Os impactos negativos do furto e comercialização irregular de fios de cobre, inclusive na indústria de transformação desse material e a qualidade final dos produtos, foi o tema do depoimento desta quinta-feira (31/8) de Enio Rodrigues, diretor executivo do Sindicel (Sindicato da Indústria de Condutores Elétricos, Trefilação e Laminação de Metais não Ferrosos do Estado de São Paulo) à CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) dos Furtos de Fios e Cabos da Câmara Municipal de São Paulo.
Rodrigues informou que o sindicato possui 58 associados e atua de maneira ativa para melhorar os processos da indústria. Segundo dados de 2022 do Sindicel, o setor de fios e cabos teve faturamento de R$ 7,45 bilhões e um volume consumido de 169,4 mil toneladas.
Estimativas da entidade apontam que 30% dos produtos do setor comercializados em 2022 estavam no mercado ilegal, que movimentou R$ 2,4 bilhões. Das 156 empresas com marcas licenciadas pelo Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia), 116 fabricam produtos irregulares e 70% das marcas testadas no mercado apresentaram resistência elétrica acima da especificação técnica do Inmetro.
De forma a lidar com o problema, o Sindicel criou, em 2018, o Programa Nacional de Combate ao Mercado Ilegal, que desde então apreendeu mais de 155 mil rolos de fios, em especial de cobre, em 26 Estados. Foram realizadas ações em 247 lojas e 20 empresas, com a apreensão de 82 marcas em todo Brasil.
Entre 2021 e 2022 ocorreram duas operações nacionais com o Inmetro, enquanto em estão programadas outras três. Além disso, o sindicato participou de operações com órgãos delegados do Inmetro em todo o país, exceto o Distrito Federal. Todas as ações ainda resultaram em nove prisões.
Paralelamente, o Sindicel realiza o monitoramento de marketplaces e já denunciou 1.056 anúncios de fios e cabos elétricos irregulares em sete plataformas distintas, notificando-as extrajudicialmente.
Os dados do sindicato ainda destacam que os principais efeitos da comercialização de fios e cabos elétricos fora de conformidade afeta a segurança dos consumidores, devido ao alto risco de incêndio; provoca um desperdício de 7% da geração de energia no país, num gasto anual estimado de R$ 9,2 bilhões; e ainda auxilia na apropriação indevida de recursos públicos, uma vez que os produtos irregulares acabam sendo utilizados em programas habitacionais, leilões nas esferas governamentais e comercializados por construtoras.
“Existe uma correlação [entre produtos de baixa qualidade e o crime de furto e roubo] porque, normalmente, a empresa que faz um produto fora de conformidade desta ordem, faz algum tipo de sonegação fiscal, ou compra produto com origem duvidosa. Então ela alimenta essa cadeia inteira de furto de fios e cabos elétricos”, analisou Rodrigues.
“Sabemos que, se conseguirmos controlar melhor isso, vamos dificultar o acesso ao produto fora de conformidade, que é muito mais barato do que um produto convencional. A tonelada do cobre hoje é medida pela Bolsa de Londres. Nós estamos falando de 10 mil dólares a tonelada. É um produto caríssimo e 80% do custo de um cabo elétrico é o cobre. Então, é por essa razão que o produto ou é substituído, ou é diminuída a quantidade que ele deveria ter”, completou o representante do Sindicel.
As informações trazidas na CPI acenderam um sinal de alerta para os vereadores. “Isso assusta bastante, porque 70% dos fios vendidos no nosso país estão em desconformidade com o Inmetro e vêm com o selo do Inmetro, o que me deixa mais preocupado. Isso dá uma perda de energia para o nosso país equivalente a 5%, um volume extremamente alto. E nós precisamos também nos debruçar sobre esse assunto, porque isso tem causado inúmeros acidentes, como incêndios e outras coisas mais”, comentou o presidente da Comissão, vereador Aurélio Nomura (PSDB).
“Vemos um ciclo perverso que começa desde lá do furto de fios e vai até a indústria de transformação. Às vezes, empresas sob o manto da sustentabilidade, sob o manto da economia circular, utilizam [dessa prática] para cometer atividades ilícitas. A CPI começa a tomar outra dimensão, pois nós estamos falando agora da segurança das pessoas. É muito preocupante quando nos deparamos com o material inadequado, com qualidade inadequada e que possa colocar em risco a vida de famílias”, acrescentou o relator dos trabalhos, vereador Coronel Salles (PSD).
Como desdobramento, os vereadores aprovaram requerimentos com convites para que representantes do Procon estadual e municipal, Ipem-SP (Instituto de Pesos e Medidas do Estado de São Paulo), Inmetro e Abracopel (Associação Brasileira de Conscientização para os Perigos da Eletricidade) contribuam com as investigações.
Também foi agendada, para o dia 6 de setembro, uma visita à Procuradoria Geral do Estado e à Secretaria Municipal da Fazenda, para que colaborem com os trabalhos da CPI. Além disso, foram solicitadas informações complementares ao Sindicel e aprovado convite a representantes da Conexis Brasil Digital (Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel, Celular e Pessoal).
A íntegra da reunião desta quinta-feira, que ainda contou com a participação do vice-presidente da CPI dos Fios, vereador Eli Corrêa (UNIÃO), e do vereador Hélio Rodrigues (PT), integrante do colegiado, está disponível no vídeo abaixo: