O dia de Elenice Madalena dos Santos começa ainda de madrugada. Às 3h30, a conselheira participativa do Rio Pequeno, na zona oeste, vai direto para a cozinha e prepara as “comidinhas” que serão servidas mais tarde, no Instituto Crescer com a Vida. Às 6h sai para trabalhar e bate o ponto uma hora depois no Instituto Adolfo Lutz, cerca de 12,5 km de sua casa, na zona oeste. Lá, ela é auxiliar de serviços gerais, função que desempenha há mais de uma década.
Porém, é no início da tarde que o coração de ‘Nice’ bate mais forte. É chegada a hora de ir para a ONG cuidar dos ‘seus meninos’. Elenice fundou o Instituto Crescer com a Vida em 2001 com o objetivo de oferecer um espaço para que mães pudessem deixar os filhos depois que eles saíssem da escola. “Eu entregava leite do governo na época e via que muitas mães precisavam de um lugar para deixar seus filhos depois da aula. Troquei de casa com a minha irmã, montei na cozinha uma espécie de sala e começamos a acolher as crianças. No início, quem me ajudava eram alunos de letras da USP”, disse.
Da sala, Elenice teve que ampliar as atividades para a garagem da casa, por conta do aumento da procura das mães. Foi então que o marido de uma colega de trabalho se interessou pela ONG e alugou uma casa no mesmo bairro. “A gente tinha umas 25 crianças e, de repente, virou 100. De lá para cá, formamos outra diretoria e hoje tem até lista de espera para entrar na instituição.”
O Instituto Crescer com a Vida funciona das 8h às 17h e acolhe estudantes de 4 a 13 anos. Ao logo dos anos tornou-se um segundo lar para muitas crianças e jovens. Lá, eles têm a oportunidade de fazer as lições de casa, ter aulas de reforço, brincar e fazer as refeições. Das mãos de Dirce, cozinheira e irmã de Elenice, saem pratos que conquistam a criançada somente pelo cheiro. Doce de banana, macarrão, feijão… “É uma delícia reencontrar quem já passou por aqui. É uma alegria sem tamanho saber que eles não foram para o caminho errado”, afirma Nice, que tem medo que a instituição feche e as crianças não tenham para onde ir.
Segundo a fundadora, faltam recursos para manter e realizar melhorias na ONG, que hoje sobrevive somente por meio de doações dos moradores da região. Essa é uma das reivindicações que ela levará ao programa Câmara no Seu Bairro, no próximo dia 16/5, no CEU Butantã (Confira o calendário completo). “Como somos teimosas, a gente não desiste fácil”.
Alegre e comunicativa, Nice, no auge dos seus 49 anos, enfrenta as dificuldades diárias com bastante otimismo. Mãe de um rapaz de 20 anos e de uma menina de 12, a conselheira consegue sempre encontrar um tempinho para ficar com os filhos e o marido. O lugar que mais gosta de sua residência é a cozinha. É lá que ela prepara os pratos preferidos da família e também escuta suas músicas. “Adoro um pagode, adoro dançar, adoro ficar na minha cozinha com o rádio no volume alto. E, claro, tomando a minha “breja” [cerveja]. Adoro o Zeca Pagodinho e gosto do Mumuzinho também. Só assisto o programa da Regina Casé por causa dele”, brinca.
Elenice retorna normalmente para casa por volta das 18h e a primeira coisa que faz é ir para a cozinha passar um café bem amargo, como mais gosta. À meia-noite, vai para a cama e, em poucas horas, estará pronta para mais um dia. “Tenho uma felicidade dentro de mim que eu não sei de onde vem.”
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