A 5ª reunião da Frente Parlamentar Contra Tecnologias Racistas da Câmara Municipal de São Paulo, realizada nesta terça-feira (14/5), abordou a temática “Guerra às Drogas”. Especialistas, ativistas e representantes do Executivo debateram o assunto durante o encontro.
“Sabemos que na cidade de São Paulo, assim como no país, o tema das drogas é um tema que tem o enfrentamento direto contra a população negra, e sabemos que a maioria da população que é presa em relação a esse tema é negra. O debate que vem, inclusive, sendo feito agora no STF (Supremo Tribunal Federal) sobre a quantidade de droga que pode ser considerada ou não o crime do tráfico, tudo isso está envolvido no motivador da criação dessa frente, que é o Smart Sampa, que é um programa da Prefeitura que tem feito a compra e a instalação de câmeras de reconhecimento facial na cidade de São Paulo”, explicou a vereadora Elaine do Quilombo Periférico (PSOL), presidente da frente parlamentar.
“Isso é um grande problema, porque entendemos que isso se integra dentro de tecnologias que consideramos racistas. As câmeras de reconhecimento facial, no modelo que elas estão sendo implementadas no Brasil, erram e elas erram, sobretudo, com pessoas negras e pessoas trans. Isso é um aprofundamento de uma política que já consideramos que prejudica muito mais uma parcela da população do que outra. Então esse debate tem a ver com quais são os lugares que o programa visa atender, mas, sobretudo, quem ele atinge na cidade de São Paulo”, justificou a vereadora.
Na reunião, os participantes debateram como o uso da tecnologia na chamada “Guerra às Drogas” – como o reconhecimento facial, que está sendo implementado na capital através do Smart Sampa – impacta negativamente a população negra e reforça as desigualdades e o racismo na sociedade.
Ouvidor das polícias do Estado de São Paulo e coordenador de políticas para juventude da Secretaria de Direitos Humanos, Cláudio Aparecido Silva destacou a necessidade de uma revisão nas leis que tratam do uso de drogas. “É importante dizer que as legislações brasileiras que dizem respeito ao enfrentamento às drogas são tecnologias de fortalecimento do racismo estrutural. E que fortalecem essa perspectiva que não dá resultados eficientes, nem dá resultados aproveitáveis para a sociedade em relação a essa questão do debate sobre drogas”, frisou.
“O debate sobre drogas precisa ser trabalhado de forma mais respeitosa, de forma mais delicada e dedicada pelo Poder Público, para que não ocasione o fortalecimento do racismo estrutural, que não ocasione o encarceramento em massa, especialmente o encarceramento em massa de jovens meninos e meninas negros e negras, e que não ocasione a criminalização das pessoas a partir do uso de drogas”, afirmou Silva.
Juliana Borges, escritora e representante da Iniciativa Negra por uma Nova Política sobre Drogas, reforçou a relação existente entre a chamada guerra às drogas e o desenvolvimento de tecnologias com viés racista. “Percebemos que, como argumento de sustentação dessa guerra às drogas, têm sido desenvolvidas uma série de outras tecnologias para controle populacional. Podemos pensar no reconhecimento facial, que acaba tendo um viés racial, porque diversos dados apontam que o reconhecimento facial falha com pessoas negras na hora do reconhecimento. E uma série de outras medidas de controle. Podemos pensar na expansão, por exemplo, de tornozeleiras eletrônicas, já que o encarceramento é uma consequência da guerra às drogas”, pontuou.
Já a organizadora da Marcha da Maconha de São Paulo, Diva Sativa, abordou a necessidade de promover ações de resistência para que a população negra sofra menos as consequências dessa guerra às drogas. “É muito importante, mesmo com esse sentimento de opressão, que a gente insista no debate e eu acho que, agora, temos ferramentas a mais para poder criar estratégias de como agir em rede, para realmente conseguir as mudanças que a gente quer. Porque, entra governo, sai governo, vemos que, se não nos organizarmos, parece que não vem a caneta que a gente precisa”, ponderou.
Também participaram da discussão Cecilia Galicio, advogada, mestre em Direito Internacional Público pela Universidade de Lisboa; Renato Filev, bacharel em Ciências Biológicas, doutor em Neurociências, e pós-doutorando; e Nathielly Janutte, agente de redução de danos há 8 anos e artista.
Esta foi a última reunião da Frente Parlamentar contra Tecnologias Racistas. Um relatório com a conclusão dos trabalhos será elaborado e está previsto para ser lançado no dia 25 de junho na Câmara de São Paulo.
A Frente
A Frente Parlamentar contra Tecnologias Racistas foi criada com o objetivo de traçar um diagnóstico sobre os impactos da implementação de tecnologias com potencial de discriminação e segregação racial na cidade de São Paulo para a população negra e para os cofres do município. A íntegra da reunião desta terça pode ser conferida neste vídeo abaixo: