A Comissão Extraordinária de Direitos Humanos e Cidadania promoveu nesta segunda-feira (20/5), na Câmara Municipal de São Paulo, o 1º Seminário “Políticas Municipais para Pessoas Trans”, que reuniu representantes do Poder Público e de associações e entidades ligadas à causa para aprofundar o tema.
O evento abordou questões como o fortalecimento dos serviços de hormonização e a redução do prazo de espera para cirurgias de redesignação realizadas pela Prefeitura, e também discutiu a importância da Conferência Municipal LGBTQIA+ e a eleição do Conselho Municipal LGBTQIA+.
“Um tema tão sensível e importante numa cidade gigantesca, uma cidade do tamanho de São Paulo, mas também muito desigual em vários sentidos. E a política de gênero, a política LGBTQIA+, tem sido deixada de lado na nossa cidade quando mais necessitamos. Então, esse seminário vem em busca de reflexões, mas também na construção dessas políticas e de propostas para transformarmos a cidade de São Paulo numa cidade mais democrática, uma cidade inclusiva, uma cidade igualitária, uma cidade onde a gente possa ser quem a gente é e onde possamos ouvir os movimentos e aqueles e aquelas que têm feito essa resistência, essa luta na nossa cidade”, explicou a presidente da Comissão de Direitos Humanos, vereadora Luna Zarattini (PT).
Debate
Integrante da mesa debatedora do seminário, André Sardão, ex-presidente do Conselho Municipal LGBTQIA+ de São Paulo, destacou a importância da ampliação da oferta de atendimento médico específico à população trans. “Entendemos que seria importante o Poder Público buscar uma maior participação dos hospitais, uma ampliação, uma parceria, uma ampliação de equipe, por exemplo, para que consigamos ampliar o atendimento. Sabemos as dificuldades burocráticas e etc que o próprio Poder Público enfrenta, mas entendemos a importância de ampliar esses procedimentos cirúrgicos, ampliação do atendimento de hormonização das periferias, por exemplo”, disse Sardão.
Também debatedor, Walmir Siqueira, secretário nacional LGBTQIA+ da CUT (Central Única dos Trabalhadores) e conselheiro nacional LGBTQIA+, reforçou a necessidade não só de manutenção das políticas já existentes, mas também sua ampliação. “São Paulo tem uma política LGBTQIA+ de algum tempo, de governos anteriores inclusive, e queremos que continue tendo esse serviço, que tenha a manutenção e uma melhora no atendimento público, principalmente na comunidade trans. Tem alguns números que não dá para entender. A cidade de São Paulo tem um número de atendimento nos postos de saúde, nos hospitais especializados, tão baixo e uma dificuldade tão grande para as pessoas conseguirem ter o seu atendimento. Tem filas aí de 8 anos, as pessoas esperando para serem atendidas. Eu acho que é uma coisa que precisamos discutir, é uma cobrança que temos que fazer”, pontuou Siqueira.
O psicólogo Juca Martins, representante do Ibrat (Instituto Brasileiro de Transmasculinidades), exaltou iniciativas como o seminário para o avanço das políticas públicas municipais. “Eu acredito muito que a potência da construção da política pública é essa, de estarmos podendo olhar de diversos pontos de vista, e acho que nós, do Ibrat, nos implicamos muito também nesse processo de construção coletiva. E eu acho que isso também se trata de saúde. Quando estamos podendo pensar sobre nossa própria saúde, é um processo muito importante de autonomia dos nossos corpos, de olhar e dialogar sobre conceitos de saúde, o que entendemos como saúde”, comentou Martins.
Na mesma linha se posicionou Reyna Destra, militante LGBTQIA+ e usuária da rede pública de saúde da capital. “Pensar nas políticas públicas para população LGBTQIA+ é priorizar a existência no país que mais mata no mundo a população LGBT, sobretudo a população trans, sendo que não é crime sermos quem somos na legislação”, afirmou. “E eu acredito que, nesse processo de alinhamento de aliadas e aliados, possamos construir políticas que realmente nos permitam existir onde quer que estejamos: na saúde, na educação, no plenário como vereadora ou em qualquer que seja a sua profissão, que sejamos dignas e consigamos viver em paz e felizes”, completou Reyna.
Militante da causa e também usuário da rede de saúde municipal, Fernando Azevedo lembrou o constante esforço pela consolidação dos direitos da população trans. “É uma luta nossa por respeito, somente respeito. Os direitos acompanham essa questão do respeito e faz anos que a gente vem lutando por isso, para termos o mínimo de saúde, de sermos assistidos com dignidade, de não passarmos por constrangimentos, de termos os nossos anseios, as nossas disforias também sanadas por um atendimento digno”, ressaltou Azevedo.
A artista e militante Salete Campari foi outra a abordar a luta por direitos. “Nessa semana, que é a semana do maior ato e do maior evento LGBTQIA+, e como na sexta vai ter a Marcha Trans, é de uma importância muito grande que todos que estão aqui neste recinto façam essa divulgação, porque o momento é de todos, todas e todes estarmos na rua cobrando direito de política pública para esse movimento, que é o movimento mais discriminado no meio das nossas siglas, que é o T. Então, temos que estar unidos e fortes”, frisou Salete.
Após as manifestações dos integrantes da mesa debatedora do seminário, os representantes do Executivo municipal também se posicionaram. Tânia Regina Corrêa de Souza, interlocutora da área técnica de Saúde Integral da População LGBTIA+, fez uma apresentação detalhando toda a política pública municipal de acolhimento para essa população, com histórico de ações e lista de equipamentos e atendimentos ofertados.
Ela explicou que as UBSs (Unidades Básicas de Saúde) são as portas de entrada do sistema, com acolhimento inicial e escuta. Depois, há o encaminhamento para o Sampa Trans, rede de atendimento e apoio à população LGBTQIA+ da capital que conta com 45 unidades distribuídas por toda a cidade e oferece serviços e ações para promoção, vigilância em saúde e educação permanente dos profissionais.
“Esse encaminhamento é feito com agenda regulada e a rede Sampa Trans vai acolher, através de um profissional da equipe multidisciplinar. Vai colher toda a história, todas as demandas, vai fazer todas as orientações. Inclusive, orientar com relação ao uso dos hormônios, o que é definitivo, as mudanças que não são, os efeitos colaterais e, a partir disso, essa equipe vai fazer o desenho do projeto terapêutico singular e começar, então, o acompanhamento dessa pessoa na unidade da rede Sampa Trans”, esclareceu Tânia.
Outra ação destacada foi a atuação do CR Pop TT (Centro de Referência de Saúde Integral para a População de Travestis e Transexuais) Janaína Lima, que apoia a rede Sampa Trans. “Eles fazem o acompanhamento de adolescentes a partir dos 13 anos e a hormonização a partir dos 16 anos. Dão todo o apoio psicossocial a familiares e adolescentes, fazem acompanhamento de pessoas intersexo, acompanhamento do pré-natal, abordagem das complicações de silicone, complicações cirúrgicas de afirmações de gênero e endocrinopatias de base afetada pelo uso dos hormônios”, acrescentou.
Já a coordenadora de Políticas para LGBTI+ da Prefeitura de São Paulo, Léo Áquilla, abordou diversos temas, como as demandas apresentadas pelos participantes, a nova formação do Conselho Municipal LGBTQIA+ e a necessidade de mobilização da comunidade para a consolidação dos seus direitos.
Ela ainda defendeu os avanços conquistados pelas ações do Executivo, como o foco na formação profissional da população trans e sua inserção no mercado de trabalho. “A minha bandeira aqui virou empregabilidade. Eu acho que o princípio da dignidade, o resgate dessas pessoas é colocá-las trabalhando”, ponderou. “Já conseguimos mais de 2,8 mil vagas, só esse ano, para pessoas LGBTrans”, concluiu Léo.
A íntegra do 1º Seminário “Políticas Municipais para Pessoas Trans” pode ser conferida no vídeo abaixo: