Audiência pública realizada nesta terça-feira (30/4), na Câmara Municipal de São Paulo, debateu o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 10/2019, de autoria do vereador Alfredinho (PT). O PDL pretende revogar o inciso II, do artigo 7º, do decreto 58.639/19, do Executivo, que reduz o número de embarques no sistema do transporte público municipal. Todos os munícipes que se manifestaram – 13 no total – se disseram favoráveis ao projeto.
O decreto da prefeitura promoveu uma série de mudanças no Bilhete Único, tendo alterado as regras do vale-transporte, que é pago por empresas a funcionários. Antes do decreto, era permitido ao passageiro embarcar em até quatro ônibus, no período de duas horas, pagando tarifa única, hoje de R$ 4,30. Com as mudanças, os usuários passaram a ter três horas para até dois embarques nos ônibus municipais da SPTrans, pagando apenas uma tarifa.
Além do PDL, Alfredinho também entrou com ação no TJ-SP (Tribunal de Justiça) de São Paulo, em conjunto com outros três usuários do transporte, para reivindicar a continuidade do benefício. Em decisão liminar, foi garantido aos usuários proponentes da ação o direito de seguir com as regras anteriores ao decreto, mas a Justiça não estendeu a decisão a todos os usuários. “Uma saída poderia ser que todos os cidadãos ingressassem no Poder Judiciário. Como isso seria complicado, a melhor alternativa é a aprovação do nosso PDL para sustar os efeitos do decreto”, defendeu o vereador.
Representante do IDEC (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), o geógrafo Rafael Calabria, pesquisador em mobilidade urbana, disse que a entidade foi surpreendida pela decisão da prefeitura. Segundo ele, as alterações tratam de forma diferente usuários que deveriam ter tratamento semelhante – e ainda houve pouco tempo para adaptação.
De acordo com dados compilados pelo IDEC, baseados em informações da SPTrans, o valor arrecadado com o uso de vale-transporte subiu, entre fevereiro e março de 2018, 15%. No caso do bilhete comum, o crescimento foi de 12,6%.
Neste ano, logo após a publicação do decreto, os números indicam um novo quadro. Segundo Calabria, o aumento de apenas 5,4% do bilhete comum mostra que estes usuários diminuíram a utilização do sistema para evitar novos gastos. Já o crescimento de 41,9% nos gastos do vale-transporte indicaria que os trabalhadores estão sendo mais cobrados do que no ano anterior.
Ainda de acordo com os dados apresentados pelo IDEC, os usuários de menor renda (até cinco salários mínimos) foram mais afetados por trocarem de ônibus e fazerem integração com mais frequência. Especialmente os que residem nos extremos das zonas sul e leste, o que exige deslocamentos mais longos.
As informações do IDEC também dão conta de que os trabalhadores que usam ônibus estão fazendo menos integração com o Metrô e trens. “O usuário costumava ir de ônibus até uma estação, usar o trilho para outro trecho e completar o trajeto com um novo ônibus que não havia tarifa cobrada. Agora, essa integração caiu, o que mostra que as pessoas têm feito a pé uma boa parte do trajeto ou estão procurando outras linhas de ônibus para readequar. Isso pode causar superlotação em algumas linhas”, afirmou Calabria.
O coordenador do Núcleo de Defesa do Consumidor da Defensoria Pública, Luiz Miranda, considerou que a alteração é uma “forma indireta de aumentar o valor da tarifa”, já que o usuário passa a ter direito a realizar menos viagens pagando a mesma tarifa.
Segundo Miranda, a Defensoria enviou ofício à prefeitura no mês de março, solicitando informações sobre os estudos realizados pela SPTrans para fazer a mudança. “Há mais de um mês foi protocolado, e ainda não recebemos a resposta”, revelou.
Para Naílson Francisco de Souza, diretor-executivo do Sindicato dos Motoristas, que representou a entidade na audiência, a medida beneficia os empresários do setor do transporte de São Paulo e prejudica os usuários.
Dário Santos, da AESUL (Associação Empresarial da Zona Sul), que segundo ele congrega mais de 400 empresários, disse que o impacto da medida é “prejudicial” para a concessão de vale-transporte aos funcionários.
Morador da região de Parelheiros, na zona sul da cidade, o aposentado Antônio Portela afirmou que há usuários que precisam caminhar até 15 quilômetros para chegar ao terminal de ônibus mais próximo, onde encontram ligação com as regiões centrais de São Paulo.
De acordo com Américo Sampaio, da ONG Rede Nossa São Paulo, a prefeitura pretende economizar R$ 400 milhões com a medida. Para ele, a finalidade é “formar caixa para a realização de obras, antes da eleição do ano que vem”. “Aceitaremos ter os nossos direitos limitados para isso ou vamos pleitear a ampliação dos direitos?”, questionou Sampaio.
Também participou da audiência o presidente da Comissão de Administração Pública, vereador Gilson Barreto (PSDB).