Uma compra pública de bananas para a merenda infantil saiu por preço de filé mignon. A Organização Social de Saúde recebeu centenas de milhões para fazer um número determinado de atendimentos previstos em contrato, mas só metade da agenda foi preenchida. Agora, imagine que essas situações hipotéticas de corrupção, beneficiando agentes públicos e privados, gerem um alerta no celular do cidadão, informando que alguma coisa está errada nas prefeituras e câmaras municipais.
Para fomentar a criação de plataformas digitais aliando tecnologia e combate aos políticos e empresários corruptos, a Câmara Municipal de São Paulo, em parceria com a Fecomercio-SP (Federação do Comércio do Estado de São Paulo), Prefeitura e IBM, abriu as portas para mais de 50 hackers, designs, gestores e administradores desenvolverem esses aplicativos.
Na Maratona Hacker (ou Hackatona) que começou neste sábado (3/6) e termina na tarde de domingo, jovens ocuparam o Plenário do Legislativo paulistano com barracas e computadores para passar 33 horas desenvolvendo ferramentas que possam ajudar o poder público e a população. O time que apresentar o melhor projeto ganha R$ 10 mil, além de visibilidade na gestão municipal e em empresas de tecnologia.
Uma das participantes veio de Sorocaba, no interior de São Paulo. A estudante de marketing Joanita Rosa, de 28 anos, já tinha participado de um evento semelhante no mês passado. “Eu ajudei a desenvolver um aplicativo para a área da saúde. Queríamos saber se as consultas no SUS (Sistema Único de Saúde) demoravam por falta de médicos ou porque os profissionais atrasavam no serviço”, contou.
Os participantes se dividiram em equipes e mentores da Câmara, da tecnologia e da Prefeitura passavam nas mesas para dar conselhos. Dúvidas não faltavam. “Eu posso comparar preços da Pernambucanas para fazer uma compra pública?”, questionava um dos hackers que foi prontamente atendido por um especialista da Casa.
O vereador José Police Neto (PSD) é um dos incentivadores do evento. Ele é autor do Projeto de Lei (PL 01/2017). A proposta organiza a Política Municipal de Prevenção da Corrupção, cria o Conselho Municipal e Controle Social e um fundo público para combater o crime.
“Paralelamente ao combate à corrupção, temos de ter desenvolvedores observando a lei e aplicando ela na prática. Então a gente inova: antes de oferecer o PL testamos para ver se ele está completo”, explicou o parlamentar.
Uma das sugestões que ele fez aos jovens foi a de qualificar os preços das compras públicas. “Sistematizar pode garantir compras eficientes e combate à corrupção, quando parte da compra fica para o agente privado e outra para o agente público corrupto”, disse.
Controladoria
Na investigação que desbaratou a máfia do ISS na capital paulista, a CGM (Controladoria Geral do Município), órgão criado na gestão do ex-prefeito Fernando Haddad (PT), procuradores, servidores municipais e promotores usaram a tecnologia para comprovar, entre outras coisas, que funcionários da Secretaria Municipal de Finanças tinham grandes patrimônios. Os bens, no entanto, não batiam com os ganhos salariais deles.
A Hackatona contou com a presença de Thomaz Barbosa Silva, coordenador de integridade da CGM. Ele apoia o PL de Police Neto. “A Controladoria Geral do Município viu nesse projeto uma possibilidade de atuar como parceira e oferecer informações. A população vai ter acesso a todos os aplicativos. Se estiverem com código aberto, a possibilidade de uso pela Prefeitura é maior.”
É a Sociedade Fiscalizando quem deveria Fiscalizar.