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Vacinação na capital e atendimento de grávidas e puérperas durante a pandemia são discutidos em audiência pública

Por: DANIEL MONTEIRO - HOME OFFICE

17 de setembro de 2021 - 15:40

A Comissão de Saúde, Promoção Social, Trabalho e Mulher da Câmara Municipal de São Paulo realizou, nesta sexta-feira (17/9), Audiência Pública virtual na qual discutiu a vacinação contra a Covid-19 na capital paulista e o atendimento de grávidas e puérperas durante a pandemia. O debate foi proposto através de requerimento de autoria da vereadora Juliana Cardoso (PT).

Inicialmente, a audiência trataria do intercâmbio de vacinas nas grávidas e puérperas. Contudo, como a cidade de São Paulo segue orientações de um Documento Técnico da SOGESP (Associação de Obstetrícia e Ginecologia do Estado de São Paulo) apontando que a imunização desse público deve ocorrer com as vacinas Coronavac ou Pfizer (o imunizante da AstraZeneca não é usado), o debate acabou abordando a situação geral da vacinação na capital e o atendimento de grávidas e puérperas durante a pandemia.

Abrindo as manifestações sobre o tema, o médico sanitarista e pesquisador do Instituto Pólis, Jorge Kayano, fez uma análise geral sobre a pandemia. Ele afirmou que a situação ainda não está controlada e se mostrou contrário às medidas de reabertura. “Os especialistas no tema da pandemia, praticamente todos eles são unânimes em apontar que esta reabertura é muito precoce e é uma medida temerária, no sentido de que nós temos o risco, agora, da presença mais do que clara e mais do que acentuada de uma variante extremamente agressiva, que se chama Delta”, disse.

“E nós já temos esta variante praticamente tomando o espaço da nossa variante brasileira, chamada Gama, de Manaus. Então, não é uma questão, apenas, se vai haver um problema sério com esta variante, mas sim quando ela vai estourar de vez”, completou o médico sanitarista.

Kayano também exibiu uma apresentação na qual aborda as desigualdades da vacinação na cidade de São Paulo. De início, ele apresentou as informações divulgadas em junho deste ano pela Secretaria Municipal da Saúde. Na época, a média de vacinação na capital era de 18%. Entretanto, no recorte por áreas, as regiões central (37,4%), oeste (27,4%), e sudeste (21,2%) apresentavam índices superiores à média da cidade. Por outro lado, as regiões norte (16,9%), leste (13,4%) e sul (12,7%) tinham índices inferiores. “Essa foi a única vez que a Secretaria Municipal da Saúde divulgou dados da vacinação em São Paulo divididos por regiões da cidade”, ressaltou.

Ao longo da apresentação, o médico sanitarista também mostrou uma compilação de dados mais recentes da capital – até o dia 23 de agosto -, obtidos junto ao Ministério da Saúde e à Secretaria Municipal da Saúde. As informações foram esmiuçadas e, com base nelas, foi possível segmentar geograficamente os índices mais recentes de vacinação na cidade, possibilitando a comparação com as estatísticas oficiais regionalizadas do município.

Segundo Kayano, o mapa desenhado com as informações mais recentes apresenta um nível de detalhamento por áreas de ponderação, que são subdivisões das regiões de São Paulo agregados de setores censitários. Ao todo, foram identificadas 310 áreas de ponderação que mostram uma desagregação e uma informação territorial mais detalhada do que os próprios distritos oficiais, que são 96.

Ao analisar essas estatísticas, o médico sanitarista apontou que os menores índices de vacinação estão na periferia da cidade. “O que chama a atenção aqui é que esta disposição de vacinados em menor escala, onde o menor percentual é de 10% e vai até 25%, estão principalmente nas áreas mais periféricas da cidade. Isso está claro. E se a gente for olhar o que é esse padrão, esse é o padrão clássico centro-periferia que dividiu sempre a cidade de São Paulo entre uma área mais central e em direção ao oeste e ao sudeste, sudoeste da cidade, que é a área mais rica, com pessoas mais bem de vida, classe média, média alta, que tem a maior cobertura e, ao mesmo tempo, tem as menores taxas de mortes por Covid”, analisou.

“Isso significa um questionamento, que nós estamos levantando já há vários meses, de que a vacinação em São Paulo segue uma tendência contrária ao princípio da equidade social, que é um dos princípios que nós chamamos fundamentais do SUS (Sistema Único de Saúde). De acordo com esse princípio, o SUS deveria priorizar, em termos de cobertura vacinal, exatamente as regiões onde mais pessoas estão sendo acometidas com a Covid-19 e mais pessoas estão morrendo de Covid-19. E o padrão de vacinação faz o contrário. Isso contraria o princípio da equidade”, acrescentou Kayano.

O médico sanitarista ainda fez uma série de ponderações sobre as desigualdades na vacinação; questionou o Executivo sobre a inexistência de novas estatísticas regionalizadas sobre a pandemia na capital, bem como as incongruências entre as informações oficiais da cidade de São Paulo disponibilizadas pela Prefeitura e pelo Governo do Estado; comentou sobre as altas taxas de mortalidade por Covid-19 no município; e sobre os baixos índices de testagem, que impedem o controle do número de casos.

Logo após, a doula Erika Sato, do Fórum de Mulheres da Zona Oeste, abordou as consequências da pandemia na qualidade da assistência à gestação e ao parto na cidade de São Paulo. “O Brasil é campeão de mortes maternas no mundo. Isso é muito triste, porque nós temos um programa de pré-natal, de parto, todas as diretrizes que poderiam garantir que nada disso estivesse ocorrendo. Nós pudemos identificar nesse período acompanhando, é claro que os profissionais estão sobrecarregados, é claro que é uma situação atípica, o mundo inteiro não estava preparado, mas, infelizmente, está existindo, está ocorrendo um sucateamento do pré-natal. Talvez por sobrecarga dos profissionais, por falta de profissionais. Nós tivemos no município de São Paulo várias maternidades fechadas, algumas definitivamente, outras temporariamente por causa da Covid-19, o que gerou uma peregrinação muito grande das gestantes em busca de atendimento”, expôs Sato.

Na sequência, a docente de obstetrícia da USP (Universidade de São Paulo), Roselane Gonçalves também falou sobre a precarização do atendimento às gestantes na capital durante a pandemia e destacou como a Covid-19 pode aumentar os índices de mortalidade desse grupo. “Nós sabemos, e muitos estudiosos brasileiros, do nosso rol de amizades e de trabalho, já mostraram em publicações a gravidade da Covid-19 para as mulheres. Ela aumenta em 17 vezes o risco de morte materna, de trabalho de parto prematuro, prematuridade, morte fetal. Então, é o desmonte do SUS, consequentemente, os piores indicadores de saúde materno-fetal e perinatal de uma maneira geral”, alertou Gonçalves.

Representante do Movimento de Mulheres da Cidade de São Paulo, Elisabete Aparecida Silverio falou sobre a importância da vacinação das mulheres na capital. “A gente precisa garantir essa vacinação. Aqui em Sapopemba, falo da periferia onde eu estou, mas acredito que na cidade inteira, as mulheres são as que mais precisam voltar a trabalhar, porque não tem comida para pôr na mesa para os seus filhos. E isso é muito importante: nós temos muitas mães solos e são elas que vão para a rua, vão para o trabalho para trazer essa comida para dentro de casa. Eu quero pedir que isso seja reforçado, que é muito importante que a gente possa garantir essa vacinação, inclusive a segunda dose”, pediu Silverio.

Psicóloga do Sindsep (Sindicato dos Servidores Municipais de São Paulo), Carolina Grando citou a necessidade de as servidoras públicas gestantes serem protegidas contra o vírus e terem direito ao teletrabalho. “Existe uma legislação que protege o trabalhador celetista de estarem presentes no trabalho, então, que as coloca em teletrabalho, e esta situação não se aplica às servidoras municipais. Então, a gente tem toda uma proteção e uma promoção de proteção para fora, mas dentro da nossa casa, dentro de quem promove esses serviços, promove esses cuidados, esse cuidado não está sendo oferecido. E a gente sabe que o impacto da Covid-19 na morte materna, como a própria Fiocruz vai apontar, ela não tem a ver apenas com a contaminação da Covid-19, mas com um menor acesso, com um prejuízo dos acessos aos serviços de saúde”, atentou Grando.

Na mesma linha se manifestou Célia Regina Costa, secretária-geral do SindSaúde-SP (Sindicato dos Trabalhadores Públicos da Saúde no Estado de São Paulo). “Tem uma angústia de quem trabalha nas unidades. Nós também, trabalhadores estaduais da saúde, fomos todos obrigados a voltar, gestantes inclusive, ao local de trabalho, e isso gera todas essas questões que a nossa companheira acabou de colocar, toda essa angústia”, ponderou Costa.

Posicionamento do Executivo

Participante da audiência, Luiz Artur Vieira Caldeira, coordenador da Covisa (Coordenadoria de Vigilância em Saúde), comentou os dados apresentados pelo médico sanitarista Jorge Kayano e falou sobre os critérios de transparência das informações sobre a Covid-19 e sobre o acesso à vacina na capital.

Ele também se comprometeu a encaminhar ao Governo do Estado e ao Ministério da Saúde os dados expostos. “Quanto a esse estudo cujo o qual doutor [Kayano] explanou, nós temos interesse em analisar, claro. E nós nos comprometemos no seguinte sentido: como nós somos executores da política, e não planejadores, mas nós temos obviamente acesso aos planejadores, que seriam o Estado e, maiormente, o Ministério da Saúde, nós nos comprometemos nesse sentido do estudo em si, com esses percentuais tão diferentes do que nós temos aqui, a encaminhar o estudo ao PEI (Plano Estadual de Imunização) que tem um link com o PNI (Programa Nacional de Imunização)”, afirmou Caldeira.

A ginecologista e obstetra Sônia Raquel Wippich Coelho, coordenadora da área técnica da Saúde da Mulher na Secretaria Municipal da Saúde, também abordou os diversos apontamentos feitos pelos participantes da audiência. “Com relação ao número de consultas de pré-natal, o município de São Paulo manteve a oferta e a efetiva frequência das gestantes ao pré-natal normalizada em toda a pandemia. Nós não tivemos em nenhum momento parada do atendimento, da consulta de pré-natal. Inclusive com reconvocações,  com telefonemas lá em março de 2020, abril de 2020, as equipes entravam em contato com as pacientes faltosas e isso a gente tem documentado para disponibilizar em sistema”, destacou Coelho.

A Audiência Pública desta sexta-feira foi presidida pela vereadora Juliana Cardoso (PT). Também participou o vereador Alfredinho (PT). A íntegra do debate está disponível neste link.

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