A Unidade Básica de Saúde (UBS) – Especial da Vila Carioca, criada exclusivamente para monitorar a saúde dos moradores daquele bairro contaminados por resíduos de pesticidas, de solventes e de diversos tipos de derivados de petróleo enterrados na área do terminal da Shell do Brasil, não está cumprindo sua finalidade. A dedução é dos vereadores que integram da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) de Danos Ambientais da Câmara Municipal. Os vereadores não ficaram satisfeitos com o depoimento da coordenadora Helena Zaio, da Coordenadoria de Saúde da Região Sudeste, e da gerente da UBS de Vila Carioca, Adriana Molino de Moraes.
Segundo a médica Helena, não é missão da unidade fazer o levantamento do nível de contaminação de cada morador. “A missão da UBS é acompanhar, fazer diagnóstico precoce, dar orientação, formar grupos, pois como a contaminação é crônica o dano que vai causar ou já causou não muda o prognóstico do ponto de vista da saúde”, disse.
Das 7.975 pessoas possivelmente expostas aos riscos de contaminação ambiental, apenas 315 estão sendo acompanhadas desde outubro do ano passado. “Estamos fazendo um trabalho de prevenção com as pessoas que não apresentam doenças. Fazemos mamografia, ultrasom. São feitos todos os exames de rotina, como de sangue, de urina, para se evitar que algum problema instalado se agrave. Eles se baseiam em estudos que levantaram quais os contaminantes do ambiente que poderiam causar danos à saúde”, destacou Helena.
A coordenadora informou ainda que não foram realizados exames toxicológicos para verificar o grau de contaminação dos moradores. Disse também que dos 315, 63 estão com câncer.
Monitaramento e pesquisa
“Achei muito complicada e preocupante as informações prestadas pelas médicas”, reagiu o vereador Ítalo Cardoso (PT). “O que elas disseram aqui não é o trabalho de monitorar uma população contaminada. Sequer elas fazem o acompanhamento específico com os trabalhadores ou com os moradores, apesar das médicas saberem que naquela região existe a predominância de produtos como chumbo, mercúrio e sabem das conseqüências."
Para o parlamentar, “se a UBS não está fazendo essa pesquisa ela é normal como qualquer outra, pois não tem o fim específico de fazer o atendimento as vítimas da Shell na Vila Carioca”. Cardoso disse ainda que “a Shell pode até ter construído essa clínica, pode até ter pago, mas isso não resolve o problema, pois o trabalho que elas atestaram estar fazendo não vai localizar nem identificar uma possível contaminação de moradores e trabalhadores”.
O vereador petista informou que pretende descaracterizar a UBS como um posto especial: “Porque daqui a alguns anos vamos dar um cheque em branco para a Shell que vai dizer que cuidou e fez reparos à saúde dos moradores, quando na verdade a empresa construiu um prédio”, disse Cardoso.
O vereador e médico Marco Aurélio Cunha (DEM) também pensa da mesma maneira. “Nós não podemos só tratar do quadro clínico porque a UBS perde a sua função específica. Não se trata simplesmente de atuar como forma de prevenção de saúde e sim saber que existe uma zona importante de contaminação ambiental e de moradores contaminados”, afirmou. “É claro que alguns não têm a doença, mas é preciso ficar em cima e prevenindo em função de resultados de exames, não de uma forma aberta e ampla como ela fosse uma unidade de saúde comum, igual a todas.”
E mais: “A Vila Carioca é uma zona de contaminação e, por isso, é necessário pesquisar o sangue das pessoas para verificar o grau de contaminação e qual o produto contaminante, pois a pessoa pode não estar doente hoje, mas ela terá um tratamento de controle especializado para no caso de desenvolver a doença ser tratado precocemente.”
Demissão
A médica toxicologista Eliane Genciano Cruz, que trabalhou um ano e oito meses na UBS de Vila Carioca, revelou aos vereadores que foi demitida por tentar fazer com que a unidade atuasse especificamente nos cuidados aos contaminados.
“Briguei muito, lutei muito para que fossem realizados os exames toxicológicos para verificar se os pacientes expostos a contaminação estavam ou não contaminados por chumbo, mercúrio, manganês e resíduos organoclorados. Apesar da nossa insistência os exames nunca foram aprovados”, relatou Eliane. “Me demitiram, alegando que eu era uma médica problemática, rebelde.”
O presidente da Associação SOS Vila Carioca, Aristides Acosta Fernandes, de 66 anos, contou que o Instituto Adolfo Lutz examinou 240 amostras de sangue dos moradores da Vila Carioca. “Desse total, 78 apresentavam contaminantes acima de 1%, quando o nível tolerado, segundo a Organização Mundial de Saúde, é de 0,08. Em 2007, no exame do meu sangue foi encontrado 0,67%, mas até agora a UBS não me submeteu a um tratamento específico. Só exames corriqueiros”, denunciou.
Fernandes, além de problema crônico pulmonar, foi acometido por um câncer de próstata. “Se a UBS estivesse fazendo um atendimento específico, provavelmente poderia ingressar com uma ação de indenização na Justiça contra a Shell, pois poderia receber um laudo de que estou contaminado por este ou aquele produto."
Integram a CPI os vereadores Milton Ferreira (PPS), Penna (PV), Ítalo Cardoso, Alfredinho (PT), Marco Aurélio Cunha, Agnaldo Timóteo (PR), Juscelino Gadelha (PSDB), Paulo Frange (PTB) e Goulart (PMDB), presidente.
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