à outorga de uso (gênero), temos, em regra, a seguinte classificação: autorização, permissão e concessão de uso. Na lição do ilustre Hely Lopes Meirelles in Direito Municipal Brasileira, 16ª edição, 2008, Malheiros Editores, p. 318-320 :

“Autorização de uso é o ato negocial, unilateral, discricionário e precário pelo qual a Administração consente na prática de determinada atividade individual incidente sobre um bem público. Não tem formas nem requisitos especiais para sua efetivação, pois visa apenas a atividades transitórias e irrelevantes para o Poder Público,…”.

O exemplo de autorização de uso no âmbito desta Casa Legislativa é a autorização para filmagem e fotografia com fins comerciais previsto no Ato nº Ato nº 1182/12, alterado pelo Ato nº 1298/15.

“Permissão de uso é ato negocial, unilateral, discricionário e precário através do qual a Administração faculta ao particular a utilização individual de determinado bem público. Como ato negocial, a permissão pode ser com ou sem condições, gratuita ou remunerada, por tempo certo ou indeterminado, conforme o estabelecido no termo próprio, mas sempre modificável e revogável unilateralmente pela Administração quando o interesse público o exigir, dados sua natureza precária e o poder discricionário do permitente para consentir e retirar o uso especial do bem público. A revogação, faz-se, em geral, sem indenização, salvo se em contrário se dispuser, pois a regra é a revogabilidade sem ônus para a Administração. O ato da revogação deve ser idêntico ao do deferimento da permissão e atender às condições nele previstas.
A permissão enquanto vigente, assegura ao permissionário o uso especial e individual do bem público conforme fixado pela Administração e gera direitos subjetivos defensáveis pelas vias judiciais, inclusive ações possessórias para proteger a utilização na forma permitida. Via de regra, a permissão não confere exclusividade de uso, que é apanágio da concessão, mas excepcionalmente pode ser outorgada com privatividade sobre outros interessados, desde que tal privilégio conste de cláusula expressa e encontre justificativa legal.
Qualquer bem municipal admite permissão de uso especial a particular, desde que a utilização seja também de interesse da coletividade que irá fruir de certas vantagens desse uso, que se assemelha a um serviço de utilidade pública, tal qual ocorre com as bancas de jornais em praças, os vestiários em praias e outras instalações particulares convenientes em logradouros públicos…” (grifei).
E o ilustre doutrinador conclui que deve ser sempre precedida de licitação.

“Concessão de uso de bem público é o contrato administrativo pelo qual o Poder Público atribui a utilização exclusiva de bem de seu domínio a um particular, para que o explore por sua conta e risco, segundo sua destinação específica. O que caracteriza a concessão de uso e a distingue dos institutos assemelhados – autorização e permissão de uso – é o caráter contratual e estável da utilização do bem público, para que o particular concessionário o explore consoante sua destinação final e nas condições convencionadas com a Administração concedente”. O autor explica que deve ser precedida de autorização legal e de licitação.

E prossegue:

“Tal contrato confere ao concessionário um direito pessoal de uso especial do bem público concedido, privativo e intransferível sem prévio consentimento da Administração, pois é realizado intuitu personae, embora admita fins lucrativos”.

O autor explica que a concessão também admite a rescisão antecipada, mas mediante a composição dos prejuízos e motivação relevante para tanto.

Alguns doutrinadores, dentre eles, Maria Sylvia Zanella de Pietro adota a classificação que desmembra a autorização e permissão de uso em qualificada quando afasta a precariedade do ato administrativo, estabelecendo prazos e condições mais rígidos.

O Superior Tribunal de Justiça também admite essa classificação (Acórdão no Recurso em Mandado de Segurança nº 43.300 – MT, Rel. Ministro Humberto Martins, julgado em 22/10/2003):
“ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. PERMISSÃO DE USO DE IMÓVEL POR ASSOCIAÇÃO SEM FINS LUCRATIVOS E DE UTILIDADE PÚBLICA. RESCISÃO QUALIFICADA PELA FIXAÇÃO DE PRAZO. NECESSIDADE DE PROCESSO ADMINISTRATIVO PRÉVIO, MESMO EM CASO DE RESCISÃO POR INTERESSE PÚBLICO. PRECEDENTE.
[…]
2. As permissões de uso são, em geral, precárias, unilaterais e discricionárias, porém os autos demonstram que o termo de permissão foi firmado com prazo determinado de 10 (dez) anos (fl.28), condicionando-o, pois assim se induziu legítima expectativa da associação de fruição do imóvel pelo prazo estabelecido. A situação enseja a aplicação do parágrafo único do art. 78 da Lei n. 8666/93, obrigando a Administração Pública a ofertar processo administrativo prévio à rescisão, com a observância do contraditório e a ampla defesa.
3. “Ao outorgar permissão qualificada ou condicionado de uso, a Administração tem que ter em vista que a fixação de prazo reduz a precariedade do ato, constituindo, em consequência, uma autolimitação ao seu poder de revoga-lo” (Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Direito Administrativo, 21 ed. São Paulo, Atlas, 2008, p. 657).

Analisando editais de pregão de outros órgãos públicos com o objeto pretendido (instalação e exploração de restaurantes ou similares), verificamos que muitos entes administrativos adotam a espécie concessão de uso. Contudo, também encontramos bem disseminada a Permissão Remunerada de Uso (PRU), especialmente no âmbito do Tribunal de Justiça de São Paulo para a exploração de serviços de restaurante e lanchonete na Capital e em diversas Comarcas, da Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (XXXXX) e de outros Estados e no XXXXX. Também encontramos cessão de uso do espaço físico do Superior Tribunal de Justiça, inespecífica quanto à modalidade, contudo, também a título precário.

Do ponto de vista jurídico, considerando o princípio da supremacia sobre o interesse particular, parece-nos que a espécie de outorga mais benéfica e segura para a Administração é a permissão de uso qualificada por constituir-se meio termo entre a autorização de uso e a concessão de uso.

Reitere-se que a permissão remunerada de uso não confere direito de exclusividade da área ao permissionário, enquanto que na concessão de uso a exclusividade é uma característica inerente. Portanto, para viabilizar a retomada do bem pela Administração, a permissão de uso é a modalidade mais indicada, especialmente naqueles casos em que o empreendimento não atende as expectativas almejadas, mas cujo permissionário não cometeu falta grave, isto é, por interesse público ou nos casos de atrasos reiterados ou falta de pagamento da contraprestação mensal.

Ressalte-se que, havendo previsão no instrumento do ajuste e respeitado o contraditório e a ampla defesa, os tribunais judiciais têm autorizado a retomada imediata do bem público nos casos de permissão remunerada de uso, especialmente quando se tratar de inadimplemento das prestações mensais. Como exemplo citamos o Acórdão na Apelação Cível nº 1.0079.04.168772-8/001 do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Relatora Desembargadora Vanessa Verdolim Hudson Andrade, julgado em 29/08/2006 e publicado em 29/09/2006, com a seguinte ementa:

“TERMO DE PERMISSÃO REMUNERADA DE USO – INADIMPLEMENTO – REINTEGRAÇÃO DE POSSE – POSSIBILIDADE. Configurado o inadimplemento, o corolário natural é a reintegração de posse, com a retomada do imóvel, mormente se a hipótese encontra respaldo em cláusula contratual de Termo de Permissão Remunerada de Uso, que prevê o cancelamento automático da permissão em caso de mora de 30 (trinta) dias, ou de atraso habitual nos pagamentos mensais”.

Esse também é o entendimento do Colendo Superior Tribunal de Justiça no Recurso em Mandado de Segurança nº 43.300 – MT, Relator Ministro Humberto Martins, julgado em 22/10/2013, citado acima. Entretanto, neste caso concreto, a retomada deu-se por interesse público e o Tribunal Superior exigiu também a análise quanto à apuração de eventuais perdas e danos, conforme determina a Lei Geral de Licitações. Vejamos:
“ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. PERMISSÃO DE USO DE IMÓVEL POR ASSOCIAÇÃO SEM FINS LUCRATIVOS E DE UTILIDADE PÚBLICA. RESCISÃO QUALIFICADA PELA FIXAÇÃO DE PRAZO. NECESSIDADE DE PROCESSO ADMINISTRATIVO PRÉVIO, MESMO EM CASO DE RESCISÃO POR INTERESSE PÚBLICO. PRECEDENTE.
[…]
2. As permissões de uso são, em geral, precárias, unilaterais e discricionárias, porém os autos demonstram que o termo de permissão foi firmado com prazo determinado de 10 (dez) anos (fl.28), condicionando-o, pois assim se induziu legítima expectativa da associação de fruição do imóvel pelo prazo estabelecido. A situação enseja a aplicação do parágrafo único do art. 78 da Lei n. 8666/93, obrigando a Administração Pública a ofertar processo administrativo prévio à rescisão, com a observância do contraditório e a ampla defesa.
[…]
4. “Na hipótese de rescisão por interesse público (art. 78, XII, da Lei n. 8.666/93), deve haver oportunidade de manifestação ao contratado, motivação e caracterização do interesse público, bem como a apuração de perdas e danos – se for do interesse do contratado”. Precedente: RMS 27.759/SP, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 24.9.2010.
Em relação ao prazo máximo de duração, parece-nos que não se aplica o limite do inciso II do art. 57 da Lei Federal nº 8.666/93. Isso porque esse dispositivo legal constitui exceção à vinculação à vigência dos respectivos créditos orçamentários, limitando a duração dos contratos firmados com a Administração Pública, de forma a não perpetuar a contratação com a mesma pessoa, além de garantir a seleção da proposta mais vantajosa após certo período de tempo, considerando que as soluções podem mudar ao longo do tempo.
Observe-se que a permissão remunerada de uso não é um contrato administrativo stritcto sensu, tampouco constitui um ajuste com ônus para a Administração. Ao contrário, trata-se de ajuste de receita em seu benefício.

Não obstante, de forma a garantir a segurança jurídica da contratação, é recomendável que o termo de permissão seja firmado por prazo determinado, aplicando-se, analogicamente a previsão do § 3º da Lei Federal nº 8.666/93 que veda o contrato com prazo de vigência indeterminado. Esse é o entendimento firmado pelas Cortes de Contas. Como exemplo fazemos referência ao mesmo Acórdão paradigma do Tribunal de Contas da União acima citado que também aborda essa questão (Acórdão 2050/2014):

“5.3. Prazo
[…]
23. Nesse ponto, cabe uma observação a favor do embargante: de fato, os institutos da concessão e da permissão de uso de bens públicos não estão explicitamente disciplinados na Lei n. 8.666/1993. Os prazos referidos no caput do art. 57 e respectivos parágrafos da Lei n. 8.666/1993 não são aplicáveis às outorgas de uso de bens públicos, tendo em vista que não há utilização de créditos orçamentários nem o desembolso de recursos públicos como contraprestação contratual.
[…]
25. É certo que a definição do prazo de vigência contratual deverá se ater à natureza do contrato. No caso em tela, se considerarmos que a outorga de uso de bem público envolve de fato a realização de altos investimentos por parte dos contratados, então o instituto de contratação mais adequado será a concessão de uso do bem público pelo prazo necessário à amortização dos investimentos.
[…]
26. Destacamos que a definição do prazo de amortização dos investimentos resulta dos estudos de viabilidade econômico-financeira do negócio objeto de contratação. desembolso de recursos públicos como contraprestação contratual.
[…]

28. Genericamente, a Lei n. 8.666/1993 inclui os contratos de concessão e permissão como passíveis de prévia licitação. Há necessidade assim de que a CeasaMinas observe o art. 57, § 3º, dessa Lei, no que tange à impossibilidade de contratos com prazo de vigência indeterminados, bem como o art. 60, parágrafo único, no que toca à impossibilidade de manutenção de contratos verbais com a Administração (situação cujo prazo de vigência também não está definido).” (Grifos nossos)

Observe-se que deve haver estudos de viabilidade econômico-financeira do negócio objeto da contratação, de forma a fixar o prazo necessário à amortização dos investimentos por parte da futura permissionária.

Ademais a descrição do objeto deve ser detalhada, recomendando-se, dentre outros, a definição de alguns itens:

– descrição pormenorizada da área a ser outorgada e de suas instalações atuais, se houver;

– descrição pormenorizada das benfeitorias que a Administração exigirá da Permissionária;

– descrição dos serviços que deverão ser objeto da outorga. No caso de restaurante, é importante definir se o serviço será a la carte ou buffet ou ambos. Se for buffet se será a preço fixo ou se será por quilo. Para melhor qualidade do serviço pode ser estabelecido um valor mínimo a ser cobrado do usuário por prato ou por quilo no instrumento convocatório;

– descrição do cardápio mínimo diário;

– definição quanto à privatividade do uso da área outorgada ou não: estabelecer se na mesma área outorgada haverá simultaneamente a instalação e exploração de mais de um estabelecimento similar. Ex.: duas lanchonetes;

– definição quanto à possibilidade da permissionária ceder a área outorgada para terceiro (semelhante à sublocação);

– definição do valor do metro quadro da região para a atividade econômica pretendida;

– definição do prazo de duração da permissão de uso levando em consideração fatores, tais como o prazo para amortização dos investimentos;

– definição quanto à possibilidade ou não de prorrogação do termo de permissão de uso e as condições para tanto.

Como exemplos, anexamos os Editais da Câmara dos Deputados e da Câmara Municipal de Porto Alegre, órgãos que também utilizaram como critério o maior lance ou oferta sobre o valor da prestação pecuniária mensal. Verificamos que o Tribunal de Justiça de São Paulo também utiliza o mesmo critério nas suas permissões de uso.

CONCLUSÃO:

Em resposta à consulta formulada pelo Sr. Secretário Geral Administrativo, em síntese, recomenda-se:

1. Edição de Ato da E. Mesa para regulamentar, com fundamento no art. 1º, § 3º, do Regimento Interno, a outorga de uso para restaurantes e similares nas dependências da Câmara Municipal de São Paulo, na modalidade permissão de uso.

2. A permissão de uso deve ser onerosa à luz da legislação municipal que rege o tema, mediante o pagamento de remuneração mensal a ser fixada, não se excluindo a possibilidade de previsão, no instrumento convocatório, de valor mínimo do quilo ou do prato a la carte, conforme o caso, de forma a garantir a segurança alimentar dos usuários.

3. A seleção do terceiro deverá se dar mediante devido processo licitatório, na modalidade Pregão, na forma eletrônica, com critério de julgamento maior oferta ou lance.

4. O Termo de Referência – Especificações Técnicas deverá ser detalhado, com descrição pormenorizada, conforme modelos anexos.

Assim sendo, encaminho o presente Parecer que submeto à criteriosa apreciação de V. Sa.

São Paulo, 30 de outubro de 2019.

Conceição Faria da Silva
Procuradora Legislativa
Setor de Contratos e Licitações
OAB/SP n.º 209.170