Nesta quarta-feira (11/09), dezenas de moradores da comunidade Morro dos Macacos, situada no limite dos municípios de São Paulo e Diadema, na zona sul paulistana, participaram de audiência da Comissão de Administração Pública. O objetivo era discutir a desapropriação no local.
Não é a primeira vez que a localidade passa por essa situação. Em 2011, por exemplo, a Prefeitura de São Paulo iniciou processo de desapropriação da área. Isso ocorreu após um deslizamento de terra ter deixado duas vítimas. Posteriormente, cerca de 900 famílias foram retiradas e encaminhadas para conjuntos habitacionais. No entanto, como o terreno não foi isolado, o Morro dos Macacos voltou a ser ocupado – atualmente, mais de mil famílias vivem na área.
Nos últimos anos, foram realizadas algumas tentativas de desapropriação. Resta apenas uma a ser feita, em uma área particular, agendada para o dia 24 deste mês. A ação cumprirá decisão judicial, requerida pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, que alega riscos aos moradores. Laudos da Defesa Civil apontam que a comunidade possui níveis de riscos R3 e R4, classificados como alto e muito alto.
Reivindicações
Os moradores que participaram da audiência disseram considerar que falta diálogo com a Secretaria Municipal de Habitação sobre medidas complementares às desapropriações. Eles criticaram a urgência de concretizar a retirada, sem providências sobre a oferta de serviços públicos para os desabrigados.
Bruno Santos, um dos representantes da Associação de Moradores do Morro dos Macacos, mostrou indignação com a desocupação. “Não adianta a prefeitura se esconder atrás do argumento de que nos avisou para não ocupar o local. O povo vai morar aonde? A gente sabia que iriam nos retirar, mas dessa forma? Pessoas perderam o pouco que tinham”, afirmou Bruno.
Segundo Mayara Oliveira, também moradora, a desapropriação tem comprometido a saúde de quem vive na ocupação, em especial, das crianças. “Depois que eles nos retiraram da área de risco, ficamos em uma situação ainda pior, convivendo com o lixo que eles deixaram lá. As crianças estão ficando doentes. O meu filho ficou doente”, relatou.
Mayara acrescentou ainda que faltam serviços públicos básicos. “Lá tem idosos, crianças e também pessoas com deficiências. Não existe nenhum tipo de assistência para nós, não temos agentes de saúde, além de sermos discriminados dentro dos postos”, acrescentou. Outros moradores também defenderam a revisão do processo de desapropriação, levando em conta a vulnerabilidade da comunidade. Maria Rodrigues, 64, que mora na ocupação há dois anos, alegou motivos financeiros para sair dali. “Eles foram lá, derrubaram as coisas, e deixaram tudo em cima do córrego, justamente na área de risco. A população errou, mas estamos morando lá porque não temos opção, não temos trabalho, não temos renda. E o governo está sendo omisso”, disse Maria.
Decisão da prefeitura
Presente à audiência, o secretário-adjunto da Secretaria Municipal de Habitação, Eduardo Debrassi, disse que a prefeitura tinha a responsabilidade de oferecer subsídio aos moradores mais antigos, aqueles desapropriados até 2011. À época, as famílias foram indenizadas ou encaminhadas para dois empreendimentos, o Mata Virgem, que recebeu 400 famílias em 2013, e o Residencial Espanha, que receberá agora 500 famílias.
Contudo, segundo Debrassi, a mesma oferta não poderá ser oferecida aos moradores atuais, uma vez que o Executivo não prioriza atendimento para novas ocupações.
O secretário-adjunto também disse que os moradores do Morro dos Macacos foram avisados pelo Executivo de que não receberiam o mesmo atendimento. “As famílias que estavam lá há 20 anos foram cadastradas em 2010 para entrar nos empreendimentos habitacionais. Já as pessoas que estão lá desde 2013 são de novas ocupações, e esses moradores, por regramento da prefeitura, não poderão ser atendidos da mesma forma”, explicou.
Debrassi esclareceu ainda que o cadastrado na Cohab está aberto aos moradores da comunidade, que terão de aguardar na fila juntamente com os demais inscritos. Segundo ele, a prefeitura não tem condições de atender rapidamente toda a demanda por moradia na cidade – ao menos 800 mil famílias vivem em áreas irregulares, e 300 mil aguardam uma moradia.
“Iremos entregar 21 mil novas unidades até 2020, mas esse número é insignificante frente às demandas. Esses empreendimentos, basicamente, são para fazer a remoção de famílias em áreas de interesse do município, de preservação ambiental, recuperação de mananciais e obras de reurbanização”, afirmou Debrassi.
Sobre as reclamações dos entulhos deixados durante as desapropriações, Debrassi falou que esta é uma decisão para evitar novas ocupações. Quanto à urgência em realizar a reintegração de posse, informou que a prefeitura está sendo multada diariamente por não cumprir o processo no ritmo esperado.
Apelo à Justiça
Vice-presidente da comissão, o vereador André Santos (REPUBLICANOS) propôs um requerimento para que a Comissão de Administração Pública acompanhe a oferta de serviços de saúde na região e cobre providências da Secretaria Municipal de Saúde no processo de desapropriação. “Alguma coisa tem que ser feita e já deveria ter sido feita há muito tempo. Essas pessoas precisam de assistência de saúde, especialmente neste momento delicado”, disse Santos.
Já o vereador Alfredinho (PT), integrante da comissão, solicitou que a Secretaria Municipal de Habitação conclua o cadastro dos moradores da ocupação. E que os parlamentares possam fazer um apelo ao juiz que determinou a reintegração na área. “Essas decisões devem ser providas de algum atendimento, como auxílio-aluguel, cadastramento em algum empreendimento. Vamos enviar as notas desta audiência para que este juiz tenha ciência desse debate e, quem sabe, mude sua postura”, defendeu.
O presidente da comissão, vereador Gilson Barreto (PSDB), reforçou a cobrança de uma manifestação por parte da Secretaria Municipal de Saúde. E apoiou a solicitação do vereador Alfredinho, para o envio do material da audiência pública à Justiça. Disse ainda que o assunto deverá retornar ao Legislativo. “A audiência pública é exatamente para ouvirmos as pessoas, as demandas da população. Esse debate com certeza não se encerra hoje, porque é uma situação que já vem de anos. E todos os parlamentares desta comissão tem um compromisso com as pessoas que lutam por moradia”, afirmou Barreto.