Em reunião nesta sexta-feira (15/10), a CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Violência Contra Pessoas Trans e Travestis da Câmara Municipal de São Paulo realizou oitivas com quatro ativistas pelos direitos da população LGBTQIA+, que trataram de temas como violência, políticas públicas, educação e envelhecimento.
A primeira oitiva do dia foi com a artista trans Laura Cruz, vítima de uma abordagem violenta por parte de agentes da GCM (Guarda Civil Metropolitana), ocorrida no dia 30 de setembro na região da Cracolândia (centro). A ação foi parcialmente registrada em vídeo e divulgada nas redes sociais.
Na gravação, entre outras coisas, é possível ver o momento em que o cacetete de um GCM se quebra enquanto Laura é agredida pelos oficiais. Durante a oitiva, além de descrever a agressão, ela alegou que teve sua saia levantada pelos guardas e que foi humilhada verbalmente pelos agentes.
Questionada, Laura disse que já foi agredida outras vezes por oficiais de segurança em diferentes ocasiões, acrescentando que há uma diferença entre o tipo de abordagem realizada na Cracolândia e em outras regiões da cidade. Por outro lado, ela elogiou o tratamento recebido na delegacia quando lavrou um Boletim de Ocorrência sobre a agressão e fez o exame de corpo delito.
Ao comentar o trabalho social que desenvolve na região, que envolve a distribuição de marmitas e a formação de pessoas em situação de vulnerabilidade, Laura destacou já ter presenciado situações de violação de direitos humanos contra as pessoas que frequentam a Cracolândia.
Laura ainda falou, entre outras coisas, sobre a importância dos equipamentos públicos de acolhimento e auxílio para a população em situação de vulnerabilidade, cujo trabalho impacta positivamente essa parcela da população.
Logo após, a ativista trans Neon dos Afonso Cunha, representante da Marcha das Mulheres Negras contra o Racismo, a Violência e pelo Bem Viver, abordou em sua oitiva os diferentes tipos de segregação perpetrados contra a população LGBTQIA+, em especial contra as pessoas trans e travestis.
Ela criticou a falta de políticas públicas estruturadas voltadas a essa parcela da população, o que potencializa a segregação social. Ao tratar das formas de resolução desse problema, entre outras coisas, Neon destacou a necessidade da formação escolar, não só com a entrada no sistema educacional, mas a garantia de permanência até a conclusão dos estudos.
Em sua fala, a ativista ainda comentou as diferentes violências sofridas pelas pessoas trans e travestis, que vão desde a negação de seu nome social e direito ao próprio reconhecimento enquanto indivíduo, até a completa marginalização pela ausência de políticas públicas, formação, garantia de direitos sociais e exclusão do mercado de trabalho.
Outros temas tratados por Neon foram os diversos tipos de preconceito existentes na sociedade que impactam diretamente as pessoas trans e travestis; a falta de participação dessa população na formulação e execução de políticas públicas; e a dificuldade da plena inclusão em todas as instâncias da sociedade.
Na sequência, ocorreu a oitiva da ativista e sócio-educadora travesti Thais de Azevedo, da ONG Pela Vidda-SP, que também destacou a importância da educação para a formação da sociedade e para o pleno processo de inclusão da população LGBTQIA+, com destaque para as pessoas trans e travestis.
Em depoimento emocionado, Thaís, que está na terceira idade, falou principalmente sobre as violências sofridas por ela ao longo dos anos, utilizando sua história como exemplo do que a população trans e travesti passa cotidianamente.
Ela ainda abordou as dificuldades de envelhecimento, enquanto travesti, e respondeu a diversos questionamentos sobre o tema. Thaís ainda clamou para que a sociedade se conscientize e a narrativa de violência e sofrimento dessa população diminua cada vez mais.
Por fim, foi realizada a oitiva de Symmy Larrat Brito de Carvalho, mulher trans e presidente da ABGLT (Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos), que majoritariamente citou a ausência de políticas públicas que garantam à população LGBTQIA+ pleno acesso a seus direitos.
A presidente da ABGLT frisou os procedimentos adotados pelas forças de segurança em diferentes ocasiões, como no sistema prisional, onde as pessoas trans e travestis não são tratadas conforme sua identidade de gênero, passam por situações vexatórias e são privadas de direitos básicos, como acesso a produtos de higiene específicos e designação correta nas alas dos presídios.
Symmy ainda falou sobre os problemas existentes nos programas sociais de acolhimento à população trans e travesti da cidade de São Paulo e pediu a valorização e maior investimento nesses espaços de convivência da capital.
Requerimentos
Além das oitivas, seis requerimentos foram aprovados pela CPI na reunião desta sexta-feira, sendo três de autoria da vereadora Erika Hilton (PSOL) e três de autoria da vereadora Cris Monteiro (NOVO).
Nos documentos, as parlamentares convidam representantes de diferentes órgãos do Executivo e do Poder Público a auxiliarem os trabalhos da Comissão. Também foram convidados a prestar esclarecimentos à CPI representantes de diversas entidades sociais que administram equipamentos voltados à população trans, travesti e LGBTQIA+.
As vereadoras ainda solicitaram diversas informações e documentos à Secretaria de Segurança Urbana de São Paulo, à Corregedoria da GCM (Guarda Civil Metropolitana), ao Ministério Público do Trabalho do Estado de São Paulo, à Secretaria de Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social e à Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo.
A íntegra dos trabalhos pode ser vista aqui e aqui. A reunião desta sexta-feira foi conduzida pela presidente da CPI, vereadora Erika Hilton (PSOL). Também participaram o vice-presidente, vereador Eduardo Suplicy (PT), a relatora, vereadora Cris Monteiro (NOVO), além das vereadoras Elaine do Quilombo Periférico (PSOL), Juliana Cardoso (PT) e da Silvia da Bancada Feminista (PSOL).