Nesta segunda-feira (23/9), a CCJ (Comissão de Constituição, Justiça e Legislação Participativa) realizou Audiência Pública para discutir o PL (projeto de Lei) 447/2017, do vereador Antonio Donato (PT). O projeto sugere a regulamentação do lobby junto ao setor público municipal, em busca de transparência. Além disso, prevê normas para os atos de agentes, grupos de interesse e de pressão, que representam demandas particulares e buscam influenciar decisões governamentais.
O projeto reconhece o lobby como um instrumento legítimo em um ambiente democrático, com diretrizes para a relação entre representantes da iniciativa privada, sociedade civil e autoridades públicas. O projeto também impõe limites à atividade dos lobistas para combater atos ilícitos envolvendo recursos públicos.
A proposta busca ainda assegurar o diálogo de agentes privados com o Estado, com ética e transparência. Para tanto, estabelece regras para o exercício da atividade. Entre elas o credenciamento de agentes no órgão perante o qual pretende atuar. O cadastro deverá ser público, acessível e disponível na página eletrônica oficial da entidade em questão.
O PL também determina que entes do Poder Público divulguem, diariamente, a agenda de compromissos e a respectiva ata realizada com os agentes de representação e grupos credenciados, além de instituir a legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade como princípios da atividade.
Mais transparência
Presente à audiência, a coordenadora de Projetos de Integridade do Instituto Ethos, Paula Oda, defendeu a transparência como principal prerrogativa para a criação de normas do lobby no Brasil, assim como ocorre em vários outros países. Na América latina, apenas o Chile tem uma legislação própria sobre o tema.
Segundo Paula, é possível aperfeiçoar o projeto em tramitação na Câmara. “Essa regulamentação precisa trazer princípios de transparência e monitoramento. Esse projeto já contempla alguns desses mecanismos, mas é necessário ampliar esses detalhes. Haja vista a dificuldade em termos de acesso a dados públicos, mesmo com a Lei de Acesso à Informação”, disse a representante do Ethos.
Também convidada à audiência, a professora da FGV (Fundação Getúlio Vargas), Andréa Gozetto, reforçou a necessidade da regulamentação. Segundo ela, a legislação trará modernizações para diminuir o estigma de marginalidade da prática. Isso inclui a substituição do termo lobby por “representação de interesse”, além de democratizar as informações. “O objetivo da regulamentação do lobby é sempre aumentar a transparência sobre os processos decisórios. No Brasil, não temos acesso aos meandros dessas decisões, ou seja, como as autoridades chegaram a tal deliberação, o que as motivou, por exemplo”, explicou Andréa. A lei promoverá acesso à informação igual a todos os grupos, segundo ela, e não mais a círculos privilegiados por recursos financeiros ou força política.
Debate Nacional
O assunto é tratado pelo Congresso brasileiro há algumas décadas, porém sem legislação aprovada. De lá pra cá, algumas proposições foram apresentadas, como Projetos de Leis, Projetos de Resolução e Atos da Mesa.
Presente à audiência, o deputado federal Carlos Zarattini (PT-SP) é autor do PL 1.202/2007. O PL é uma das propostas em tramitação na Câmara Federal. O projeto regulamenta a atividade de lobby em todo o País. Além disso, define regras para cadastro e atuação dos representantes da iniciativa privada que desejem dialogar com autoridades do Poder Executivo ou Legislativo. “Os interesses privados em uma prefeitura como a de São Paulo são enormes, devido ao tamanho da cidade. O fato é que essa relação de lobby no Brasil foi criminalizada por conta de escândalos. Entretanto, em outros países é totalmente legalizada porque não há como o parlamento funcionar se não tiver boas relações com a sociedade civil”, disse Zarattini.
Para Guilherme Costa, presidente da ABRIG (Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais), a regulamentação do lobby é recomendada por órgãos importantes. Um deles é a Transparência Internacional. Costa defendeu que o Legislativo paulistano aguarde a discussão sobre o tema no Congresso. Para ele, é melhor que o setor lide com apenas uma lei. “Se outras cidades seguirem o exemplo de São Paulo, talvez tenhamos mais de cinco mil leis municipais regulando como o profissional de relações institucionais deve se relacionar com as autoridades”, argumentou Costa.
Segundo o representante da Comissão de Relações Institucionais da OAB-SP, Ricardo Ferreira, por mais que a legislação municipal se adiante ao debate na Câmara dos Deputados, a população não pode abrir mão da regulamentação federal. “O processo legislativo deve ser respeitado, mas reger sobre esse tema não pode escapar da alçada federal. Isso por conta da magnitude do lobby”, ponderou.
Regulamentação Municipal
O vereador Caio Miranda Carneiro (PSB), que presidiu a audiência, defendeu a continuidade da discussão na Câmara Municipal, a fim de chamar atenção para o assunto no Congresso brasileiro. “Esse debate pode contribuir para acelerar a tramitação em Brasília, por conta da importância do tema. Aqui na Câmara Municipal, alguns vereadores muitas vezes não estão abertos a receber representantes de setores. Não somos obrigados a concordar com as posições e acatá-las, mas podemos escutar as sugestões”, avaliou Carneiro, que defendeu a regulamentação como uma forma de desmistificar a atividade do lobby.
Segundo o vereador Antonio Donato, o PL está em construção e deverá receber algumas sugestões até a votação. O parlamentar disse também que ter uma legislação municipal própria não implica mais burocracia. Caso a regulamentação a nível nacional seja aprovada posteriormente, os municípios irão se adequar. Donato acrescentou ainda que as relações de interesse, dentro do município de São Paulo, exigem mais transparência. “O tamanho da cidade nos obriga a criar uma lei municipal, porque as relações não podem continuar na informalidade. Temos que exigir essa transparência, que é uma pressão legítima da sociedade”, argumentou Donato.