O Plenário da Câmara Municipal de São Paulo recebeu nesta terça-feira (11/4) a quinta Audiência Pública da Comissão de Política Urbana, Metropolitana e Meio Ambiente para discutir a revisão do PDE (Plano Diretor Estratégico). Na pauta do colegiado, vereadores e representantes do governo e da sociedade civil debateram as ZEIS (Zonas Especiais de Interesse Social).
As zonas especiais são áreas demarcadas na cidade para promoção de moradias às famílias de baixa renda. São territórios que além de habitação popular, passam por melhorias urbanísticas, regularização fundiária e recuperação ambiental. Estas regiões também recebem infraestrutura e equipamentos públicos, promovendo o desenvolvimento local.
A Comissão de Política Urbana tem organizado audiências regionais, temáticas e gerais a fim de ouvir as demandas da população, as contribuições de parlamentares e conhecer os ajustes propostos pela Prefeitura para o Plano Diretor. O texto da revisão está no PL (Projeto de Lei) 127/2023.
Ao todo, o governo municipal prevê o aprimoramento de 75 artigos da atual legislação do PDE – a Lei n° 16.050, de 31 de julho de 2014. Executivo e Legislativo têm reiterado nas audiências que a regulamentação em vigor tem validade até 2029, quando então será construído um novo PDE. Outra ressalva é de que os ajustes necessários seguem as diretrizes determinadas na norma vigente.
O debate da audiência foi intermediado pelo presidente da Comissão de Política Urbana, o vereador Rubinho Nunes (UNIÃO). “O nosso relator, bem como os demais vereadores da Comissão, têm tomado nota de todos os apontamentos que vêm sendo feitos para construirmos o melhor texto e que possamos atender ao máximo aos anseios da população”.
Relator do PDE e membro do colegiado, o vereador Rodrigo Goulart (PSD) disse que as Zonas Especiais de Interesse Social estão entre as prioridades do Plano Diretor. De acordo com Goulart, o tema das ZEIS “é um dos conceitos básicos da lei e desta revisão”.
O parlamentar contou ainda que quer integrar os programas habitacionais, como o Pode Entrar, por exemplo, a fim de fortalecer a construção de unidades de moradia popular. “Muito se disse aqui em aumentar a demarcação, aumentar o número de ZEIS, transformar área ambiental em ZEIS. Mas todos os pedidos aqui levam ao que este relator tem pensado: que é a entrega efetiva das unidades habitacionais”.
Integrante da Comissão, o líder do governo na Câmara, vereador Fabio Riva (PSDB), também fez considerações sobre o tema da audiência. Um dos pontos tratados por ele sugere fazer mais demarcações de ZEIS na cidade, desde que não sejam em áreas de ZEPAM (Zona Especial de Proteção Ambiental).
“Quero deixar muito claro aqui a questão da preocupação com a ZEPAM. Mas existem outras áreas que podem ter esta alteração na Lei de Zoneamento, inclusive para as ZEIS, porque perderam toda a sua característica vocacional da demarcação que foi feita na Lei de Zoneamento, em 2016, e pelo próprio Plano Diretor, em 2014”.
Fabio Riva também falou da possibilidade de aumentar em 50% o Coeficiente de Aproveitamento das ZEIS, o que permite ampliar os metros quadrados construídos em um terreno. “Passando de fator 4 para fator 6, conseguimos de uma forma e de outra contemplar mais unidades habitacionais e atender às pessoas que mais precisam”.
O vereador Sansão Pereira (REPUBLICANOS), membro da Comissão, também defende o aumento do Coeficiente de Aproveitamento em 50% nas regiões de ZEIS. “Em um prédio de 6 andares ou 8 andares, a construtora vai poder construir 10, 12 andares. Vai compensar 50% a mais, assim dando uma melhor condição”.
Outra integrante do colegiado, a vereadora Silvia da Bancada Feminista (PSOL) considera o tema das ZEIS como o principal item da revisão do PDE. Para a parlamentar, a demarcação das Zonas Especiais de Interesse Social é fundamental para que haja a regularização fundiária e a urbanização destas áreas. “Essa população precisa dessa demarcação das ZEIS para que haja o mínimo de justiça habitacional, de justiça geográfica aqui na cidade de São Paulo”.
Segundo Silvia, há na capital paulista 2.442 perímetros demarcados como ZEIS. Ela levantou a informação para contrariar o artigo 48 do PDE, que prevê regulamentar o funcionamento dos Conselhos Gestores de Zonas Especiais de Interesse Social por meio de decreto do governo municipal.
“Precisamos garantir que os Conselhos Gestores tenham em todos os perímetros demarcados, porque eles vão garantir que não haja remoção forçada, que essa população permaneça naquele lugar”, disse Silvia.
O vereador Alessandro Guedes (PT) não faz parte da Comissão, porém subiu à tribuna para contribuir com o debate. Para o parlamentar, o PDE tem que priorizar a regularização fundiária. “A discussão de ZEIS passa por não reduzir nenhuma área de ZEIS na cidade. Pelo contrário, nós temos que aumentar as ZEIS”.
Também participaram da audiência o vice-presidente da Comissão de Política Urbana, vereador Marlon Luz (MDB), bem como o vereador Arselino Tatto (PT), integrante do colegiado. Além deles registraram presença os vereadores Atílio Francisco (REPUBLICANOS), João Ananias (PT) e Rodolfo Despachante (PSC).
Executivo
Guilherme Brito, da Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento, representou a Prefeitura. Brito explicou como foi desenvolvido o Projeto de Lei que propõe os ajustes ao PDE. Ele fez uma introdução, apresentou detalhes de cada uma das três etapas do plano e do processo participativo, que contribuiu com 4.388 sugestões.
De acordo com Guilherme, no fim da elaboração do projeto, em março deste ano, foram configurados 22 relatórios temáticos e uma minuta do Projeto de Lei. O representante da Secretaria de Urbanismo também tratou especificamente do tema da audiência.
Além de detalhar alguns artigos, Guilherme falou que a revisão do PDE “indica a necessidade de elaboração do plano de reassentamento para famílias removidas e prevê atendimento prioritário para famílias residentes em cortiços e ocupações irregulares afetadas”.
Ele disse ainda que entre os ajustes do Plano Diretor está previsto o aumento do Coeficiente de Aproveitamento máximo em 50% para o licenciamento de empreendimentos em áreas específicas de ZEIS. “Em áreas que estão em torno de metrô e dos corredores de ônibus pode haver o aumento do Coeficiente de Aproveitamento, permitindo assim a produção de mais unidades habitacionais”.
Defensoria Pública
O defensor público Allan Ramalho Ferreira participou da audiência. Ele afirmou que a Defensoria Pública produziu uma nota técnica junto ao Projeto de Lei para demonstrar algumas preocupações com a proposta de revisão do PDE. “A revisão intermediária, no entender da Defensoria Pública, propõe o enfraquecimento das Zonas Especiais de Interesse Social. As ZEIS são instrumentos urbanísticos que demarcam o território e destinam esse território preponderantemente para o atendimento da população de baixa renda”.
Allan também fez observações quanto à forma de regulamentação dos Conselhos Gestores de ZEIS. Segundo ele, o projeto “descaracteriza a obrigatoriedade de formação de Conselho Gestor. Isso porque pela redação do Plano Diretor hoje não há dúvida que esta Constituição é obrigatória, e esta obrigatoriedade é respaldada e chancelada por muitas decisões judiciais em primeira e segunda instâncias que a própria Defensoria e a advocacia popular conseguem para neutralizar ameaças de remoção da população moradora das ZEIS”.
Sociedade civil
Um dos principais objetivos das Audiências Públicas é ouvir a população. Por isso, a Comissão recebeu moradores e representantes de movimentos sociais. Marcos Miguel dos Anjos falou em nome do Colégio Doutor Walter Belian, localizado no bairro do Cambuci, região central da cidade. Ele disse que a escola está em uma área de ZEI, e com isso não pode realizar obras para ampliar o atendimento de crianças carentes da região.
“Com uma área de interesse social, o colégio não consegue fazer investimentos para ampliar as instalações e as salas de aula”, disse Marcos. “Retirando dessa área de interesse social e permitindo essas obras que precisamos para atender nossos alunos”.
O munícipe Fernando Escudero apresentou uma proposta para beneficiar as famílias de baixa renda que não conseguem financiar a compra de imóveis sociais. “Seria interessante deixar claro que o aluguel é sim uma opção de destinação, ou seja, é possível que se construa habitação de interesse social para que o proprietário alugue estas unidades para a população carente. Isso vai facilitar o acesso. Seria interessante regulamentar o valor deste aluguel”.
Representando a região do Sabará, zona sul da cidade, Fayes Mohamad Rabah pede atenção para o bairro. “Tem um projeto que prevê 500 desapropriações sem um plano de bairro, qual o impacto que isso vai trazer para os moradores locais?”.
Para o urbanista Kazuo Nakano, é essencial ampliar a discussão sobre o adensamento populacional previsto na revisão do PDE. “Quando esses conjuntos habitacionais chegam próximo ao coeficiente 4, o adensamento chega em torno de 2 mil, 3 mil unidades habitacionais por hectare. É um adensamento altíssimo, que se não tiver controle da qualidade do empreendimento vai prejudicar a classe trabalhadoras”.
Moradora da Bela Vista, região central da cidade, Inês Lucchesi também falou sobre o adensamento, porém no centro da capital. “Aqui na Bela Vista houve um adensamento dos cortiços. Acho que as áreas de ZEIS 3 têm que ser ampliadas aqui na Bela Vista”. ZEIS 3 são áreas com imóveis ociosos, galpões abandonados, deteriorados, cortiços, e em locais com oferta de infraestrutura.
Já João Afif Acras, morador do Cambuci, contou que nos próximos quatro anos está prevista a construção de 47 novos prédios na região. “A nossa infraestrutura não aguenta isso. Temos um terreno de 165 mil metros quadrados, onde era a antiga Enel, que vai subir 35 torres. O bairro não suporta”.
Ciléia dos Santos cobrou moradia para as famílias com renda mensal de até três salários-mínimos. “As ZEIS deveriam ser prioridade para este público, pensando que direcionar as ZEIS para a população de classe média só vai favorecer as construtoras”.
Outra moradora da capital que quer priorizar as ZEIS para habitações populares é Mara Souza. Para ela, o custo dos imóveis é muito alto para a realidade das pessoas que precisam de moradia. “Não é um preço popular. Não fazem apartamentos com 30 metros quadrados para vender para a população de baixa renda com preço acessível. R$ 200 mil, R$ 250 mil é um preço que a maioria da população com até um salário-mínimo e meio ainda não pode pagar”.
Hotsite
A Câmara Municipal de São Paulo disponibiliza um hotsite da revisão do Plano Diretor Estratégico. Nele, a população encontra informações do PDE, as notícias das Audiências Públicas realizadas, além das datas, horários e local das próximas discussões. No hotsite, as pessoas também podem contribuir com sugestões preenchendo um formulário digital.
Confira abaixo a íntegra da audiência desta terça-feira.